Quando se fala em investimento institucional em fundos imobiliários no Brasil, uma peculiaridade salta aos olhos: a obsessão pelo microgerenciamento dos ativos subjacentes. É curioso observar que, ao invés de confiar na expertise do gestor terceirizado, muitos alocadores de recursos parecem querer assumir o papel de detetive imobiliário. Mas será que essa abordagem é a mais eficiente?
Imagine a cena: um investidor institucional, ao considerar um fundo imobiliário, imediatamente se debruça sobre a lista de ativos que compõe o fundo. Quais imóveis estão incluídos? Quem são os inquilinos? Como são os contratos de aluguel? Essa minúcia pode até soar prudente à primeira vista, mas será que não estamos nos desviando do verdadeiro propósito de contratar um gestor profissional?
Para ilustrar melhor, vamos fazer uma analogia com o mundo das corridas de automóveis. Por melhor que seja um piloto de Fórmula 1, isso não significa que ele terá o mesmo desempenho em uma prova de rally. Cada modalidade exige habilidades específicas, conhecimento profundo do terreno e estratégias diferenciadas. Por isso, contratamos especialistas. Não faria sentido contratar um piloto de Fórmula 1 para uma corrida de rally e, ainda por cima, tentar ditar como ele deve conduzir o carro.
Esse é o ponto central que muitos investidores institucionais parecem ignorar quando se trata de fundos imobiliários. O propósito de contratar um gestor terceirizado é o de selecionar alguém, um time de profissionais, dedicados a uma classe de ativos específica, a uma tese que demande uma especialidade e dedicação exclusiva. Ao escolher um gestor, o investidor está delegando a ele a responsabilidade de gerir os ativos subjacentes da melhor forma possível, buscando sempre as melhores oportunidades e antecipando possíveis riscos.
Essa delegação permite ao investidor focar no que realmente importa: a alocação estratégica de recursos entre diferentes classes de ativos, de acordo com seu perfil de risco e retorno. O investidor não precisa se preocupar em acompanhar cada movimento do mercado imobiliário, cada mudança de cenário macroeconômico ou cada novidade nos segmentos de atuação dos fundos. Ele pode confiar que o gestor está fazendo isso por ele, e que vai comunicá-lo das principais decisões e resultados.
No entanto, o comportamento em relação aos fundos imobiliários é frequentemente o oposto. Ao invés de delegar e confiar na discricionalidade do gestor, muitos investidores institucionais querem “fazer o trabalho” por conta própria. Eles se aprofundam em detalhes que, em teoria, deveriam ser responsabilidade do gestor. Se é para realizar o valuation dos ativos, avaliar a solvência dos inquilinos e esmiuçar os contratos, por que então pagar pelo serviço de gestão?
Essa falta de foco estratégico e a miopia na avaliação dos fundos imobiliários resultam em uma delegação incompleta. Ao tentar controlar cada aspecto do investimento, o investidor não está de fato delegando, mas sim criando um trabalho duplicado. E esse excesso de controle pode, paradoxalmente, levar a decisões menos informadas. Afinal, se o gestor foi selecionado com base em seu histórico e competência, por que não confiar em suas decisões?
Adotar uma postura mais confiante e delegar com eficácia não é um convite ao desleixo. Pelo contrário, trata-se de reconhecer a expertise do gestor terceirizado e permitir que ele faça o que sabe fazer de melhor. Isso significa avaliar o fundo imobiliário com base em critérios mais amplos e estratégicos, como a performance histórica, a resiliência em diferentes ciclos econômicos e a capacidade de inovação na gestão dos ativos.
Claro, é essencial realizar a devida diligência antes de selecionar um fundo. Mas, uma vez feita a escolha, a confiança deve ser depositada no gestor para que ele tome as melhores decisões em nome dos investidores. Isso permite uma gestão mais dinâmica e adaptável, essencial em um mercado em constante mudança.
Portanto, investidores institucionais podem se beneficiar grandemente ao aprenderem com a abordagem aplicada aos fundos de renda variável. A delegação eficaz e a confiança na discricionalidade do gestor não são sinais de fraqueza, mas sim de uma estratégia madura e bem-informada. Em vez de se perderem nos detalhes, os investidores podem focar no que realmente importa: o desempenho global do fundo e a competência do gestor em conduzir a carteira.
É hora de rever a forma como os investidores institucionais brasileiros encaram os fundos imobiliários, abandonando a miopia e adotar uma visão mais ampla e estratégica. Ao invés de se envolverem em um microgerenciamento ineficiente e desnecessário, eles deveriam confiar mais na discricionalidade dos gestores terceirizados, que são os verdadeiros especialistas no assunto. Assim, eles poderão aproveitar melhor as oportunidades e os retornos que essa classe de ativos oferece.
*Marco Túlio Coutinho é Consultor de Valores Mobiliários, Analista de Valores Mobiliários (CNPI), responsável pelo atendimento de clientes institucionais da Brunel Partners e Especialista da UniAbrapp