A agenda ASG é uma exigência dos dias atuais?
Tal pergunta orientou os debates de uma das plenárias do 45º Congresso Brasileiro de Previdência Privada, realizado em São Paulo pela Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – Abrapp.
Em tal plenária tive a oportunidade de registrar que a agenda ASG tem basicamente duas dimensões, que se complementam.
A primeira diz respeito ao aprimoramento e integração das análises de riscos dos investimentos. Dessa forma, além dos riscos tradicionais de crédito, de mercado, de liquidez, operacionais e regulatórios, é preciso que os investidores também analisem cada negócio sob a perspectiva do risco ambiental, risco social e risco de governança.
Não se pode negar, por exemplo, que a análise de riscos de um investimento em uma mineradora terá que contemplar o risco ambiental. Ou que o investimento em uma empresa do varejo terá que passar pela avaliação de governança e a análise da relação dessa empresa com seus fornecedores.
Quanto ao “S” de social – que para alguns pode parecer algo abstrato – um dos riscos básicos é a relação da empresa investida com seus empregados. Não há empresa duradoura sem uma boa política de recursos humanos. Aliás, sobre o social vale lembrar que a Lei das Sociedades por Ações, de 1976, exige que “o acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua” (Lei 6.404/1976, art. 116, par. único – grifamos).
Sob essa ótica da análise de riscos de um investimento, a agenda ASG (a meu ver, o “G” de governança já inclui o “I” de integridade) é uma exigência prática, com ganhos diretos e imediatos para os planos previdenciários, seus associados e demais atores do mercado.
A segunda dimensão da agenda ASG é a adoção de políticas de responsabilidade para a indução de boas práticas ambientais, sociais e de governança, com ganhos indiretos e de médio e longo prazos.
Assim, os grandes investidores institucionais, como os fundos de pensão, podem influenciar o mercado cobrando alguns comportamentos que busquem o aprimoramento dos negócios e das relações sociais e econômicas. Um exemplo, dentre tantos outros, é a necessidade de uma política mais assertiva para o combate ao etarismo, já que a população brasileira está envelhecendo e tal fenômeno tem múltiplas consequências. É preciso lembrar que as reformas do sistema previdenciário têm aumentado a idade mínima para aposentadoria, enquanto o mercado tem reduzido a idade máxima para contratar pessoal. Trata-se de um paradoxo que merece atenção.
Nessa faceta de adoção de políticas de responsabilidade, é fundamental avançar na criação de métricas para mensuração de resultados, pois o que não é medido não pode ser eficientemente administrado.
Grandes investidores institucionais, dentre eles alguns dos maiores fundos de pensão brasileiros, tem procurado estar à frente dessa agenda ASG.
É uma pena que, em razão da atratividade irrecusável das altas taxas de juros dos títulos públicos, algumas fundações de previdência não consigam ir além em seu protagonismo indutor das boas práticas ASG. No Brasil, todos nós nos tornamos “juristas”. Não porque entendemos de leis, mas porque todo brasileiro entende de juros! Não há como um gestor eficiente, ou mesmo um poupador de classe média, ignorar o poder de sedução de uma NTN-B que garante a reposição da inflação e mais um juro real bem acima da meta atuarial!
Apesar dessas limitações conjunturais (sempre haverá esperança por juros menores…), e também em razão da obrigação de diversificação de carteiras, os investidores institucionais têm ajudado a empurrar para a frente esse relevante debate sobre temas ambientais, sociais e de governança.
A adoção de políticas e práticas ASG é medida racional e indispensável para que se alcance a tão desejada sustentabilidade dos negócios. Como se sabe, a sustentabilidade decorre da observância do velho binômio “rentabilidade” e “segurança”, já exigido pelas normas de investimentos.
Em uma de suas famosas tiradas, Warren Buffet diz: “quando alguém me oferece a oportunidade de ganhar dinheiro rápido, eu rapidamente digo não”. Por quê? Porque não basta a rentabilidade imediata. É preciso também a segurança, isto é, a sustentação no tempo, a sustentabilidade do negócio.
A Resolução CGPC 13/2004, que está completando 20 anos, induz à prática ASG, pois estabelece que “todos os riscos que possam comprometer a realização dos objetivos da EFPC devem ser continuamente identificados, avaliados, controlados e monitorados”. Todos os riscos são…todos os riscos.
A Resolução CMN 4.994, por sua vez, estabelece que “a EFPC deve considerar na análise de riscos, sempre que possível, os aspectos relacionados à sustentabilidade econômica, ambiental, social e de governança dos investimentos” (art. 10, par. 4º).
Vale registrar que o Conselho Monetário Nacional e o Bacen, no que diz respeito às instituições financeiras, explicitaram a necessidade de adoção de políticas de responsabilidade social, ambiental e climática (Resolução CMN 4.945/2021), além de tratar do aprimoramento e da integração da análise de riscos, com o acréscimo dos riscos social, ambiental e climático (Resolução CMN 4.943/21, consolidada na Resolução CMN 4.557, art. 6º).
Seja na dimensão do aprimoramento da análise de riscos, seja no aspecto da adoção de políticas de responsabilidade para a indução de boas práticas, a agenda ASG não tem nada de bom-mocismo ou ação voluntarista. Nem tampouco se trata de um verniz para o capitalismo. É uma agenda necessária, que veio para ficar, e que dará maior eficiência ao ambiente dos negócios.
*Adacir Reis é advogado, Sócio do Escritório Adacir Reis Advocacia e autor do livro Curso Básico de Previdência Complementar. Foi Secretário de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social e membro da Comissão de Juristas do Senado Federal para a Reforma da Lei de Arbitragem e Mediação.