19º ENAPC: Plenária aborda o impacto de decisões judiciais na estabilidade do contrato previdenciário

No segundo dia do 19º Encontro Nacional de Advogados das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – ENAPC, realizado em São Paulo, especialistas discutiram o impacto de decisões judiciais favoráveis aos participantes sobre as reservas matemáticas dos planos de EFPC, durante a plenária 4, sobre “Decisões Judiciais e a Estabilidade do Contrato Previdenciário”. O evento ocorreu nos dias 19 e 20 de agosto no Teatro Sheraton São Paulo WTC Hotel.

A plenária foi presidida pelo Desembargador do TJRO e Diretor-Presidente da Jusprev, Francisco Borges Ferreira Neto. O tema foi abordado pelos palestrantes João Marcelo Carvalho, Sócio do Santos Bevilaqua Advogados; Giovana Michelin Letti, Sócia da Bothomé Advogados; e Marcos Alves, Sócio da Atlântida Perícias. Mizzi Gomes Gedeon, CEO e Co-founder do Gomes Gedeon Advogados, atuou como debatedora e mediadora.

Francisco Borges destacou a relevância do tema, considerando as ações que afetam as reservas matemáticas, tema essencial para o equilíbrio dos planos de benefícios. Ele destacou a importância de se discutir o tema, observando que o Direito Previdenciário não fazia parte da grade curricular da formação jurídica há alguns anos, sendo oferecido hoje apenas como disciplina optativa. “É essencial que esse tema seja mais difundido desde a faculdade. Eventos como este são fundamentais. Hoje, vamos discutir a parte histórica das ações relacionadas ao tema na Justiça comum e na Justiça do Trabalho, além do conceito de reserva matemática, uma novidade para muitos magistrados”, disse.

Mizzi Gomes Gedeon ressaltou a importância de aprimorar o diálogo entre advogados e o Poder Judiciário para promover a cultura previdenciária, indo além da busca por homogeneidade nas decisões.

 

Histórico

João Marcelo Carvalho traçou um histórico sobre ações judiciais decorrentes de ilícitos trabalhistas e seus impactos nos contratos de previdência complementar. Ele explicou que, quando um empregado obtém ganho de causa na Justiça do Trabalho por não recebimento de verba trabalhista, isso pode ter consequências significativas para as EFPC. Se a verba trabalhista integra o salário de participação, tanto o empregado quanto o patrocinador deixaram de contribuir com valores adequados, resultando em um benefício previdenciário menor.

Carvalho destacou a dificuldade das EFPC em se defenderem em tais ações, que muitas vezes eram incluídas no polo passivo, sem terem recebido as contribuições devidas. Em 2018, o tema repetitivo 955 do STJ estabeleceu que os ilícitos trabalhistas deveriam ser sanados por indenização do empregador, sem impacto direto nas EFPC, exceto quando houvesse recomposição integral das reservas matemáticas.

Mais recentemente, o STF, no tema 1.166, reafirmou a competência da Justiça do Trabalho para julgar demandas relacionadas a contribuições de patrocinadores à previdência complementar.  Porém, avaliou que essa apuração não deve se aplicar aos planos de Benefício Definido (BD) e Contribuição Variável (CV), nos quais os participantes não possuem contas individuais, o que exige o recálculo de benefícios para ser tratado na Justiça comum.

Carvalho concluiu destacando a necessidade de uma colaboração mais ativa entre advogados e o Judiciário para promover a estabilidade dos contratos previdenciários.

Reservas Matemáticas

Marcos Alves, Sócio da Atlântida Perícias, explicou que as reservas matemáticas são fundamentais para garantir que os benefícios sejam pagos de forma sustentável. Ele mencionou o artigo 202 da Constituição Federal, que aborda a responsabilidade de patrocinadores e participantes. Alves destacou que, desde 2002, houve uma evolução no entendimento dos tribunais sobre o conceito de reservas matemáticas, que muitas vezes era confundido com custeio.

Alves apresentou exemplos práticos de como decisões equivocadas sobre reservas matemáticas impactaram os planos de previdência, especialmente quando juízes interpretaram erroneamente que elas se tratavam de custeio. “O custeio é o financiamento do fundo de pensão. A reserva matemática representa a quantidade de dinheiro que o fundo precisa para honrar o pagamento de benefícios”, explicou Alves.

Segundo ele, a correta interpretação da reserva e o entendimento da importância da sua recomposição para pagamentos futuros e retroativos são fundamentais para assegurar a estabilidade dos contratos previdenciários e o pagamento de benefícios futuros.

 

Casos Práticos

Giovana Michelin Letti, Sócia da Bothomé Advogados, trouxe à discussão a evolução da jurisprudência relacionada à previdência complementar, mencionando que a cultura jurídica sobre o tema demorou a se consolidar, com confusões frequentes entre as normas previdenciárias e outros códigos, como o do Consumidor e o Trabalhista. Ela mencionou a Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021) e os benefícios de pensão por morte como exemplos de temas recentes de ações que tem afetado a previdência complementar.

“A pensão por morte é uma questão recorrente em todas as EFPC. Muitos pensionistas solicitam argumentando que, como o INSS oferece a pensão por morte, eles também têm direito de recebê-la da EFPC. No entanto, é importante lembrar que os dois regimes são autônomos. A previdência complementar é baseada na constituição e nas reservas acumuladas. Se o participante não estiver inscrito no plano básico, não poderia ser julgado procedente com base no benefício concedido pelo INSS”, explicou.

Segundo ela, os tribunais geralmente aceitam essa distinção, reconhecendo que os regimes são diferentes e que, em muitos casos, não há reservas acumuladas para o pagamento do benefício. No entanto, há decisões contrárias que ordenam o pagamento da pensão por morte. “Alguns regulamentos permitem a inscrição de dependentes após o evento, desde que seja pago um valor de “joia”, que é uma forma de compensação financeira”, comenta.

Segundo ela, em relação ao tema 1.166 acompanhou um caso complexo. “Uma pessoa entrou na Justiça comum em 2018, levando em consideração o tema 955, e teve a ação julgada procedente, incluindo tanto a patrocinadora quanto a entidade no polo ativo. O juiz tentou separar a parte trabalhista, que acabou sendo extinta em 2022, e julgou a previdência separadamente. Em 2023, a fundação foi condenada a pagar, mesmo com a extinção da ação trabalhista. Este é um exemplo real das dificuldades enfrentadas nesse campo”, contou.

Giovana destacou que, enquanto a jurisprudência sobre previdência complementar avançou, ainda existem decisões desfavoráveis e inconsistentes, que podem ser replicadas em diferentes estados. “É essencial continuar o trabalho junto ao Judiciário para garantir a higidez do sistema previdenciário e a proteção dos direitos dos participantes”, concluiu.

O 19º ENAPC é uma realização da Abrapp com o apoio institucional da UniAbrapp, Sindapp, ICSS e Conecta. Patrocínio Ouro: Atlântida Multi-Contábil; Balera Berbel e Mitne Advogados; Barra, Barros & Roxo Advogados; Bocater Advogados; Bothomé Advogados; Gomes Gedeon; JCM Advogados Associados; Linhares & Advogados Associados; Marcones Gonçalves Advogados; Santos Bevilaqua Advogados; Torres e Corrêa Advocacia; Vieira Rezende. Patrocínio Prata: Braga de Andrade Advogados; Pagliarini e Morales Advogados Associados. Patrocínio bronze: Andrade Maia Advogados; Caldeira, Lôbo e Ottoni Advogados Associados; Mattos Filho Advogados; MLC Advogados Associados; PFM Consultoria e Sistemas; Pinheiro Neto Advogados; Raeffray Brugioni Advogados; Romeu Amaral Advogados; Wambier, Yamasaki, Bevervanço & Lobo Advogados.

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