Fundos de pensão têm como premissa a busca de formas para minimizar impactos das oscilações do mercado e gerar maior rentabilidade aos planos de previdência complementar que administram. Tudo para cumprir a missão de pagar benefícios em dia aos seus aposentados e pensionistas. Tão importante quanto investir parte da renda visando retorno no longo prazo é aplicar o dinheiro tendo a confiança de que os recursos serão geridos com excelência, independentemente das volatilidades e imprevisibilidade que batem dia sim, dia também, no cenário do mercado financeiro. Mas confiança não se constrói da noite para o dia. É uma relação que ganha corpo no longo prazo, a partir de uma governança forte, transparência ativa, processos robustos e equipes qualificadas, empenhadas para identificar a melhor estratégia para alocação financeira.
Cada plano de previdência, no entanto, possui a própria estratégia de investimentos, que é elaborada a partir de estudos chamados de ALM (Asset Liability Management, ou gestão de ativos e passivos), que consideram características, nível de maturidade e perfil de risco. No passado recente, o cenário de alta de juros abriu oportunidade para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), em especial para aquelas que administram planos de Benefício Definido (BD), maduros, em fase de pagamento de benefícios, buscarem a chamada imunização de ativos, uma ‘vacina’ capaz de reduzir riscos, protegendo-os com objetivo de garantir aos seus participantes o recebimento de um fluxo de recursos ao longo do tempo. Nesse tipo de plano, hoje todos fechados para novas adesões, a ideia é pagar benefícios fixos aos funcionários das empresas patrocinadoras quando estes se aposentarem, com base em uma fórmula pré-determinada que leva em consideração fatores como tempo de serviço e salário médio. Isso significa que o valor do benefício a ser recebido na aposentadoria é definido antecipadamente, geralmente como uma quantia mensal vitalícia.
E foi o que fizemos na Petros, maior fundo de pensão multipatrocinado do país, que administra mais de R$ 130 bilhões para cerca de 132 mil participantes. A estratégia de imunização dos planos de benefício definido consistiu em aproveitar o mencionado cenário de juros elevados, acima da meta atuarial dos planos, para adquirir títulos públicos federais, sendo a maior parte marcados na curva, ou seja, papéis que não são impactados pela volatilidade do mercado e oferecem maior previsibilidade. Ao todo, foram movimentados mais de R$ 84 bilhões entre compras e vendas de títulos, casando o fluxo de vencimento desses papéis com os compromissos de pagamento aos aposentados e pensionistas ao longo do tempo, mitigando os riscos para os planos. Com a imunização, na média, de 82% das carteiras dos planos BDs, o movimento foi fundamental para o resultado da Petros, que teve, em 2023, a melhor rentabilidade em quatro anos, de 12,6%, bem acima do objetivo médio da Fundação, de 9,7%.
A legislação, porém, não permite que essa estratégia seja adotada em todos os planos. Em planos da modalidade de Contribuição Definida (CD), a aquisição de títulos públicos com marcação na curva é proibida, e nos planos de Contribuição Variável (CV), existem restrições. E essa determinação impede a aplicação da ‘vacina’ contra a volatilidade do mercado e vem impactando o resultado dos planos. Como resultado dessa restrição, nestas modalidades de plano, as fundações concentram seus investimentos em títulos públicos de curto prazo, com menor volatilidade. Enquanto nos planos BDs imunizados a rentabilidade acumulada já superava o objetivo de retorno em agosto deste ano, nos planos CV e CD o cenário ainda é de rendimento abaixo da meta. Se os títulos estivessem marcados na curva, a realidade seria outra.
Muito dos recursos dos fundos de pensão brasileiros está hoje alocado em títulos do Tesouro Nacional. Ser conservador é natural desse sistema, porque administramos a poupança formada por trabalhadores ao longo da vida profissional com objetivo de ter uma aposentadoria financeiramente segura. Mas não podemos ser extremamente conservadores. A estratégia de otimização, construindo um portfólio diversificado, é fundamental, sobretudo nos planos em fase de acumulação de recursos. Em um cenário de queda nas taxas de juros e o aumento da expectativa de vida dos participantes, as entidades deverão investir em ativos que ofereçam rentabilidades maiores a fim de cumprirem suas metas. Para isso, será preciso avançar, modernizar as regras que regem os investimentos de fundos de pensão, e estabelecer um arcabouço jurídico e institucional que confira segurança para a tomada de decisão das instâncias deliberativas das fundações, permitindo diversificação, redução de riscos e proteção do patrimônio dos participantes.
É preciso, por exemplo, modernizar a Resolução 4.994, do Conselho Monetário Nacional (CMN), de março de 2022, que obriga as entidades a venderem seus imóveis até 2030, e o Decreto 4.942, de dezembro de 2003, que trata da apuração de responsabilidade por infrações à legislação. É necessário, ainda, revisitar a Resolução 43, de agosto de 2021, do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), permitindo a marcação de títulos na curva também em planos CDs e CVs. Esses são exemplos de regulações que não consideram a diversidade das entidades que compõem o sistema, ensejando mudanças para acompanhar a evolução da governança pela qual passaram os fundos de pensão ao longo dos últimos anos.
Ainda há muito trabalho pela frente, mas mediante um esforço colaborativo e ininterrupto para aperfeiçoar os estudos e as tomadas de decisão nos aspectos de investimentos, é possível ter resultados cada vez mais positivos, como os registrados em 2023. A Petros está empenhada em proporcionar retornos que não apenas atendam às expectativas dos participantes, mas que busquem assegurar o seu futuro, oferecendo estabilidade e solidez financeira a longo prazo.
*Henrique Jäger é presidente da Petros