A Presidente da Associação de Administradoras de Fundos de Pensão (AFP) do Peru, Giovanna Prialé, concedeu entrevista à editoria Economía y Negocios do jornal chileno El Mercurio sobre a recém-promulgada Reforma da Previdência peruana. A economista esteve presente no Seminário Internacional Abrapp-FIAP, nos dias 3 e 4 de outubro, no Rio de Janeiro, ocasião na qual foi realizada a entrevista.
Com o título “Giovanna Prialé: ‘Para que uma reforma política seja sustentável, ela precisa ser legitimada pela população'”, a entrevista explica que o Peru passou por sete processos de retirada de fundos que reduziram pela metade as poupanças previdenciárias. A economista afirma que este “ponto de inflexão” foi um catalisador para resolver 12 anos de discussão sobre o assunto.
Leia abaixo a versão traduzida da entrevista realizada pelo jornalista Joaquín Aguilera R.:
Giovanna Prialé: “Para que uma reforma política seja sustentável, ela precisa ser legitimada pela população”
O país vizinho passou por sete processos de retirada de fundos que reduziram pela metade as poupanças previdenciárias. No entanto, a economista afirma que este “ponto de inflexão” foi um catalisador para resolver doze anos de discussão sobre o assunto.
Joaquín Aguilera R.
De Rio de Janeiro
O ano de 2012 foi o último antecedente de uma reforma no sistema de pensões no Peru, com a criação de um pilar não contributivo para a população que não recebia aposentadorias do subsistema público de repartição, nem das AFPs que compõem o sistema privado. Desde então, a sustentabilidade fiscal dos benefícios tornou-se cada vez mais complexa, situação que piorou gravemente com as sete retiradas dos fundos de pensão autorizadas sucessivamente pelo Congresso peruano, desde a pandemia da COVID-19 até este ano.
Embora os ativos previdenciários administrados pelo setor privado tenham sido reduzidos pela metade nesse processo, a presidenta da Associação de AFPs do Peru, Giovanna Prialé, comenta ao El Mercurio que esse marco foi o que levou ao acordo que resultou em uma profunda reforma do sistema, aprovada no mês passado.
A economista apresentou o caso peruano no seminário organizado esta semana pela FIAP e Abrapp, no Rio de Janeiro, como exemplo de políticas para combater a informalidade e os custos do sistema. A reforma contempla, entre outros pilares, o registro automático da população nos sistemas de poupança, a transição do regime público de repartição para um de contas nocionais, a criação de uma pensão mínima para todos os filiados, a limitação da retirada de fundos ao se aposentar e a possibilidade de contribuir por meio do consumo.
— Depois de tanto tempo de discussão, como se alcança o acordo político para uma reforma tão relevante?
“Tivemos um ponto de inflexão crítico com os sete saques que o Peru sofreu, porque já tínhamos uma população informal que não contribui para a aposentadoria e que, de alguma forma, será responsabilidade do Estado atender. Por outro lado, há a população que estava economizando no sistema privado de pensões e começou a usar essa poupança de longo prazo como gasto corrente, para financiar aluguel, educação, transformando-a em um componente de sua renda disponível. Isso foi como uma ferramenta catalisadora para refletir sobre a importância de uma reforma previdenciária e para alcançar consensos no nível do Congresso e do Executivo, principalmente porque há uma profunda preocupação em manter a estabilidade macroeconômica e impedir que o custo fiscal dispare.”
— Em que medida isso garante ou contribui para que não haja mais saques?
“Para que uma reforma política seja sustentável, ela precisa ser legitimada pela população. Aqui, acredito que uma boa campanha de comunicação é fundamental para explicar os benefícios à população. Toda reforma é aperfeiçoável e precisa acompanhar a estrutura da população e a forma como as rendas são geradas. Mas a única maneira de que seja sustentável é a população perceber que realmente traz benefícios; aqui há um foco importante, por um lado, com a pensão mínima que não existia antes e, por outro, com a possibilidade de ter fontes complementares de poupança para a aposentadoria, como a pensão por consumo. É fundamental que a população sinta que essa reforma gera muito mais benefícios do que o que existia antes.”
— Que mensagem essa reforma transmite aos países que estão discutindo o tema?
“É muito importante que o tema das pensões não seja ideologizado, porque o que temos agora são dois extremos. Por um lado, a pressão de grupos políticos que acreditam que voltar ao sistema de repartição é a solução, pois o Estado deve financiar as pensões porque é uma questão de solidariedade; por outro lado, há a pressão de que as pessoas são donas de suas contribuições, pois são fruto de seu esforço, e esse é um direito que não deve ser perdido de vista. Acho importante chegar a um ponto de consenso, um ponto onde se entenda que o sistema de seguridade social deve ser estruturado em pilares.”
“Acho muito importante que, no caso do Peru, não se estigmatize uma lei só porque vem de um lado ou do outro, e se pense no que é melhor para o país a longo prazo. Aqui, sempre farei um apelo aos políticos em geral, porque a política é a arte de fazer o possível, pensando no melhor para a cidadania.”
Informalidade: Desafio Comum na América Latina
Giovanna Prialé falou no painel sobre informalidade do seminário sobre tendências globais em pensões organizado pela FIAP e Abrapp, no Rio de Janeiro.
Um elemento “disruptivo” da reforma peruana que Prialé destaca é a possibilidade de contribuir voluntariamente por meio do consumo, com uma alíquota de 1% do equivalente ao IVA no Chile e um limite máximo. “Precisamos começar a ser disruptivos se quisermos gerar interesse nos trabalhadores informais de alta e média renda para que vejam a seguridade social como um caminho para começar a obter algo tangível no curto prazo”, afirma.
Embora no Peru o percentual de informalidade laboral seja de cerca de 70%, outro país que implementou essa medida é o Uruguai. Esse país tem uma taxa de informalidade mais próxima de 22%, mas conta com uma alta porcentagem de população rural, onde tem focado seus esforços. No ano passado, aprovaram a reforma que introduziu a contribuição por consumo, o que, segundo Ignacio Azpiroz, presidente da AFAP, associação de administradoras de pensões uruguaias, significa que “antes só era possível fazer uma poupança voluntária se estivesse contribuindo normalmente; agora qualquer pessoa pode fazê-lo”.
*Matéria publicada originalmente na editoria Economía y Negocios de El Mercurio