Artigo: A previdência complementar fechada sob o prisma ESG – por Breno Rodrigo Pacheco de Oliveira e Flavio Martins Rodrigues*

Em 2021, um ano muito ativo em termos de abertura de capital na bolsa de empresas brasileiras com 45 novas companhias abertas listadas na B3, menos de 10% foram patrocinadoras de planos de previdência fechados, segundo dados da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). No mesmo período, nenhuma nova Entidade de Previdência Privada Fechada foi constituída.

A oferta de planos de previdência fechados, portanto, pode estar praticamente limitada àquelas organizações que, de longa data, já os instituíram e os mantém, sem o fundamental ingresso relevante de novos agentes nesse ambiente, até para seu fomento e crescimento.

Os planos privados de previdência propiciam a formação, aplicação, administração e distribuição de recursos para seus participantes, capazes de complementar a renda dessas pessoas físicas em momentos de risco social. Notadamente, há oferta de reposição de renda na invalidez e morte no período ativo do empregado, bem como na sua idade avançada.

Essa prática é fundamental para estimular que todas as gerações de empregados tenham capacidade financeira para si e para todo o seu núcleo familiar, resultando em significativo complemento de receita de origem privada. Os planos de previdência guardam poupança de longo prazo, portanto, trazem grandes benefícios para a própria economia e sociedade do país.

É importante que essa dinâmica seja não só mantida, como promovida e incentivada. Temos aqui, a nosso ver, um desafio duplo. O primeiro é conseguir alcançar e manter a valorização desse benefício por parte das novas gerações, ainda em início da carreira. Estamos diante de um mundo cada vez mais dinâmico e com um mercado de trabalho desafiador e incerto. Esses fatores não devem inibir o oferecimento de planos de previdência. Ao contrário, esses planos estão inseridos nos valores e princípios mais contemporâneos, tão caros aos jovens e relacionados com o propósito das empresas quanto à sustentabilidade de nosso planeta e de nossa sociedade. Essas intenções estão referidas pelos pilares ESG (Ambiental, Social e de Governança) e devem impulsionar a percepção de que planos de previdência privada não são um mecanismo de poupança individualista. Trata-se de modelo sempre com algum nível de mutualismo, capaz de desonerar o Estado de demandas futuras dos cidadãos e ajudar no desenvolvimento econômico brasileiro.

O segundo desafio é criar e manter o interesse para que novas organizações, que se fazem presentes por meio de jovens fundadores, investidores e administradores, percebam que os planos de previdência privada continuam sendo fundamentais não só para a atração e retenção de talentos, mas também por constituírem forte contribuição para a sociedade em geral. Como vimos pelos dados da Previc, esse interesse não está ocorrendo.

Os desafios não envolvem a própria previdência privada fechada em si, que possui sólida estrutura no Brasil com mais de um trilhão de reais em reservas acumuladas ao longo de muitos anos. Não existe a necessidade de alterações estruturais, ao contrário do que ocorre no regime previdenciário público, apesar da reforma aprovada no Congresso em 2019. Estudo recente feito pelo Grupo Allianz mostra que o regime previdenciário brasileiro vem apresentando deterioração e aparece na 65ª posição de uma lista de 75 países no que tange à sua sustentabilidade.

A questão está muito mais centrada na percepção da relevância dos fundos de previdência fechados. Ambos os públicos, jovens gerações de profissionais/empregados e novas gerações de companhias, bem como seus administradores valorizam fortemente todo o entorno e a efetiva atenção e atuação de todos os stakeholders sobre os pilares ambiental, social e de governança. Nada mais evidente e concreto para um efetivo e relevante suporte ao pilar social do que as contribuições que empresas e empregados fazem aos planos de previdência privada fechados.

Esses montantes são capitalizados ao longo dos anos e servem para alavancar a economia com a vantagem de auxiliar na geração de educação e planejamento financeiro para a população. O processo de acumulação de recursos destina-se a possibilitar que as gerações, que formam a força de trabalho, possam complementar seus rendimentos no futuro.

A instituição e manutenção de planos de previdência privada fechados pelas companhias a seus empregados também se vincula a alguns dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Notadamente, o ODS 3 (“Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades”) e o ODS 8 (“Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos e todas”). Especialmente quando pensamos nos seus vários impactos positivos, desde a tranquilidade relacionada a uma poupança para uma vida mais confortável, auxílio ao núcleo familiar, empreendedorismo, movimentação da economia e necessidade menor de auxílio estatal.

Não resta dúvida que poucas instituições são tão concretas e evidentes como parte do pilar S do ESG quanto a iniciativa das empresas em desenvolver e participar dos planos de benefícios complementares de seus empregados. Todavia, esse fato está passando desapercebido das novas organizações que passaram a integrar o nosso mercado de capitais. Há, ainda, muitas companhias, que embora possuam expressivo porte econômico, não são patrocinadoras de planos de previdência privada para seus colaboradores.

É oportuno, portanto, um diálogo multidisciplinar entre agentes do mercado, sob a coordenação da Previc e da Comissão de Valores Mobiliários-CVM, para debater a inserção, valorização e o incentivo das companhias para que participem e contribuam com a oferta de planos de previdência privada para seus empregados.

*Breno Rodrigo Pacheco de Oliveira (à dir. na foto) é vice-presidente jurídico da Telefônica Brasil S.A. e Presidente do Conselho Deliberativo da Visão Prev Sociedade de Previdência Complementar

Flavio Martins Rodrigues (à esq na foto) é mestre em direito e advogado especializado em previdência complementar

Artigo publicado originalmente no site da Exame

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