Investimentos em FIPs terão Manual de Boas Práticas e podem ser tema de Autorregulação

Webinar da Comissão Técnica Sul de Assuntos Jurídicos

Há espaço para as EFPCs ampliarem seus investimentos em Fundos de Investimentos em Participações (FIPs), oportunidade que exige controles adequados e pode receber contribuições da Autorregulação. O assunto foi discutido no webinar da Comissão Técnica Sul de Assuntos Jurídicos da Abrapp, realizado na última semana, com participação a Previc, e que já está disponível em vídeo no Canal do YouTube da Associação.

Celeiro de ideias e reconhecimento – Na abertura do evento, o Diretor-Presidente da Abrapp, Luís Ricardo Martins, ressaltou a importância das iniciativas realizadas pelas Comissões Técnicas da Abrapp. “As Comissões, costumo dizer, são celeiros de ideias que integram inúmeros craques do nosso segmento. São mais de 900 pessoas colaborando para o nosso ambiente”, observou Luís Ricardo. “

Sobre o programa de Autorregulação, iniciativa de Abrapp, Sindapp e ICSS, Luís Ricardo ressaltou que é motivo de orgulho para o sistema, reconhecido no seio do Conselho Nacional de Previdência Complementar – CNPC, órgão estrategista do setor. A iniciativa mais recente do programa, decorrente desse reconhecimento pelo CNPC, é a elaboração em curso de um Código de Autorregulação em Qualificação e Certificação Profissional.

Desmistificação do FIP – Luís Ricardo também destacou a importância de desmistificar e resgatar o veículo FIP, que passou por um viés de demonização em anos recentes. O atual ambiente econômico reforça a importância de as EFPCs contarem com instrumentos adequados para a diversificação de suas estratégias de investimento. Nesse sentido, a Abrapp vem tratando da revitalização dos FIPs com outras associações, como a Anbima e a Abvcap, além de ter constituído um grupo de trabalho específico. “Estamos fazendo esse debate no GT Ad-Hoc Boas Práticas para Investimentos em FIPs da Abrapp, com a participação da Previc, que tem nos ajudado a trazer a visão da Supervisão. Temos que fazer esse trabalho a quatro mãos”.

A previdência complementar fechada trilhou o caminho da profissionalização e hoje é exemplo de gestão fiduciária realizada com excelência, ressaltou o Diretor-Presidente da Abrapp. Os números do sistema mostram a sua maturidade e seu profissionalismo. No momento mais agudo da pandemia, em 2020, o setor conseguiu reverter o deficit de R$ 50 bilhões em março para um superavit agregado de quase R$ 8 bilhões em dezembro. E, em abril de 2021, já registrava quase R$ 20 bilhões de superavit.

“Esse é o nosso sistema: um sistema que entrega, um sistema pagador. Sabemos o quanto essa caminhada da profissionalização foi importante”, afirmou Luís Ricardo, acrescentando que as EFPCs hoje pagam cerca de R$ 70 bilhões anuais para mais de 900 mil aposentados e pensionistas.

Atenção ao processo de investimento – Jarbas Antonio de Biagi, Diretor Executivo responsável pela CT de Assuntos Jurídicos, afirmou que a diversificação de ativos é fundamental para o setor e, inclusive vem sendo tratada nas normas mais recentes do Conselho Monetário Nacional. A Resolução CMN 4.661/2018, por exemplo, traz ainda questões principiológicas a serem observadas pelos dirigentes em relação aos processos de investimento.

Com relação aos FIPs, Jarbas destacou que a Previc já tratou do tema em  instruções específicas, indicando os processos a serem seguidos. “É uma operação que possui risco, como todas em que atuamos. Até mesmo o título público, se não rentabilizar a taxa atuarial, potencializa um risco de custo alto ao plano. Mas esta operação (FIP) por trabalhar muito no seio privado, leva uma preocupação maior de nós gestores, o que é verdadeiro”, afirmou o Diretor. “Tudo é processo. E o papel do gestor é esse: ver e cuidar do processo, para que possa informar, se surgir algum ponto, sobre como ele se desenvolveu¨.

Cenário de estagnação – Dados estatísticos mostram a importância de se rediscutir o tema de investimentos em FIPs, observou Eduardo Henrique Lamers, um dos Coordenadores da CT Sul de Assuntos Jurídicos. Ao trazer dados históricos sobre o tema, ele informou que no início de 2010, as EFPCs possuíam R$ 9,4 bilhões investidos nesses veículos, o que representava à época 1,8% do total do sistema. Em 2014, veio o ápice, com R$ 19,5 bilhões investidos, correspondendo a 2,9% dos recursos, seguido de um período de retração. Hoje constata-se uma estagnação: os investimentos em FIPs somaram R$ 9,56 bilhões ao final de 2020, apenas 0,9% dos recursos de um sistema de R$ 1 trilhão.

“O primeiro estudo que precisamos fazer é procurar os motivos que levaram a essa estagnação, dentro de um investimento que é bom sim, e que traz, muitas vezes, uma rentabilidade muito expressiva e auxilia os planos no cumprimento das suas metas atuariais”, destacou Lamers.

O Coordenador acrescentou que é válido amadurecer o debate da inserção da Autorregulação como uma via moderna de regulação para esse veículo, contribuindo para fortalecer o processo de investimento e a construção de um ambiente com maior segurança jurídica para as EFPCs realizarem seus investimentos.

Respeito ao processo de investimento – O Coordenador da Comissão Mista de Autorregulação, José Luiz Rauen, também atua como representante titular das EFPCs na Câmara de Recursos da Previdência Complementar. Em sua apresentação, ele citou alguns aspectos que contribuíram para a “demonização” dos FIPs no passado: despreparo de dirigentes e demais profissionais de investimentos; constatação de desvios éticos, pontos fora da curva, mas que desgastaram a imagem do segmento; e a não observância ao processo de investimento.

Em referência à fala de Jarbas, Rauen reforçou que no fim do dia o que importa é o iter, o caminho utilizado para a decisão e o acompanhamento do investimento até sua conclusão. “Não dá para fazer investimento nenhum, principalmente em FIP, sem due dilligence, análises prévias de riscos, de garantias, análises jurídicas, pareceres, registros em atas para dar rastreabilidade a tais decisões, evitar conflitos de interesses etc. Não basta analisar previamente e deixar que a natureza resolva; é preciso monitorar”, ressaltou Rauen.

Contribuições da Autorregulação – O Coordenador da Comissão Mista destacou que a Autorregulação foi uma resposta do setor de previdência complementar fechada à sociedade. O primeiro Código do programa teve como foco a Governança de Investimentos, e o segundo Código tratou de Governança Corporativa. Atualmente a Comissão está voltada para a elaboração de um Código com foco em Qualificação e Certificação Profissional.

Em resposta à pergunta de Igor Dainton da Rosa, Coordenador da CT Sul de Assuntos Jurídicos, durante o debate, sobre como a Autorregulação pode contribuir para trazer mais segurança para os investimentos em FIP, Rauen opinou que um Código de Autorregulação com esse foco poderia ser de muita utilidade para estabelecer normas claras e objetivas sobre o iter desse processo de investimento. “Tratando de condições mínimas para due dilligence, análises prévias de riscos, de garantias jurídicas etc. Que monitoramento deve ser feito, como devem se comportar os dirigentes das entidades e seus profissionais”, exemplificou Rauen.

Ele observou que o objetivo da Autorregulação é induzir melhores práticas, indo além do exigido pelas normas vigentes, e o processo se dá de forma colaborativa. Assim, a Comissão Mista integra especialistas, representantes de entidades de diversos portes e tipos de patrocínio, além de representantes do próprio órgão de supervisão, para a elaboração desses Códigos.

Aspectos importantes para a decisão – O FIP é um veículo para a realização de investimentos em Private Equity e Venture Capital, explicou Arlete Nese, consultora do Grupo de Trabalho Ad-Hoc Boas Práticas para Investimentos em FIPs da Abrapp. Enquanto nos Estados Unidos e no Reino Unido o investimento em PE e VC mostra-se expressivo, representando 1,68% e 1,49% do PIB, respectivamente, no Brasil este percentual está em 0,35%. No caso brasileiro, os maiores investidores em FIPs são os Family Offices, seguidos pelas EFPCs. “Embora tenhamos reduzido a participação nessa classe de ativos, temos sim uma parte relevante, mas com um espaço imenso para se avançar”.

Arlete destacou passos essenciais para investir com segurança, sendo o primeiro avaliar as razões da EFPC para considerar o FIP no seu portfólio. Isso dependerá do momento em que está a entidade e o seu plano. São questões pertinentes: Se o plano está maduro e há uma duration reduzida, faz sentido considerar essa classe de ativos? A depender da  estrutura interna da EFPC para desenvolver um processo de seleção robusto, o investimento será de maneira primária? Como está o mercado secundário para essa aquisição? Esses são alguns dos fatores que devem ser avaliados pelos dirigentes ao decidirem se devem incluir o ativo nos estudos de alocação estratégico, explicou ela.

Outro fator importante é o aspecto qualitativo na seleção dos gestores, o que exige também que os profissionais da EFPC estejam capacitados para poder identificar os melhores no mercado e não somente os que vêm até a entidade. Arlete observou que o resultado apenas confirma o bom gestor, mas essa relação deve começar muito antes do investimento. “São as diligências, conversas, entrevistas e também o fator tempo”, ressaltou a consultora, que também atua como pesquisadora e professora no ecossistema de PE e VC.

“Porque é uma relação que tem três fatores-chave: PPP – pessoas, pessoas, pessoas. E para você conhecer pessoas, somente o tempo. Não é o contrato que vai frear uma pessoa ruim ou mal intencionada de ir adiante. Então, é preciso conhecer os melhores (gestores) e as boas pessoas”, disse Arlete, acrescentando o processo de monitoramento como passo seguinte essencial

Iniciativas para as associadas – Sobre as iniciativas da Abrapp que contribuem para que as EFPCs avaliem seus atuais processos, a consultora destacou o programa de Autorregulação, que já conta com o Código e o Selo de Autorregulação em Governança de Investimentos. “Recomendo fortemente para vocês entenderem como funciona, quem ainda não teve a oportunidade de fazer isso”.

E vem novidade por aí: o GT de Boas Práticas para Investimentos em FIPs deverá lançar um Manual para auxiliar as associadas. Esse trabalho reúne profissionais de diferentes áreas, além de ser fundamentado em estudos, guias, Códigos de Autorregulação e experiências existentes no Brasil e no exterior, disse Arlete. “O Guia tem por objetivo trazer recomendações que propiciem melhores condições para se avaliar e considerar esse tipo de ativo no portfólio de investidores institucionais, especificamente as entidades fechadas de previdência complementar, com segurança para todos. Entendemos que devem ser critérios bastante objetivos, tendo certo que existe a fase antes e depois do investimento”.

 Novidades na Supervisão – Maurício de Aguirre Nakata, Diretor Substituto de Monitoramento e Fiscalização da Previc, destacou que o órgão está contribuindo para o GT da Abrapp voltado a FIPs com dois representantes de alto nível: Peterson Gonçalves, Chefe Regional do Escritório de Representação em São Paulo, e Annette Lopes Pinto, Chefe Regional do Escritório de Representação no Rio de Janeiro.

Nakata também informou novidades introduzidas pelo órgão de fiscalização a partir deste ano, com a integração de dois novos pilares ao modelo de Supervisão Baseada em Riscos: Avaliação Econômica e Atuarial e Riscos e Controles, que se somam ao pilar de Governança e Controles Internos, este último já trabalhado há cerca de cinco anos. O representante observou que no pilar de Riscos e Controles a Previc definiu como principais riscos que irá analisar: riscos de crédito, mercado, liquidez e atuarial. Já no pilar Avaliação Econômica e Atuarial, foram selecionados alguns indicadores de solvência,  investimento, atuarial, de resultados e eficiência operacional, que inclui o PGA.

O representante da Previc também destacou a opinião positiva do órgão sobre a Autorregulação, que pode contribuir como um facilitador para o trabalho de supervisão, e a crescente profissionalização do sistema. “É muito importante a profissionalização dos dirigentes das entidades. Essa profissionalização vem da valorização da ética na governança, na observância do dever fiduciário, na seleção dos gestores, no processo seletivo dos dirigentes, na reputação ilibada, no trabalho com os comitês de investimento, riscos e de auditoria”.

Com relação aos FIPs, Nakata observou que o crescimento exponencial desse tipo de investimento pelas EFPCs de 2010 a 2014,  a uma taxa de quase 50%, não foi acompanhado dos controles adequados, resultando nos problemas que se seguiram. Em 2015 e anos seguintes, os investimentos na classe de ativos diminuíram progressivamente de R$ 18 bilhões para R$ 9 bilhões e, em 2021, o atual patamar é de R$ 8 bilhões investidos em FIP.

O representante da Previc acrescentou que no processo de fiscalização foi possível observar uma melhoria significativa da governança das EFPCs de 2010 para o atual momento, incluindo os processos seletivos para dirigentes e a profissionalização dos colaboradores das entidades. “Queremos realmente desmistificar: a Previc não é contra esse tipo de investimento. Precisamos ter um olhar muito específico para os gestores, hoje já se consegue fazer um track record deles, conhecer o histórico, e fazer uma avaliação de risco desses investimentos. E esperamos que esse investimento volte a dar a rentabilidade que costuma dar para as entidades”, completou. 

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