Após a reestruturação da dívida da Lojas Americanas, a Abrapp elaborou recomendações para o tratamento dos créditos nos registros contábeis e nas políticas de investimentos das EFPC, conforme orientações da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Previc. “Realizamos essa interlocução, dada a complexidade para as carteiras das entidades, que enviaram diversos questionamentos recebidos no que tange aos registros relacionados à gestão de recursos garantidores e contábeis decorrentes da reestruturação da dívida da Americanas, considerando o disposto no Plano de Recuperação Judicial. Buscamos um procedimento alinhado com a Previc para que práticas a serem adotadas pelos fundos tenham uniformidade e auxiliem o órgão supervisor no processo de fiscalização”, afirmou o Diretor-Presidente da Abrapp, Jarbas Antonio de Biagi,
Em comunicado circular de número 016/24, enviado às Associadas neste mês, a Abrapp destacou a orientação da Previc para que as EFPCs alterem suas políticas de investimento, com o objetivo de prever exceções que acomodem os desenquadramentos específicos causados pela reestruturação. “Essa orientação é especialmente relevante dado que as políticas de investimento das EFPCs tendem a ser mais restritivas que a Resolução CMN nº 4.994, de 2022”, destacou Biagi.
Políticas de investimentos
O Vice-Presidente Responsável pelo Colégio de Coordenadores de Investimentos da Abrapp, João Carlos Ferreira, explica que cada entidade tinha uma exposição diferente a ativos da Americanas. “Cada EFPC precisará adotar medidas específicas porque há situações diferentes. Algumas tinham o ativo em carteira, outras em fundos exclusivos e outras em fundos não exclusivos, que são os fundos abertos, sobre os quais não tinham nenhum controle ou poder de decisão. A CVM publicou um ofício, no qual orienta o tratamento a ser dado quando os ativos estiverem dentro dos fundos de investimentos abertos”, afirmou.
Segundo ele, nos casos de EFPC que possuem fundos exclusivos, o administrador e o gestor devem tomar as decisões sobre os ativos recebidos no âmbito da recuperação judicial. Já o ofício da Previc definiu os tipos de desenquadramentos aos quais as EFPC estavam expostas nesse caso, tanto em relação ao ativo na carteira, como nos fundos de investimentos. A Previc sublinhou que, quando a política de investimentos de uma entidade veda o investimento em determinados tipos de ativos, a situação deve ser tratada como um desinvestimento, exigindo a devida adaptação da política para refletir essa nova realidade.
O documento também esclarece que a política de investimentos das entidades deve registrar o tratamento dado a esses ativos, garantindo transparência e conformidade com as normas regulatórias. “Dessa forma, as EFPC que tinham essa exposição, seja em carteira própria ou em fundos exclusivos que receberam esses ativos da recuperação, terão que aditivar suas políticas de investimento de 2024, prevendo a manutenção dos ativos na carteira, que possam estar em desacordo com as regras atuais da política de investimentos.”
Segundo ele, é essencial que essas alterações sejam comunicadas aos participantes dos planos, especialmente aqueles que têm perfis de investimento impactados por esses desenquadramentos. Isso porque quando o ativo entrou originalmente, ele tinha um rating AAA, ou seja, era considerado de baixo risco de crédito. Portanto, sua aquisição estava dentro das diretrizes da política de investimentos. No entanto, ao baixar esse ativo e registrar a entrada de um novo ativo no âmbito da recuperação judicial, esse novo ativo pode estar classificado como rating D, ou seja, de alto risco de crédito.
Ferreira explica que a CVM esclareceu que fundos exclusivamente de renda fixa e que receberam ações como parte do processo de recuperação judicial, poderão manter esses ativos como um desenquadramento passivo. “Isso significa que os gestores desses fundos e os cotistas não precisam se preocupar com um desenquadramento ativo, pois a recepção desses ativos foi considerada a melhor opção para os cotistas”, avalia.
Segundo ele, já no caso das políticas de investimentos das entidades há um desenquadramento, no caso de fundos exclusivos que receberam ações, contrariando a política original. “Se um perfil de investimento, por exemplo, não permite a alocação em ações, mas tinha ativos da Americanas na carteira, ele estaria agora desenquadrado em relação à política de investimentos e ao perfil de risco do participante. Não há como evitar isso, então a política deve ser aditivada, estabelecendo um limite específico para acomodar esses ativos, como as ações recebidas da Americanas. Além disso, deve-se fazer um adendo às políticas para contemplar o risco de crédito elevado desses novos ativos, estabelecendo uma exceção para os ativos recebidos no âmbito da recuperação judicial da Americanas, permitindo que sejam mantidos em carteira, apesar do alto risco de crédito, enquanto os demais ativos não devem ter essa classificação de alto risco”, explica.
A recomendação do Vice-Presidente é que todas as EFPC façam aditivos para suas políticas de investimento, inclusive para 2025, e incorporem essas novas regras e exceções, talvez até prevendo casos futuros de recuperação judicial semelhantes. “É preciso garantir que os participantes tenham pleno conhecimento dessas alterações. Especialmente para aqueles com perfis de investimento, será necessário explicar o ocorrido, os resultados e a pequena exposição em renda variável que será gradualmente desinvestida ao longo do tempo”, afirma.
Segundo ele, o processo de desinvestimento de ativos da Americanas pode ser demorado. “Por exemplo, para as ações, há uma restrição para venda, onde 66% podem ser vendidos até agosto, e os restantes 33% a cada seis meses, levando a um prazo total de 36 meses. Durante esse período, as entidades que não investem em renda variável ficarão desenquadradas. Portanto, por três anos, será necessário manter transparência com os participantes sobre a situação. Nesse momento, com os ativos devolvidos às carteiras, houve um impacto positivo inicial com a entrada de dinheiro em caixa, mas isso pode variar ao longo dos próximos 36 meses”, concluiu.
Registros contábeis
O Secretário Executivo do Colégio de Contabilidade da Abrapp e da Ancep, Geraldo Assis Souza Jr, disse que o tratamento contábil dos créditos da Americanas foi discutido e alinhado com a Previc, para garantir que as EFPC estejam em conformidade com as exigências regulatórias e contábeis.
Assis explica que o procedimento contábil recomendado para as EFPC é baixar o valor principal ativo atual, que está provisionado para perdas, bem como a provisão correspondente. “Os novos ativos, exceto valores recebidos em dinheiro, devem registrados no realizável operacional dos investimentos, como renda fixa ou renda variável, conforme a classificação adequada. Se os créditos da Americanas estiverem alocados em fundos de investimento, eles já estarão marcados dentro da cota do fundo, e a entidade precisará apenas acompanhá-la”, explicou.
Ele destacou que o processo é relativamente simples do ponto de vista contábil, mas deve ser detalhado nas notas explicativas das demonstrações contábeis anuais, ao final do exercício de 2024. “Essas notas devem refletir todas as etapas e impactos da reestruturação e descrever os títulos baixados e os novos ativos recebidos, bem como seus reflexos monetários nos planos administrados. Isso resultará em um ganho patrimonial no primeiro momento, uma vez que será registrado como ativo recebido”, concluiu.