Com um novo cenário de taxas de juros em patamares baixos, além da necessidade de reinvenção imposta pela pandemia, as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) têm o desafio de buscar diversificação e lidar com uma tolerância a risco ainda restritiva. As oportunidades nesse processo foram debatidas no webinar ‘Novas Tendências e Desafios de Investimentos Frente ao Cenário Político e Econômico Atual’, realizado nesta sexta-feira, dia 14 de maio, pela Schroders e a PPS Portfolio Performance, com apoio da Abrapp.
O Diretor Presidente da Abrapp, Luís Ricardo Martins, reforçou que o papel da Abrapp é debater esses temas, sendo uma indutora do sistema. “Em um momento de queda de taxas de juros, além do temor fiscal que cresce, a longevidade e a pandemia são desafios do setor”, disse, ressaltando a atuação dos profissionais de investimento diante desse cenário.
Ele destacou a recuperação das EFPC em 2020, que iniciaram o ano com possibilidade de déficit e no resultado consolidado voltaram aos patamares pré-crise. “É fundamental que a gente aproveite as janelas de oportunidade. Reitero a reforma da previdência e a própria pandemia, que é muito grave, mas que faz com que as pessoas queiram se proteger, proteger seus familiares, e estão poupando”, destacando que é preciso transformar essa poupança do medo em poupança da esperança.
Luís Ricardo pontuou ainda que o sistema saiu de uma perspectiva de estagnação para uma expectativa de crescimento a partir da criação de planos família, instituídos e planos para entes federativos, sendo que este último acabou trazendo um novo marco a partir de um Projeto de Lei que visa harmonização entre entidades abertas e fechadas e contempla, entre outros temas, a inscrição automática, tema fundamental para o fomento.
Reinvenção – Para Keite Bianconi, Diretora Executiva Suplente da Abrapp e moderadora do evento, o cenário de pandemia trouxe ao sistema uma necessidade de reinvenção, com a digitalização, aperfeiçoamento de processos de controle de risco, além da maneira em que as EFPC se relacionam com seus participantes. “Mas um dos principais desafios é rentabilizar os investimentos”, citou, destacando que as entidades precisam diversificar levando em conta os riscos.
Nesse sentido, gestores de investimentos buscam atender a essa nova perspectiva dos investidores institucionais olhando mais para novas tendências de investimento, o que requer habilidades e tecnologia na gestão de recursos, além de controle de riscos, conforme pontuou Vinicius Lima, Head of Institutional Sales da Schroders Brasil.
As oportunidades de investimento passam pela renda variável, mas se aprofundam ainda em integração ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês) nos portfólios, sendo que oportunidades estão vistas também fora do país, levando a uma maior necessidade das EFPC pensarem em diversificação no exterior.
ESG – O Head de Gestão de Renda Variável Brasil e LATAM da Schroders, Pablo Riveroll, abordou a integração ESG nos investimentos de renda variável no Brasil, destacando que investimentos sustentáveis estão relacionados com a sustentabilidade dos retornos que uma empresa gera. “A Schroders acredita que somente empresas geridas para o longo prazo e que levam em consideração seu impacto sobre todos os stakeholders conseguirão obter resultados sustentáveis acima da média”.
Para esse tipo de análise, a gestora utiliza algumas ferramentas que colocam as empresas em um ranking, além de utilizar um sistema de abordagem estruturada para a análise dos stakeholders. Além disso, a Schroders utiliza uma ferramenta que tenta calcular o custo total em termos monetários que um portfólio gera para a sociedade, traduzindo os impactos sociais em termos financeiros. “Acreditamos que as empresas devem ser responsáveis pelos custos que elas geram para a sociedade de maneira mais ampla, mesmo que isso não esteja em seus resultados de longo prazo”, pontuou Riveroll.
Data insights – A Schroders também faz uma análise de dados para testar teses internamente, comparando dados tradicionais com alternativos. “A bolsa brasileira tem incentivado a participação de empresas de tecnologia, que possuem grande valor para nós, pois estão gerando inovação em modelos de negócios ou produtos, aplicando tecnologias para mercados existentes e acelerando os crescimento desses mercados. A tecnologia tem um crescimento muito forte independente do crescimento da economia”, destacou Riveroll, pontuando o porquê a Schroders busca compreender essa nova economia melhor buscando aproveitar as oportunidades de alfa geradas por esse segmento.
Renda variável – Com a contração da economia registrada no último ano, que segue em crescimento baixo, é importante que investidores busquem, ao investir em empresas, pontos positivos que indicam uma mudança de cenário no futuro. Pablo Riveroll avalia que o Brasil já teve grandes ajustes e que os mercados emergentes estão performando muito bem, mas o gap de valorização do Brasil versus os mercados emergentes é um dos maiores da história.
Segundo ele, os setores com maior potencial de valorização são os de crescimento estrutural, como saúde, comércio eletrônico, energia renovável e TI; beneficiários do crescimento global, como minério de ferro e aço; e setores com valor cíclico, como bancos, shoppings, serviços públicos, varejistas de consumo discricionário e educação. “Mesmo com as dificuldades macros, há oportunidade de gerar alfa com gestão ativa”.
Histórico e Perspectivas – Trazendo o histórico das EFPC a partir das Leis Complementares 108 e 109, que completam 20 anos em 2021, o Sócio e Consultor Sênior de Investimentos da PPS Portfolio Performance, Rafael Sampaio, analisou onde as entidades estão agora em relação a investimentos. “A taxa de juros, ao longo desses 20 anos, nos trouxe um resultado anualizado de cerca de 20%”, disse, reiterando que em medida em que os juros fossem ajustados, as políticas mais conservadoras atreladas a taxas de juros deixaram de ter protagonismo, e as entidades passaram a traçar outras estratégias dentro de suas políticas de investimento.
Rafael destacou que as taxas de juros não voltarão aos patamares anteriores, e conviver com taxas mais baixas é uma prática que deve ser assumida dentro dos investimentos das EFPC. Ele analisou ainda que a inflação anualizada em 20 anos foi de 10,5%, sendo que o juro real trouxe uma rentabilidade de 9% ao ano. “Agora, estamos em um momento de alta da inflação motivada por uma sucessão de eventos muitos advindos do momento de crise endêmica e que devem ser controlados por uma atuação mais presente do Banco Central, mas isso traz uma oportunidade”.
A análise de Rafael pontuou também que a atividade econômica trouxe um reflexo para a renda variável: em 20 anos, a bolsa performou 19%, abaixo da renda fixa. “A evolução que a economia teve e o momento que passamos é diferente de 20 anos atrás”, disse, reiterando que a qualidade das empresas que compõem hoje o índice Ibovespa melhorou significativamente.
A gestão ativa revela as oportunidades, segundo Rafael, pois ela identifica em uma série de resultados aqueles que são os mais prósperos. “E nesse contexto, as análises qualitativas nunca foram tão importantes”, disse o consultor. Ele explicou ainda a diferença entre gestão referenciada e gestão descorrelacionada, sendo que esta última que tem trazido bons resultados, além de citar os fatores ESG, que é uma prática de investimento bem avançada na Europa e Estados Unidos. “Essa experiência trazida globalmente é fundamental, e o acesso ampliado e a necessidade de diversificação atingem estratégias já organizadas ao redor do mundo”, pontuou.
Tolerância a risco x diversificação – Rafael evitou que o sistema ainda possui muitos planos de benefícios com uma única estratégia, mas que a criação de perfis de investimento e de ciclos de vida já estão em crescimento e surgem com o objetivo de atender muitas das necessidades que os participantes têm relacionadas a objetivos de retorno e tolerância a riscos.
Rafael destacou a importância do investimento do exterior, reforçando que isso traz a oportunidade de integração ESG, e citando que estratégias de proteção ao câmbio acabam atendendo às necessidades de proteção dos portfólios. “Não é por esse fator que esse investimento deve ser evitado”, disse.
Vinicius Lima destacou que a alocação no exterior começou tímida em 2013 e 2014, mas ganhou força no último ano, e as fundações estão começando a aumentar as alocações em fundos exclusivos, fundos com hedge cambial, podendo acessar novas classes de investimento que no Brasil não se consegue acessar. “Isso fez com que a oferta de produtos continuasse se ampliando”, disse.
Visando impulsionar ainda mais esse mercado, o aumento do percentual de alocação no exterior está na pauta das discussões da Abrapp com o governo. Luís Ricardo destacou, contudo, que por se tratar de uma alteração na Resolução 4.661 do Conselho Monetário Nacional, há um compasso de espera maior devido a outras prioridades desse momento dentro do Ministério da Economia. “Esse é um pleito do segmento e a expectativa é que a gente possa, o quanto antes, dobrar esse limite para investimentos no exterior”.