O impacto da taxa de juros em patamar elevado sobre a saúde financeira do caixa das companhias era esperado para esse ano, sendo bem ilustrado pelo anúncio de reestruturação de dívida da Light. O ajuste desse evento na marcação a mercado de fundos foi mais lento, o que gerou uma onda de resgates até maior do que a descoberta de fraude na Lojas Americanas. Os gestores de crédito privado, que enfrentaram um período de disparada nos spreads no início do ano, agora observam uma volta à normalidade, com a oportunidade de voltar a tomar risco em títulos de empresas que fizeram a lição de casa. Mas esse movimento será feito sob o mantra da seletividade, que se revela ainda importante para incrementar o retorno sem elevar o risco, tanto em fundos da categoria high grade quanto da high yield.
A discussão permeou o painel “O que esperar do mercado de crédito para 2023”, que abriu o segundo dia da programação da 12ª edição do Seminário Gestão de Investimentos nas EFPC. O evento acontece nos dias 27 e 28 de junho, das 9h às 18h, presencialmente no Centro de Convenções Frei Caneca, em São Paulo. O painel foi moderado por Luciana Bassan, Membro da Comissão Técnica Sudoeste de Investimentos da Abrapp, e teve como palestrantes Ana Luísa Rodela, Head de Análise de crédito do Bradesco Asset, e Ulisses Nehmi, Sócio e CEO da Sparta.
Ana Luísa Rodela iniciou a palestra contando que a equipe de crédito privado da Bradesco Asset já esperava uma piora de cenário para o mercado de crédito em 2023, dado os níveis de inadimplência e a taxa de juros elevada, que já vinha pressionando o endividamento das companhias. Além disso, a inflação persistente tornou difícil o repasse de preços para o consumidor, o que também impactou o indicador de margem das companhias.
“Havia fundamentos para um impacto negativo no mercado de crédito neste ano. A reprecificação não foi apenas técnica, houve uma piora. Por isso, saímos de ativos alavancados, aos poucos, desde o ano passado”, afirmou. No começo de 2023, com o evento de Americanas e Light, o ajuste negativo esperado ocorreu de forma mais rápida. Com o aumento de resgates, ela disse que a asset aproveitou para comprar bons ativos, de quem estava fazendo a venda por necessidade no secundário. Depois de passar por um período de pico, os spreads começaram a fechar e Ana Luísa vê um bom ponto de entrada em títulos de companhias de boa qualidade. “O momento está tranquilo porque você não pega a faca caindo. Mas a seletividade será o ponto principal”, avalia.
No processo de seleção, destacou a importância de ler os ciclos econômicos, já que a carteira tem de conversar com o fundamento do momento. “A carteira de high grade não suporta default. A de high yield tem gordura de spread. Nossa principal preocupação é evitar eventos de perdas. Nesse momento de oportunidade, estamos tentando achar os nomes das empresas que vão sobreviver, que podem estar um nível abaixo, mas que fizeram a lição de casa e vão atravessar bem esse período”, contou.
Para o segmento offshore, Ana Luísa diz que tem sido comum ver o emissor pagando mais lá fora do que no Brasil e a classe está sendo favorecida pelo CDS no Brasil. “Os títulos brasileiros trouxeram bons retornos e estamos quase no nível pré-covid”, destacou. Para os próximos meses, ela diz que os investidores devem avaliar se os riscos dos fundos de crédito privado estão alinhados com o retorno. “Os gestores não são pagos apenas para correr atrás do maior spread, mas sim para proporcionar melhor risco e retorno à carteira. Isso é especialmente importante no crédito, o qual não conseguimos observar o risco pela métrica de volatilidade. O momento está ótimo para investir, mas a seleção continua sendo importante”, pontuou.
Indexadores e oportunidades no mercado secundário
Ulisses Nehmi, Sócio e CEO da Sparta, fez uma apresentação dos cenários para as duas divisões de crédito privado: high grade e high yield, que têm comportamentos diferentes em termos de volatilidade, retorno e risco e liquidez, dado o perfil de empresas emissoras que compõem cada uma delas.
Segundo ele, no high grade o que gera maior impacto negativo é a exposição que o emissor tem no mercado, se há número grande de investidores e incerteza em relação ao preço. Para ilustrar isso, ele comparou o caso da Lojas Americanas com o da Light. O da Americanas gerou uma marcação a mercado muito rápida nos fundos, para 50% ao par no dia seguinte ao fato relevante e 10% ao par dez dias depois. Após o anúncio da Light, a redução na marcação a mercado foi mais lenta, levando 90 dias para chegar a 10% ao par. “Após a Americanas o mercado teve menos resgates do que era esperado, pois foi um evento rápido e sem incerteza em relação ao preço. Já com a Light houve uma deterioração aos poucos, o que gerou uma onda de resgates nos fundos e impacto de marcação a mercado”, comparou.
Nesse período, Nehmi disse que aproveitou oportunidades para comprar outros ativos, que estavam sendo vendidos por necessidade. Agora, com o fechamento de spreads, observa um retorno positivo com risco de crédito mais baixo. “A volatilidade não é ruim para o investidor de longo prazo que está pronto para oportunidades. Houve um avanço significativo no mercado secundário, com liquidez em momentos de crise. Um exemplo são as debêntures incentivadas para pessoa física, que compramos por causa dos bons retornos com nível de risco baixo, e que foram vendidos por um comportamento errático do investidor”, avaliou.
Além disso, outra estratégia da Sparta foi a diversificação dos indexadores adotados desde 2020, com a inclusão do IMA-B 5, considerado bom e bem construído em termos de relação risco e retorno, principalmente em um cenário de mercado que não está mais restrito ao buy and hold. “É importante diferenciar as oportunidades e riscos que se quer evitar. Estamos alongando os prazos, com os spreads elevados. Há uma possibilidade de fechamento razoável nos próximos meses. O crédito privado é uma classe de bom retorno, estamos em bom momento para entrar, alongar e tomar mais risco”, concluiu.
O Seminário Gestão de Investimentos nas EFPC é uma realização da Abrapp com apoio institucional da UniAbrapp, Sindapp, ICSS e Conecta. Patrocínio Black: XP e S&P Dow Jones Indices; Patrocínio Ouro: AZ Quest, BNP Paribas, Bradesco Asset Management, BTG Pactual Asset Management, Carbyne Investimentos, DWS Xtrackers, Global X Etfs, Inter, Investo, Itajubá Investimentos, Kadima Asset Management, Perfin, Rio Bravo, Santander Asset Management, Schroders, Sparta, TAG Investimentos, Trígono Capital, Vinci Partners; Patrocínio Prata: BB Asset, Galapagos Capital, HMC Capital; Patrocínio Bronze: Aditus, ARX, Franklin Templeton, Indie Capital, MAG Investimentos, RJI Investimentos, SulAmérica; Apoio: Bahia Asset Management, BlackRock, Fator, Hashdex, Leblon Equities, Método Investimentos,Patria Investimentos, StepStone.