Artigo: Previdência: Hora de rever os investimentos? – *Por Leonardo Ozorio e Sara Marques

Sara_Marques

O ano de 2021 começou e, na largada, já mostrou a que veio. Alguns assuntos que adormeceram no final do ano passado voltam a ser avaliados com mais profundidade. Inflação em alta, juros baixos, dólar valorizado, atividade econômica ainda fraca e (enormes) dúvidas fiscais. Neste contexto, o que esperar e como direcionar os investimentos para garantir um bom retorno? Aumentar a exposição ao risco de mercado ou de crédito; buscar novas alternativas de diversificação; investir em ativos no exterior; opções realmente não faltam. Na nossa visão, entretanto, a resposta mais coerente é: mantenha a calma! Antes de tomar qualquer decisão, é preciso considerar os objetivos dos investimentos. E, para o mercado de Previdência Complementar, especificamente, como sempre ressaltamos, temos de avaliar as perspectivas para o passivo e ativo conjuntamente.

No que se refere à evolução do passivo, há um aspecto prático que afeta toda a questão. Este ano, a Estrutura a Termo de Taxa de Juros (ETTJ) média definida pela PREVIC deve ser menor que nos anos anteriores. Como a estrutura de taxa de juros utilizada é baseada em uma média móvel, que tem como base os títulos públicos federais indexados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ela deve ficar mais baixa, aumentando o valor presente do passivo atuarial dos Planos. Já do lado do ativo, considerando que mais de 70% das carteiras dos fundos de pensão estão alocadas em títulos públicos, a rentabilidade esperada não é das mais animadoras. Mesmo prevendo uma inversão na condução da política monetária com o início de elevações na Selic já em março, o aumento dos juros não deve ser substancial. Os últimos dados do Boletim Focus indicam juros de 3,5% ao ano no final de 2021, subindo para 5% ao ano em 2022. Importante destacar a previsão de juros reais negativos em 2021.

Resumidamente, com o passivo crescendo mais que o ativo, há um aumento de pressão no equilíbrio dos Planos com parcela de Benefício Definido (BD) e, com juro real negativo, uma perda de poder de compra por parte dos participantes de planos de Contribuição Definida (CD). A primeira reação é acionar os gestores de recursos para tentarem turbinar os retornos. Porém, precisamos sempre nos lembrar que os objetivos dos planos de previdência são de longo prazo e que, ao analisarmos o cenário com uma perspectiva mais longa, talvez não seja preciso ampliar a exposição ao risco. Sabemos também que as entidades, apesar de terem objetivos de longo prazo, são cobradas pelos resultados de curto prazo (um grande risco escondido). Mas, mesmo nesse cenário e contexto, não devemos entrar em pânico. 

Leonardo_OzorioPara gerenciar o resultado negativo, as entidades podem colocar em prática algumas ações simples como, por exemplo, acompanhar mais de perto a evolução do passivo, seja na revisão das metas atuariais, nas hipóteses utilizadas ou até mesmo na movimentação de sua base de dados. A PREVIC exige às fundações a realização de ao menos um estudo atuarial no ano, sendo este posicionado em dezembro do ano de referência. O mercado, no entanto, tem exigido mais das fundações: mais governança e mais proximidade entre o ativo e o passivo. 

Um acompanhamento mais próximo pode trazer impactos diretos no resultado do fundo e na estratégia de investimentos. Temos exemplos de carteiras que, somente com o ajuste e monitoramento constante do passivo, sem mudanças bruscas na política de investimento, puderam converter déficit em superávit no meio do ano, o que impactou em mudança de estratégias para o Plano BD. 

Além disso, do lado do ativo, se avaliarmos o cenário econômico no médio prazo, dentro de dois ou três anos, teremos outras perspectivas. A economia deve mostrar sinais de recuperação; os juros devem subir e controlar a inflação; a situação fiscal continua como uma incógnita, mas as decisões políticas no curto prazo podem sinalizar o caminho e os efeitos no médio prazo. Ou seja, se as entidades tiverem tranquilidade para não assumir muito mais risco do que o previsto e conseguirem esperar a tempestade passar por completo, será ótimo. 

Indo além, vale lembrarmos março de 2020: no stress, o mercado dá oportunidades. É preciso ter disciplina e tranquilidade. Muitas entidades não fizeram movimentos abruptos em 2020, exatamente esperando um cenário mais claro. E alguns conseguiram, inclusive, encerrar o ano com rentabilidade acima da meta atuarial. Podemos afirmar que eles foram premiados pela disciplina! 

Trazendo todos estes pontos para 2021, acreditamos que o melhor para as entidades é pensar estruturalmente. Antes da tomada de decisão, entenda cada uma das informações que tem sobre o Plano, ao invés de deixar que o déficit momentâneo ou uma rentabilidade pressionada para baixo instaure o clima de desespero e comprometa o horizonte de longo prazo. É uma falácia pensar que, para passar por este momento, é preciso assumir mais risco. Temos muitas alternativas de investimentos que permitem diversificar a carteira sem necessariamente aumentar o risco. Além disso, os juros vão gradativamente retomar a trajetória de alta. Claro que não devemos retomar aos patamares de 12% ou 14% ao ano, mas, se voltarmos aos 6% ou 7%, já teremos um impacto positivo em toda a indústria. O mais importante neste momento é manter a calma, a governança e avaliar sempre ativo e passivo juntos. Somente assim as melhores decisões serão tomadas.

*Sara Marques (foto no topo) é diretora da Previdência, com foco em Atuarial, da LUZ Soluções Financeiras.

*Leonardo Ozorio (foto no meio) é diretor da área de Previdência, com foco em Investimentos e Consultoria, da LUZ Soluções Financeiras.

 

 

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