“Nos próximos anos, o principal impacto da IA no trabalho será ajudar as pessoas a realizar suas funções com mais eficiência. Isso será verdade, quer eles trabalhem em uma fábrica ou em um escritório”, postou o fundador da Microsoft, Bill Gates. O pensamento do empresário norte-americano suscita uma série de reflexões, entre elas a compreensão de como essa tecnologia pode impactar as economias do planeta.
Ainda não há estatísticas no Brasil, mas empiricamente é possível afirmar que as empresas estão investindo em inteligência artificial (IA) nos mais diversos setores, com as mais diferentes perspectivas. O que é nítido, porém, é o ganho de produtividade com o uso dessa ferramenta para atividades operacionais, ou seja, aquelas que demandam tempo de execução e são exercidas de forma frequente.
Quando se olha e se compara, inclusive, a curva de adoção da GenAI entre corporações e pessoas, se percebe como há um movimento ubíquo de testes, experimentações e usos. Todo mundo está usando, mas em tempos e movimentos diferentes. As empresas, nesse caso, estão um pouco mais atrasadas do que as pessoas, o que sugere também a necessidade de aceleração e de maior organização em governança na busca por ganho de escala das corporações. Uma pesquisa de 2023 da McKinsey intitulada “The Economic Impact of Generative AI”, com 14 mil usuários de diversas profissões em 14 países, descobriu que 28% dos entrevistados já estavam utilizando IA generativa no trabalho, mesmo sem muito apoio de suas organizações; dos usuários de IA generativa, 55% trabalharam com ferramentas não aprovadas e 40% com ferramentas proibidas.
Ao falarmos por área de atuação e destacar quais as ferramentas utilizadas, temos, de maneira geral, o seguinte quadro:
- TRADUTOR
Google Translate, OpenAI’s, Whisper, ChatGPT-4, DeepL, Alexa, Translations Bing Microsoft, Translator.
- EEDUCAÇÃO
Carnegie Learning, Knewton, Century Tech, Superchat, Teach, FX ,Prof Jim, Monic.
- ATENDIMENTO AO CLIENTE
Second Nature, TheLoops AI, Yuma AI, Tiledesk ,Echowin, Chatfuel.
- FINANÇAS
BloombergGPT, Trustfinta, Advisory Board, Lemon Squeezy ,Paddle, Finance Brain.
- MÍDIA
Jasper.ai, Shutterstock AI, Runway, Grammarly, Seventh Sense, MidJourney, OwlyWriter.
- PROGRAMAÇÃO | DIREITO
GitHub, Copilot Codex, Brancher.ai, Imagica.ai, Codeium, CodeWhisperer.
- ENTRETENIMENTO
Covers.ai, Charisma AI, Latitude, Beatoven, Podcastle, Ecrett Music.
- MEDICINA
BioNeMo, GT4SD, Syntegra, Pi, Twill, Regardz.
No ano passado, a Goldman Sachs, um dos bancos de investimento mais poderosos do planeta, estimou em 15% o possível aumento da produtividade do trabalho nos Estados Unidos em um período de 10 anos com base no uso de IA. Os analistas da instituição também sugerem que a transformação na economia está em curso, mas que os benefícios ainda estão concentrados em um número restrito de players e setores, os early adopters, tanto que menos de 5% das empresas norte-americanas estão utilizando formalmente ferramentas de IA generativa. Entre as dificuldades para a adoção mais acelerada da IA, apontam os analistas, está a falta de conhecimento de como aplicar a tecnologia e preocupações com a privacidade. Para a Goldman, no entanto, essas barreiras devem perder força nos próximos anos.
Uma das formas de processar o ganho de produtividade pela IA é por meio do fornecimento da análise de dados avançada em tempo real para tomada de decisão. Com essa tecnologia, é possível processar grandes volumes de informações e identificar padrões e tendências que não podem ser aparentes de forma imediata pelas pessoas.
São ganhos substanciais e valiosos, mas é fundamental ter capacidade e entendimento para modelar os processos a fim de ter bons outputs em projetos de IA. O entendimento do processo passa por um conjunto de atividades da rotina que geram as competências coletivas. Nesse sentido, ensinam Christian Defélix e Roberto Ruas, no livro Competências Coletivas: no limiar da estratégia, “as competências são um conjunto de saberes individuais construídos na rotina diária”.
É engano pensar que teremos bons projetos de IA sem ter conhecimento sobre as conexões dos processos. Se o modelo utilizado não for o correto, os outputs fornecidos não irão gerar informações para a correta tomada de decisão. Vale pontuar, ainda, a necessidade de se refletir sobre a anulação da capacidade crítica das pessoas em razão do processamento “automático” das informações. Por isso, é fundamental sempre ter no horizonte os conceitos de aprendizagem contínua: melhora, padroniza e inova.
Muitos especialistas têm projetado que a IA ajudará a enfrentar uma desaceleração acentuada e prolongada no crescimento da produtividade em muitas economias ocidentais, o que me parece factível. Por outro lado, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um bloco de 38 membros, abrangendo principalmente nações ricas, enfatiza que, até agora, há poucas evidências de que o surgimento da IA tenha um impacto significativo nos empregos, mas isso pode ocorrer porque a revolução está em seus estágios iniciais.
Quando mergulhamos na realidade da América Latina, vemos um cenário ligeiramente defasado, mas com investimentos para transformar a realidade, basta uma maior vontade de todos estes atores. Segundo pesquisa Startups & Inteligência Artificial Generativa, apesar dos desafios que a região enfrenta, como o coeficiente de pesquisadores por dólar investido em Deep Tech ser 13 vezes menor se comparado com o da China e 70 vezes menor se comparado com os Estados Unidos (Lavca), além de um cenário regulatório ainda em desenvolvimento, as plataformas de IA na América Latina estão projetadas para crescer 38%. Segundo dados do AI Adoption Index de 2022, da IBM, a América Latina tem apenas 29% de implementação de IA, abaixo da média global de implementação, que é de 34%.
A América Latina tem potencial para ser a região líder do Sul Global em desenvolvimento de IA e GenAI, por se apresentar mais preparada em dados e infraestrutura, governança e tecnologia do que outras regiões em desenvolvimento, como a África ou países do Pacífico.
No cenário brasileiro, há um contexto extremamente propício para um grande protagonismo do país na liderança da GenAI em toda a região LATAM, afinal, o Brasil é uma das nações mais digitalmente conectadas e abertas à tecnologia no mundo. Abaixo, destaco algumas estatísticas interessantes.
Quanto às startups, é um dos pólos mais atraentes para investimento da América Latina, tanto em valor quanto em número de startups existentes. Na verdade, o Brasil possui o ecossistema de startups mais influente da América Latina. Startups sediadas no país levantaram US$17.6 bilhões entre 2019 e 2023, o equivalente a 47% do total de dólares de capital de risco investidos na América Latina, segundo dados da LAVCA Trends in Tech, de 2024. Dessa forma, o país acaba naturalmente sendo uma das lideranças para o desenvolvimento de Deep Tech. Com todo esse cenário favorável, é fundamental destacar que a falta de investimento público é algo que impacta negativamente o futuro da IA Generativa no Brasil, especialmente na fuga de talentos do Brasil, conforme relatório da Fragomen.
Fato é que, embora ainda não se tenham dados robustos, o uso de inteligência artificial pode aumentar a capacidade da economia global de produzir bens e serviços. A que custo, ainda não sabemos, mas é preciso considerar que essa tecnologia é um caminho sem volta, por isso, governos e organizações devem ajudar os trabalhadores a se prepararem para as mudanças em curso e se beneficiarem das oportunidades que ela trará.
*Athila Machado é Cofundador da Mereo