A proximidade das eleições presidenciais faz com que ganhe relevância o debate de temas prioritários para o futuro do Brasil. A agenda é enorme e diversificada, e ganha especial relevância levando-se em conta a necessidade urgente de adoção de medidas eficientes e eficazes, ainda mais em um cenário de incertezas como o que prevalece atualmente em todo o mundo.
Nesse quadro, merece destaque no País a crescente importância da previdência complementar fechada entre os principais atores que trabalham em favor do desenvolvimento sustentável. O sistema tem-se destacado especialmente em duas de suas principais missões: a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros na aposentadoria e a principal fonte provedora dos investimentos de longo prazo de que o País tanto necessita.
Por ocupar essa posição central nos debates sobre o futuro do Brasil, a Abrapp (Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Previdência Complementar), apresenta um conjunto de sugestões às candidatas e candidatos à Presidência da República, com a finalidade de dar sua contribuição para que tenhamos um país melhor e mais justo.
Essas propostas têm como pontos fundamentais aumentar a poupança interna e melhorar a composição e reduzir o custo de transação de administração da poupança privada em nosso país.
Nesse sentido, o sistema coloca entre suas propostas a necessidade de aumentar o investimento privado de longo prazo para não onerar demasiadamente o orçamento público. As Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) são a principal agente de poupança privada de longo prazo e podem contribuir para a expansão desse financiamento em parceria com o governo, com um menor custo fiscal para a sociedade.
Vale lembrar que as EFPCs já têm colaborado com o BNDES e outros agentes públicos no financiamento de vários projetos de investimento. Quase todas as grandes obras de infraestrutura em execução no Brasil contam com fundos de pensão ou consórcios de fundos de pensão dentre seus acionistas majoritários.
Olhando para o futuro, podem contribuir ainda mais para o aumento do investimento no Brasil e, ao mesmo tempo, atender ao seu objetivo fundamental de assegurar melhor qualidade de vida a seus milhões de participantes. Mais ainda, a expansão do financiamento privado de longo prazo passa necessariamente pelo aumento do número de participantes em fundos de pensão, o que por sua vez diminuirá a pressão demográfica e financeira sobre nosso sistema de previdência social.
Um dos pontos de atenção para os próximos anos, e que pode ser melhorado, é a participação dos trabalhadores em planos de previdência. Com uma população economicamente ativa (PEA) de aproximadamente 104 milhões de pessoas, o número de trabalhadores ativos participantes de fundos de pensão gira em torno dos 2,7 milhões. Quando comparamos esse contingente com a população que ganha acima do teto previdenciário (um total próximo a 6,5 milhões de pessoas), a relação ainda é desfavorável. Tanto do lado da PEA consolidada, quanto entre os que ganham acima do teto previdenciário do INSS, há um potencial enorme de novos participantes em fundos de pensão.
Houve avanços nos últimos anos, com criação de fundos instituídos e também os voltados para servidores públicos (para ficar em dois exemplos). No entanto, o fomento do sistema de previdência complementar fechada é um processo perene, e deveria constar de um programa de governo, que incluiria pontos como:
– Adoção do regime de capitalização: a reforma da Previdência, aprovada em 2019, teve vários méritos. Mas incluiu apenas medidas paramétricas com prazo de validade que, se não complementadas, exigirão uma nova e ampla mudança na Previdência em poucos anos. Ficou faltando adotar o regime de capitalização que, em consequência de uma visão equivocada dos parlamentares que votaram a reforma, ficou de fora do novo desenho previdenciário, apesar dos resultados positivos obtidos pelo modelo em vários países.
Os opositores da medida costumam lembrar os problemas causados pela adoção da capitalização no Chile, mas esse não é um bom exemplo. Naquele país, o sistema previdenciário adotado pelo governo Pinochet delegou a capitalização totalmente à iniciativa privada, com baixas contribuições, e o Estado ficou apenas com a questão assistencial. Os resultados negativos dessa estruturação logo apareceram e o modelo está sendo modificado para evitar prejuízos maiores aos participantes.
Para evitar a repetição desse quadro, a Abrapp propõe a adoção da capitalização com base nos seguintes pilares: 1- renda básica do idoso, que seria de responsabilidade do Estado; 2- repartição, com contribuição de um percentual por empregados e empresas mais contribuições equalizadoras para o estoque; 3- capitalização compulsória até determinado limite, custeado através de contribuições patronais, de empregados e uso dos recursos do FGTS; 4- capitalização individual voluntária. A proposta baseia-se em estudo do professor Hélio Zylberstajn, da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) da USP.
– Incentivo à participação em fundos de pensão: estimular que pequenas e médias empresas ofereçam previdência privada aos seus trabalhadores, mediante incentivos fiscais e tributários às pessoas jurídicas, bem como instituir a adesão inicial automática de novos participantes aos fundos existentes.
– Desoneração tributária adicional para investimentos de longo prazo: ampliar o incentivo tributário para o financiamento da ampliação da infraestrutura econômica e social para estimular a poupança e acelerar o início dos investimentos num momento em que o Brasil precisa aumentar rapidamente sua taxa de investimento. A principal iniciativa nesse sentido é simplificar e generalizar a desoneração tributária para títulos privados utilizados para financiar infraestrutura.
– Ampliação da educação financeira e previdenciária: ampliar os cursos e programas de educação financeira e previdenciária no ensino médio, com base em contribuições e sugestões do setor privado ao Conselho Nacional de Educação e ao Ministério da Educação.
– Desoneração no combate aos custos: É possível e indispensável que se desonere os fundos de pensão de custos trazidos por exigências exageradas e despesas desnecessárias, de modo a interessar mais empresas em patrocinar planos e entidades representativas de categorias a instituí-los em maior número.
– Reduzir a incerteza jurídica: Outra prioridade é reduzir o risco institucional de que benefícios não previstos no contrato previdenciário sejam reconhecidos, mais tarde, como direitos de alguns participantes por parte da Justiça. A redução da incerteza jurídica implica definir melhor as escolhas dos participantes, que por sua vez devem ter liberdade para escolher o tipo de plano que melhor se adaptar às suas demandas.
Regulação
No campo da regulação previdenciária, a criação da Previc (Superintendência Nacional de Previdência Complementar) foi um passo importante no aperfeiçoamento, mas ainda há muito para avançar. É possível reduzir o custo de transação dos fundos de pensão, de modo a aumentar os rendimentos de todos os participantes, mediante a continuação da modernização de nossa regulação e legislação previdenciária. Em relação a esse ponto, nossas principais propostas são:
1. Transformar a Previc em uma agência reguladora, com mandatos fixos para seus dirigentes, como já acontece em outras áreas de atuação do governo.
2. Flexibilizar e aumentar as opções de planos de previdência disponíveis aos participantes de fundos de pensão. Há no mundo exemplos interessantes de como normas diferenciadas podem permitir aos fundos de pensão atender a nichos específicos do mercado. Como exemplo, o Brasil adotou os “fundos setoriais”, presentes também nos Estados Unidos e na Inglaterra, para abrigar trabalhadores de empresas de um mesmo setor da economia.
3. Mudanças tributárias – 1- incentivo tributário para trabalhadores de baixa renda; 2- Flexibilização da tabela regressiva de Imposto de Renda, chegando a alíquota zero para recursos com acumulação superior a 14 anos; 3-incentivo fiscal para empresas patrocinadoras sujeitas a apuração do IR pelo lucro presumido; 4- isenção para portabilidade de recursos destinadas a custear planos de saúde;5- diferimento tributário para as contribuições pagas pelos empregadores para planos de previdência complementar que corresponderem à participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados das empresas; 6- base de cálculo para contribuição do PIS/PASEP vinculada à folha de salários e 7- dedução das contribuições extraordinárias para apuração do IR de pessoas físicas e jurídicas .
4. Custos administrativos – Reduzir o custo administrativo dos fundos de pensão, principalmente na abertura de novos planos e na comunicação e informação com os participantes e órgãos de controle. Atualmente, as condições para a criação de novos fundos ou planos de benefício acabam induzindo os poupadores a optar por planos individuais, com maior custo financeiro.
Igualmente importante, cabe ressaltar a solidez do nosso sistema. Existem, hoje, 264 fundos de pensão em funcionamento no Brasil, que contam com um contingente de 7,9 milhões de pessoas beneficiadas, com 2,7 milhões de participantes ativos, 800 mil assistidos quem são pagos pontualmente, no total, cerca de R$ 80 bilhões por ano. Estes fundos administram 1.114 planos de previdência complementar, patrocinados por milhares de empresas privadas e estatais, além de centenas de instituídos por entidades representativas de classe e profissionais, como ordens, conselhos, associações e sindicatos.
Somando suas aplicações públicas e privadas, os fundos de pensão administram hoje R$ 1,1 trilhão, cifra que corresponde a cerca de 14% do PIB brasileiro. Esse percentual ainda é modesto, quando comparado aos 229% da Dinamarca, 213% da Holanda, 132% da Austrália, 127% do Reino Unido ou 170% dos EUA e mostra que temos um longo caminho a percorrer no Brasil.
Com certeza o sistema cresceu e se solidificou ao longo de suas mais de 4 décadas de existência, mas ainda há muito a fazer. Para contribuir nesse processo, a Abrapp se coloca à disposição para discussões desses e de outros temas com candidatas e candidatos à Presidência da República.
*Luís Ricardo Martins, Diretor-presidente da Abrapp
Artigo publicado originalmente no portal Citywire Brasil