Artigo: Os recursos são dos participantes – por Rone Almeida, da i9Advisory

Rone Almeida

Nos últimos anos, foi extremamente fácil notar a pulverização de novos influencers digitais voltados ao mercado financeiro, surfando a onda da popularização das plataformas de investimentos, do surgimento de novos gestores de recursos, e, por que não, das taxas de juros mais baixas no Brasil e no mundo, que forçaram a migração de recursos para produtos mais agressivos, como é o caso da bolsa.

O nível de entendimento sobre o mercado financeiro destes novos investidores, que procuram investimentos via plataformas, é baixíssimo, logo, a forma de se comunicar para atingir este novo público deve ser diferente, e de fato, quem acompanha este meio consegue perceber na prática.

O uso da linguagem fácil, sem perder a qualidade, se tornou predominante, com algumas das principais empresas/consultorias especializadas neste público sendo vendidas a preços altíssimos, dado seu enorme poder de influência e extensa base de clientes pessoas físicas.

Todavia, quando voltamos o olhar para toda a cadeia dos Fundos de Pensão, foi observado pouquíssima evolução na forma de se comunicar com o participante. E aqui, começo minha crítica e autocrítica, é claro, ao sistema, o dinheiro é do participante. A comunicação, deve ser para o participante.

Diferentemente do primeiro público descrito acima, que foi atrás da informação, boa parte dos participantes dos Fundos de Pensão ainda não estão dentro desta nova estrutura de plataformas, gestores etc., ou seja, a comunicação deve ser ainda mais fácil, mais proativa. Obviamente, para o comunicador não é uma missão fácil, mas, não há como fugir.

Para ilustrar, lembro que a alguns meses atrás, em um call com gestores, ouvimos alguns participantes da reunião comentar que o gestor estava falando palavras difíceis de propósito para não entenderem absolutamente nada, com o intuito de não fazerem perguntas sobre a performance aquém do esperado.

Veja só, outro exemplo que presenciamos, recebemos e-mails de participantes questionando o que era o IMA-B, e por qual motivo não utilizávamos o CDI como referência. O índice de uma das principais classes de ativos que fazem parte das carteiras dos Fundos de Pensão não é amplamente conhecido. A culpa? Da educação financeira do Brasil, é claro. Esta é a resposta mais fácil. Por outro lado, a resposta difícil é que temos a obrigação de fazer nossa parte, aqui, incluo gestores e consultores, principalmente.

Quem convive no dia a dia sabe, a linguagem utilizada pelos gestores e consultores é rebuscada, repleta de terminologias extremamente técnicas, economês, e, cada vez mais comum, os jargões em inglês, para os dias atuais, os mais populares são behind the curve, hawkish e dovish, muito utilizados para indicar a atuação dos bancos centrais.

Quem mais sofre com isto? Os dirigentes de Fundos de Pensão, estes carregam praticamente sozinhos a responsabilidade “traduzir” o dito e feito pelos rebuscados gestores e consultores para os leigos participantes e membros dos diversos comitês internos.

Observando esta estrutura, ou para o framework ironicamente falando, quantos desencontros de informação não devem ter acontecido neste processo de tradução, e mais, quantos ocasionaram tomadas de decisões equivocadas? Aqui, não culpando o tradutor, na nossa visão, é a parte desta estrutura que tem a menor culpa nisto tudo.

E, respondendo ao questionamento acima, não são raros estes casos de desencontros, seja o participante, na hora de escolher o seu perfil, seja o comitê, na hora de aprovar uma nova macroalocação. Logo, o problema é extremamente relevante.

Voltando ao título deste artigo, os recursos são dos participantes, e desta forma, a comunicação deve ser focada neles, atingindo o maior número possível.

Pronto, descrevi um problema que já é amplamente observado. Mas, como resolver isto? Na nossa visão, o começo desta mudança deveria partir dos gestores, que possuem altíssima qualificação e recursos, e, a esteira de comunicação se inicia com eles.

Por um lado, se o mercado financeiro global continuar evoluindo como evoluiu na última década, cada vez mais pessoas com baixo entendimento sobre o mercado financeiro entrarão no mundo dos investimentos. Por outro lado, reduz a necessidade da tradução de entendimento, e, consequentemente, reduz os desencontros de informação, é um ganha-ganha para os gestores.

Na sequência lógica, os consultores também necessitam utilizar cada vez mais a linguagem simples e precisa, como já dizia a Instrução Normativa Previc n° 35. Bajulando o nosso lado, os consultores já estão um pouquinho mais avançados que os gestores, mas, bem pouquinho mesmo, precisamos melhorar.

E, mais importante, os dirigentes de Fundos de Pensão, que fazem a ponte com participantes e comitês, recebendo esta linguagem simples e precisa de gestores e consultores, conseguirão implementar uma comunicação muito mais eficiente, proativa e educativa.

Segundo a Abrapp, no Consolidado Estatístico mais recente, os Fundos de Pensão respondem para 7,34 milhões de pessoas, entre participantes ativos, dependentes e assistidos, equivalente a quase 10% da população economicamente ativa no Brasil, e, com volume financeiro equivalente a 12,9% do nosso Produto Interno Bruto.

Posto isto, os benefícios da comunicação clara e objetiva são enormes, tanto para gestores, consultores e dirigentes dos Fundos de Pensão, quanto para o Social. Na era do ESG, esta deve ser uma das prioridades, a educação financeira só tende a melhorar o país.

Em um mundo no qual já temos metaverso, NFT, criptoativos, PIX, está faltando a comunicação. Se não fizermos, alguém irá fazer, e, irá lucrar muito, ou pior, ninguém fará nada, e, todo este contingente, de mais de 7 milhões de pessoas que podemos atingir diretamente, ficará à mercê, largados à sorte no mundo também das Fake News.

*Economista, Sócio e Estrategista-Chefe da i9Advisory Consultoria Financeira.

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