Nova edição da Revista: A promoção da poupança previdenciária dos profissionais liberais*

*Edição n. 444 da Revista da Previdência Complementar – uma publicação da Abrapp, ICSS, Sindapp e UniAbrapp.

 

Por Flávia Silva

Público heterogêneo com renda variável demanda abordagem ampla que envolve comunicação, flexibilidade contributiva e tecnologia – O segmento de profissionais autônomos ou liberais é diverso, fazendo com que parte desse público seja de difícil alcance para a Previdência Complementar. As barreiras que se impõem a médicos, advogados, engenheiros, entre outras profissões que costumam trabalhar por conta própria, são tanto comportamentais quanto estruturais, servindo como impedimento ao início do ato de poupar. Pouco conhecimento financeiro associado à inércia e ao viés do presente costumam ser elementos definidores. E mesmo quando parecem dispostos a adentrar a jornada da aposentadoria, esses indivíduos acabam prejudicados pelo desenho pouco flexível dos planos de benefícios, que impõem penalidades ou inviabilizam o acesso aos recursos quando surgem despesas inesperadas ou redução na receita laboral.

Diferentes pesquisas vêm sendo realizadas com o intuito de ampliar a compreensão sobre como oferecer o suporte adequado aos profissionais autônomos a fim de que economizem para a aposentadoria. Pela primeira vez, o Instituto NEST Insight e o Departamento de Trabalho e Previdência britânico (Department of Work and Pensions – DWP) compartilham os resultados de estudos conjuntos realizados “no mundo real” entre 2021 e 2022, os quais envolveram diferentes estágios de pesquisa exploratória. As principais conclusões foram reunidas no relatório “Exploring practical ways to support self-employed people to save for retirement – Summary of findings from a multi-year research programme”.

Diferenças e semelhanças – Os chamados “profissionais liberais” atuam em uma ampla gama de setores e apresentam hábitos específicos em se tratando da gestão da vida financeira e familiar. Como não constituem uma população homogênea, os estudiosos têm ciência da inexistência de uma solução única para ampliar a cobertura previdenciária junto a esse público. No estudo em questão, forma explorados uma variedade de estímulos e “nudges” comportamentais em diferentes ambientes e junto a públicos-alvo variados.

A despeito da diversidade, os profissionais autônomos têm em comum o interesse ou vontade de poupar para a aposentadoria, mas a tarefa é dificultada por vieses comportamentais, como a inércia e o viés do presente, segundo o qual as pessoas optam por uma recompensa menor no “agora” em vez de esperar por ganhos maiores no futuro. Diferentes níveis de conhecimento e confiança na previdência, além de certa falta de interesse de alguns mercados em oferecer produtos financeiros apropriados, completam o rol de fatores complicadores.

Renda instável – Muitos profissionais autônomos não dispõem de uma renda regular e previsível, com receitas e despesas variando de acordo com a demanda, condições macroeconômicas e rotinas de trabalho. Mesmo nos casos em que a renda é mais estável, ela pode ser incerta, inibindo a reserva de um montante contributivo regular à Previdência Complementar. Segundo os estudiosos, ainda que estabeleçam um valor regular para os aportes, estes tendem a ter como parâmetro períodos de renda mais baixa e, por causa da inércia, tais valores são mantidos em períodos de rendimentos mais elevados, podendo levar esses indivíduos a poupar menos do que poderiam no longo prazo.

De fato, as pessoas que trabalham por conta própria podem efetivamente possuir menos recursos excedentes para economizar regularmente. Embora a volatilidade na renda do trabalho autônomo imponha empecilhos para se estimar com precisão o rendimento dos trabalhadores autônomos, a pesquisa sugere que, em média, aqueles que trabalham em tempo integral ganham menos do que os trabalhadores formalmente empregados.

Também por isso, muitos autônomos fazem uso de abordagens mecânicas de gestão financeira, o que incluiria contribuir para um plano de pensão de forma eventual, quando julgam ser mais acessível. Esse público também busca liquidez para amenizar, quando necessário, a volatilidade orçamentária. Portanto, comprometer-se com um plano de pensão tradicional ou outro mecanismo de poupança de longo prazo pode ser considerado algo demasiadamente oneroso, trabalhoso e sobretudo arriscado no curto prazo.

Comunicação – A comunicação customizada para o profissional liberal pode aumentar o engajamento previdenciário. No entanto, as mensagens, por si só, independente do meio em que são propagadas, não são suficientes para alterar significativamente os comportamentos em relação à poupança de aposentadoria. Ou seja, a abordagem tende a ter resultados mais contundentes quando combinada a outras intervenções de suporte à poupança de longo prazo.

Ainda assim, a pesquisa NEST/DWP realizada em 2021 e 2022 apurou que o “timing” das mensagens têm o poder de promover campanhas de engajamento mais eficazes quando veiculadas em períodos em que os autônomos estão mais envolvidos com o seu planejamento financeiro. Um dos momentos citados em que a comunicação se mostra bastante efetiva é na época da declaração do Imposto de Renda, por exemplo.

Ao conversar com profissionais liberais sobre a aposentadoria, os especialistas sugerem a transmissão de alguns recados, em especial. Em primeiro lugar, é importante deixar claro que poupar no longo prazo é uma meta tangível. Por isso, recomenda-se a proposição de objetivos mais modestos e “palatáveis” do que as contribuições mensais ou o aporte anual total. Ao invés disso, é mais eficaz – isto é, gerenciável e tangível – tratar de potenciais contribuições diárias de, digamos, R$ 10.

Igualmente relevante é reforçar que a poupança previdenciária pode beneficiar a pessoa no presente – em substituição a vantagens de longo prazo. Segundo a pesquisa, o foco no “aqui e agora”, isto é, em quais ações o profissional pode adotar com efeito imediato – como a isenção de impostos sobre as contribuições – tem mais impacto do que falar sobre possíveis ganhos futuros, como retornos nos investimento e juros compostos.

Outro ponto interessante levantado pela pesquisa NEST/DWP é que os profissionais autônomos parecem ser particularmente céticos em relação a mensagens recebidas de empresas de serviços financeiros. Segundo os autores, muitos desses profissionais costumam descartar e-mails sobre opções de poupança para aposentadoria por enxergá-los como propaganda, mesmo quando o conteúdo é oriundo de uma organização conhecida ou a qual são afiliados.

É comum, ainda, que as pessoas em geral, incluindo os autônomos, recorram principalmente à família, amigos e fontes oficiais para obter informações financeiras. Para os profissionais liberais, ter uma autoridade confiável (como uma associação da indústria) para preencher essa lacuna pode ajudar a aumentar a conscientização sobre oportunidades e ferramentas de constituição de poupança previdenciária. (Continua…)

 

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