O mercado global de investimentos alternativos passou por mudanças significativas na última década. América do Norte e Europa passaram a absorver uma parcela crescente de capital, enquanto as outras regiões enfrentam desafios, mas também apresentam oportunidades promissoras para os investidores. O Brasil tem se destacado pela evolução do mercado de investimentos alternativos, com um crescimento no volume de capital, número de gestoras e uma ampliação das estratégias de investimento.
A captação de recursos para fundos alternativos tem se concentrado em um número limitado de regiões. A participação da América do Norte cresceu expressivamente, passando de 44% em 2018 para 69% em 2023, enquanto a Europa permaneceu estável em torno de 20% durante o período. Em contraste, a participação da Ásia diminuiu de 33% para apenas 10%.
A América Latina e outras regiões têm atraído cada vez menos capital, representando apenas 1% do volume de captação em 2023. Essa concentração reflete não apenas a preferência por mercados mais maduros, como os EUA e a Europa, mas também a percepção de risco e estabilidade, o que atrai investidores em busca de segurança. No entanto, essa situação cria oportunidades para investidores dispostos a explorar a limitada oferta de capital na América Latina, onde há uma demanda crescente por recursos entre as empresas.
O capital disponível para investimentos em ativos alternativos passou por uma evolução significativa no Brasil. O montante disponível era de R$ 20 bilhões em 2012, sendo 79% concentrado em fundos de private equity. As demais estratégias, como venture capital e special situations, representavam juntas apenas 11% do total. Atualmente, o cenário é mais diversificado. O capital disponível para investimentos atingiu R$ 56 bilhões em 2023, e a participação dos fundos de private equity caiu para 31%, enquanto venture capital (26%) e special situations (24%) ganharam relevância. Essa diversificação reflete a crescente sofisticação dos gestores locais e a demanda dos investidores por novas estratégias, o que torna o mercado mais dinâmico.
O aumento do montante disponível para investimentos está igualmente associado ao surgimento de gestoras especializadas, um importante indicativo do amadurecimento do mercado brasileiro. Essas gestoras utilizam seu conhecimento setorial para identificar oportunidades que muitas vezes são ignoradas por gestores generalistas, aproveitando ineficiências na alocação de capital. Essa abordagem também funciona como uma forma de diversificação e pode oferecer retornos superiores em comparação com teses de investimento tradicionais. Nos últimos dez anos, o número de gestoras especializadas cresceu mais de quatro vezes, chegando a mais de 70 gestoras e representando 15% do capital disponível para investimentos na indústria.
A dispersão dos retornos dos fundos de alternativos em um país pode oferecer mais uma camada de oportunidades para o investidor, mas com o desafio de identificar continuamente gestoras capazes de se destacar consistentemente no longo prazo. A dispersão do retorno dos fundos de private equity e venture capital evidencia dinâmicas distintas entre os mercados dos EUA e do Brasil. Nos Estados Unidos, a diferença entre o primeiro e o terceiro quartil dos retornos dos fundos de venture capital reduziu significativamente, passando de 57% no período pré-2000 para 24% após 2000, enquanto os fundos de private equity tiveram uma queda mais modesta, de 24% para 18%. Isso indica um mercado mais maduro e estável, com menor variação entre os melhores e piores fundos.
No Brasil, a dispersão dos retornos aumentou após 2010, com uma elevação de 20% para 25% para fundos de private equity e de 18% para 28% em venture capital. Essa maior variabilidade reflete o surgimento de novos nichos de mercado e a diferenciação das estratégias que permitem explorar as ineficiências existentes.
O crescimento do capital disponível para investimentos, das estratégias e gestoras está apoiada na resiliência da indústria de alternativos local, que consegue devolver capital aos investidores e gerar liquidez mesmo em anos de mercado de capitais fechado. Desde 2017, os fundos desinvestem pelo menos R$ 10 bilhões por ano, sendo que o destaque é o ano de 2022 com 56 desinvestimentos e R$ 38 bilhões em volume. Esses números são impressionantes, pois 2022 foi um ano marcado pela ausência de IPOs e pela instabilidade do mercado de capitais. Além disso, os fundos brasileiros têm devolvido capital aos cotistas em ritmo comparável ao dos fundos norte-americanos e europeus, especialmente aqueles que realizaram investimentos até 2015.
O crescimento do mercado de ativos privados aumentou a complexidade das decisões para os investidores. O surgimento de novas estratégias também trouxe novos gestores que, muitas vezes, não possuem um histórico de desempenho consolidado, tornando a avaliação de seu potencial um desafio. Em um cenário de constante evolução, os investidores precisam não apenas entender as particularidades de cada estratégia, mas também avaliar cuidadosamente a capacidade, integridade e competência dos novos gestores.
Esse processo exige uma abordagem minuciosa e uma diligência rigorosa, com o objetivo de garantir que os riscos sejam plenamente compreendidos e mitigados. Nesse contexto, a capacidade de adaptação e aprendizado rápido se torna essencial para o investidor navegar com sucesso as complexidades e incertezas desse mercado em expansão.
A evolução do mercado privado, impulsionada por novas estratégias de investimento, o amadurecimento dos gestores e a capacidade dos fundos de retornar capital mesmo em cenários macroeconômicos desafiadores, coloca o Brasil e a América Latina como um ambiente ideal para a diversificação de investimentos. Além disso, a diversidade de teses de investimento cresceu significativamente, abrangendo desde setores tradicionais, como imobiliário e private equity, até áreas mais especializadas, como direitos creditórios e biotecnologia. Dessa forma, a região se consolida como um destino promissor para estratégias sofisticadas de alocação de capital, oferecendo oportunidades atrativas para investidores que buscam explorar seu potencial.
*Humberto Gallucci é cientista de dados e responsável pela área de Research da Spectra. Possui doutorado em Finanças na FGV