Nova edição da Revista: Países que adotaram a abordagem de Supervisão Baseada em Risco de forma pioneira já reveem modelos para incluir riscos mais diversos*

*Edição nº 449 da Revista da Previdência Complementar – uma publicação da Abrapp, ICSS, Sindapp e UniAbrapp.

 

Por Flávia Silva

Supervisão Baseada em Risco é modernizada mundo afora – Vários países dentre os que detêm os maiores e mais desenvolvidos sistemas de Previdência Complementar do mundo vêm atualizando suas abordagens de Supervisão Baseada em Risco (SBR), seja via a ampliação dos riscos sob escrutínio, seja por meio do incremento de ferramentas e estrutura interna das autoridades responsáveis. Canadá, Austrália e Inglaterra, por exemplo, já fizeram ou vêm fazendo movimentações no sentido de renovar sua metodologia a fim de torná-la mais flexível, inclusiva e responsiva em ambientes econômico-financeiros cada vez mais voláteis. Outras prioridades observadas são os investimentos em TI e a capacitação continuada dos colaboradores.

Novos tempos Em meados de outubro, Peter Routledge, titular da OSFI – Office of the Superintendent of Financial Institutions – órgão regulador e supervisor canadense de bancos, seguradoras e 1.180 planos de pensão sob a fiscalização do governo federal – detalhou os primeiros passos da implantação do novo modelo de Supervisão Baseada em Risco (SBR) a ser adotado pela agência. No âmbito da Previdência Complementar, a autoridade, criada em 1987, cuida de programas que totalizam 1,2 milhão de participantes e CAN$ 238 bilhões em ativos sob gestão.

O processo de revisão da abordagem teve início em 2021, por meio da iniciativa “Blueprint of Transformation” ou “Projeto de Transformação”, que vem norteando a maior reforma do modelo em 25 anos. As primeiras mudanças entrarão em vigor efetivamente em abril de 2024. “Tomamos medidas céleres e proativas a fim de garantir que os entes supervisionados possam se adaptar às transformações em nosso ambiente de risco, missão que pretendemos manter no ano fiscal 2023/2024”, declarou Rutledge ao apresentar o Relatório Anual da OSFI referente ao exercício anterior.

O titular explica que o sistema financeiro do país já começou a se ajustar a um ambiente de taxas de juros crescentes ocasionado pelo aumento “acelerado” da inflação, com impactos sobre as organizações. Ele prevê uma maior volatilidade proveniente de fontes identificáveis, a exemplo das mudanças climáticas, que alterarão os fluxos de caixa gerados por determinados tipos de ativos, desencadeando, ocasionalmente, alterações perceptíveis nas avaliações da OSFI e no ambiente econômico canadense. “O clima e a digitalização de serviços representam alguns dos riscos conhecidos e ao mesmo tempo desconhecidos do nosso ambiente operacional. Outras fontes macro de volatilidade surgirão em lugares que ainda não sabemos”, esclarece o executivo.

Diante desse cenário, a Superintendência está construindo um novo sistema de classificação baseado no tamanho, complexidade e potencial de contágio de riscos sistêmicos dos entes fiscalizados, segmentação que, revigorada, buscará refletir o risco de viabilidade individual dentro de uma escala de oito pontos. Para as instituições maiores, serão incorporadas classificações para os riscos de negócio, resiliência operacional, financeira e governança de riscos. A nova modelagem não deve alterar os níveis de intervenção da OSFI, embora haja maior probabilidade de as instituições verem o seu “rating” mudar com mais frequência daqui para frente, dado que a metodologia é mais responsiva a riscos e boas práticas.

Internamente, estão sendo estabelecidos objetivos mais específicos e tangíveis, bem como cultivada uma cultura organizacional de “curiosidade” – curiosity culture – que amplie a aceitação de diferentes mentalidades num ambiente em que seja seguro agir e ocasionalmente “falhar” em contextos cada vez mais incertos. A cultura da curiosidade permitirá à autoridade transformar etapas do processo de supervisão, além de abandonar ferramentas, técnicas e práticas na medida em que se tornarem obsoletas.

No radar da OSFI estão ainda o fortalecimento e expansão, respectivamente, da capacidade de gestão e apetite de risco, o que viabilizará decisões mais céleres, menor burocracia e maior influência sobre a definição de políticas para o setor. “O fato de sermos um órgão independente ajuda, mas precisamos ser mais enfáticos ao compartilhar perspectivas e exercer autoridade ao mesmo tempo em que demonstramos maior abertura para lidar com desafios e participar de debates”, reconhece Rutledge.

Stewardship

Em sua opinião, mudanças na cultura da OSFI são necessárias para reforçar o princípio de Stewardship. “Nossa abordagem atual aplica a gestão de risco em nível individual, por fundo de pensão, enquanto o ambiente macro de risco é considerado apenas na medida em que afeta uma entidade regulamentada.”

O resultado, ressalta Rutledge, é uma profunda sensação de responsabilidade sobre a percepção da magnitude do impacto na confiança pública quando uma entidade falha, ainda que o sucesso ou fracasso de um fundo de pensão dependa, sobretudo, de seus órgãos colegiados. “Precisamos recalibrar a forma como gerenciamos riscos para balancearmos o tratamento individual das instituições e do ambiente macro.”

Isso significa, em última instância, que alguns riscos serão monitorados mais de perto enquanto outros terão uma abordagem menos rigorosa. A agência entende que assim aumentará o seu apetite e tolerância, embora a estratégia também possa resultar em decisões “imperfeitas” baseadas em informações incompletas, complementa o gestor.

Tratamento de informações

A plataforma de dados, por sua vez, precisa facilitar a pesquisa analítica e a geração de insights ao órgão de supervisão, dispensando a requisição de informações adicionais aos entes fiscalizados, continua o Superintendente. Para tal, diz ele, é necessário que os dados se tornem mais utilizáveis, atuais, confiáveis e granulares, o que exigirá avanços na educação digital e na configuração do quadro de colaboradores.

“Aprimoraremos a governança analítica, o que se dará também por meio da criação de um centro de expertise e treinamento para as nossas equipes”, destaca Rutledge. A autoridade está desenvolvendo o Instituto de Supervisão, onde os fiscais poderão aperfeiçoar competências, incorporando novas ferramentas, tecnologias e práticas.

A OSFI também entende ser primordial expandir a sua própria gestão de riscos (Enterprise Risk Management – ERM), que deve estar integrada a todos os processos internos a fim de garantir que funcionários, processos e estrutura tecnológica sejam fortalecidos, tornando-se mais resilientes aos riscos que possam surgir.

Julgamento e confiança

O desenvolvimento do “Projeto de Transformação” da autoridade canadense incluiu o estudo das práticas utilizadas por reguladores de outros países. Melhorias contínuas e revisões do modelo devem ocorrer ao menos uma vez a cada cinco anos. Mas a despeito das mudanças em curso, Peter Rutledge salienta que o papel do supervisor segue resguardado. “A nossa abordagem continua sendo baseada em princípios e voltada para o futuro. O julgamento da equipe de fiscalização se mantém como fator-chave.”

Nesse ambiente, ele argumenta que a transparência, quando gerenciada de maneira construtiva, tende a sedimentar a confiança entre a agência e os entes supervisionados. “A confiança não é produto de um relacionamento fácil ou difícil, mas de as pessoas acreditarem no que dizemos. Em outras palavras, confiança se conquista evitando surpresas.”

webinars foram realizados para as instituições regulamentadas com foco especial na alta administração, conselheiros e funcionários das áreas de compliance. No primeiro semestre de 2024, outros seminários sobre a nova SBR serão conduzidos junto a todos os stakeholders.

(Continua…)

 

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