Artigo: Regulamentos dos planos de benefícios – Atualização dos benefícios – Aspectos interessantes – *Por Jarbas Antonio de Biagi

Jarbas de Biagi

Costumo dizer que o contrato previdenciário é o contrato de mais longa duração que o cidadão, de forma facultativa, firma ao longo de sua existência. Nesse sentido, normas regulamentadoras são imperiosas para a manutenção de equilíbrio e solvência dos planos de benefícios. Na Lei Complementar 109/01 temos esses pontos abordados principalmente no artigo 3º. incisos e III e VI.

Quanto ao poder regulamentar do CNPC – Conselho Nacional de Previdência Complementar, sem dúvida nenhuma a LC 109/01 outorga esse poder, como também a Lei 12.154/2009, criadora desse importante órgão  estabelece de forma precisa que o CNPC “exercerá a função de órgão regulador do regime de previdência complementar operado pelas entidades fechadas de previdência complementar”.                                                                  

Na 30ª. reunião do CNPC, realizada no último dia 30 de março, entre outros pontos de igual relevância, uma das deliberações tratou especificamente das normas pertinentes aos regulamentos dos planos de benefícios. Essa reunião aprovou as recentes Resoluções 39 e 40/2021.

Nesse particular, muito destacada pela imprensa e também por todos os atores do segmento(EFPC, Patrocinadoras, Participantes, Assistidos, Associações, etc….), um dos itens da Resolução 40/2021, que trata da atualização dos benefícios.

Sem a pretensão de esgotar o tema, que sem dúvida, como tudo no Brasil tem polêmicas técnicas e apaixonadas, procurarei abordar alguns pontos relevantes que permearam os questionamentos ao longo do período pré e pós reunião.

Atualização de benefícios – Adotou-se como prática no Brasil a inserção nos regulamentos dos planos de benefícios não do critério de atualização, mas sim, a inserção de qual índice de correção será utilizado na atualização dos benefícios.

De forma exemplificativa, e, numa pesquisa rápida somente de regulamentos que conheço, posso afirmar que temos os seguintes índices expressos em regulamento: variação da cota, do IPCA, do INPC, IGPM, IPG-DI, índice da categoria, etc…

Isso levou a uma interpretação, defendida por respeitáveis colegas, que esse indexador assegura direito adquirido à sua aplicação, ou seja, seria imutável e deve ficar como cláusula pétrea no regulamento.

Os pareceres de que dispomos, em que pese o respeito a esses posicionamentos, demonstram que o fato do índice estar expresso em regulamento não lhe traz o “status” de cláusula pétrea, notadamente na análise da inteligência das normas que buscam assegurar segurança, solvência e liquidez para os planos de benefícios.

Decorridos cerca de 20 anos da edição da LC 109/01, naturalmente surgem questionamentos interpretativos das normas legais e regulamentadoras do regime fechado de previdência complementar.

A questão de atualização de benefícios não foi a primeira e não será a última, e, em casos relevantes como esse, necessária a reanálise pelo órgão supervisor (Previc) e regulador/normatizador (CNPC) para, dentro dos limites de suas atuações, editarem normas que traçam as linhas mestras do segmento.

Pontos relevantes da deliberação do CNPC

Nesse artigo vou centrar nas perguntas que me foram encaminhadas.

 

1ª questão – Como era?

A Resolução CGPC 08/2004 que será revogada com a publicação da nova resolução trata o tema da seguinte forma:

Art. 4º. – O regulamento de plano de benefícios deverá dispor sobre:

V-base e formas de cálculo, de pagamento e de atualização de benefícios.

 

2ª questão – O que foi aprovado?

A Resolução aprovada, nesse particular, traz a seguinte redação:

Art. 4º. – O regulamento do plano de benefícios deverá dispor sobre:

V – base e formas de cálculo e de pagamento, bem como o critério de atualização dos benefícios.

E mais adiante:

  • 2º  O critério de atualização dos benefícios, de que trata o inciso V do caput deste artigo, poderá ser modificado, inclusive para benefícios concedidos, mediante:

I – elaboração de estudo técnico que demonstre a necessidade de mudança do critério de atualização, bem como a adequação econômica, financeira e atuarial do índice proposto;

II- ampla divulgação aos participantes e assistidos, com antecedência mínima de cento e oitenta dias do envio da proposta ao órgão estatutário competente da EFPC;

III – aprovação do órgão estatutário competente da EFPC; e

IV- autorização do órgão da Superintendência Nacional de Previdência Complementar.

  • 3º  Na hipótese do critério de atualização dos benefícios com características de benefício definido adotar índice de preço, este deverá:

I – refletir adequadamente a variação de preços de produtos e serviços consumidos pela população;

II – ser de abrangência nacional e ampla divulgação; e

III – ser compatível com o objetivo de manter o equilíbrio econômico-financeiro entre ativos e passivos do plano de benefícios.

E mais um ponto importante: todos os estudos ficarão disponíveis para participantes e assistidos examinarem.

Registre-se que no Conselho Deliberativo temos representantes de participantes e assistidos (no mínimo um terço), motivo pelo qual, os estudos serão devidamente analisados por esses representantes. Essa representação exclui totalmente o risco, que no nosso sentir é infundado, de deliberações unilaterais.

3ª questão – O Regulamento contempla o índice de preços para reajuste (por exemplo INPC, IPCA, IGPM, IGP-DI, acordos coletivos da categoria, etc). Será necessária a alteração?

A resposta também é clara. Sim. Será necessária a alteração. Sem dúvida esse regulamento é o contrato previdenciário e faz lei entre as partes. Nesse sentido, é nosso pensar que a norma é mandatória, ou seja, a atualização dos regulamentos que contemplam índices, salvo situações excepcionais, deverá ser feita pelas entidades.  Portanto, os órgãos de governança das entidades,  deverão providenciar a alteração regulamentar seguindo todos os trâmites legais.

A partir dessa alteração, observadas as regras supramencionadas, a gestão dessa questão ficará a cargo dos órgãos de governança da entidade.

 

4ª questão – Algo mudou para os órgãos de governança da Entidades?

Sim. Na minha opinião os órgãos de governança das entidades devem ficar atentos aos ativos dos planos de benefícios e os índices adotados para atualização monetária dos benefícios.

Aliás, esse é um dos pontos de atenção na gestão baseada em riscos que dentre os riscos atuariais contempla o descasamento dos ativos(investimentos) com o passivo(compromissos do plano).

Observo que eventuais resultados deficitários, como regra, acabam refletindo tanto sobre participantes ativos como para os assistidos, portanto, um reajuste em desacordo com a realidade do plano pode trazer prejuízo para um percentual da massa de participantes.

Claro que a governança da entidade deverá ter todos os estudos que irão embasar as decisões. 

Conclusão – Com respeito a entendimentos contrários, o Conselho Nacional de Previdência Complementar ao normatizar de forma clara e transparente atendeu os ditames da Lei Complementar 109/01, em especial aos incisos III e Vi do artigo 3º, sendo que o fato de constar determinado índice como parâmetro para atualização dos benefícios não assegura direito adquirido aos participantes e assistidos.

Os participantes e assistidos têm direito a atualização do benefício, porém, a menção a determinado índice de apuração não caracteriza cláusula pétrea do regulamento.

Afora as razões jurídicas desse posicionamento, registro que os índices, por serem econômicos, podem sofrer ao longo do tempo variações nos componentes de sua apuração, e até serem extintos, motivo pelo qual, a norma trouxe um poder dever para os órgãos de governança da entidade que deverão estar atentos também na evolução desse particular.

Finalmente, temos que a norma é um avanço considerável, seja por permitir a adequação do índice de atualização à realidade do plano de benefícios, seja por reafirmar a importância dos órgãos de governança da entidade, notadamente do Conselho Deliberativo que na sua composição, conforme afirmado e por força das disposições da Lei Complementar 109/01 tem em sua composição no mínimo 1/3 de representantes de participantes e assistidos.

*Advogado, Mestre em Direito pela PUC/SP,  Sócio do Escritório Santos&Bevilaqua Advogados Associados.

 

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