A cultura comercial, voltada à captação de novos participantes, é o ponto-chave para que as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) aproveitem as oportunidades que novos horizontes do mercado trazem, e foi tema debatido no último dia do 1º Encontro Nacional de Gestão de Pessoas, realizado nesta quinta-feira, 1º de julho. O segundo dia de evento também foi marcado pelo lançamento da Pesquisa de Engajamento 2021 da Abrapp.
Parte de um dos projetos do Planejamento Estratégico da Abrapp, algumas Comissões Técnicas e Comitês da Associação, entre eles o Comitê de Gestão de Pessoas, estão trabalhando em conjunto para disseminar diversas ações em prol desse tema, e assim está sendo constituído o Programa de Cultura Comercial, que foi apresentado durante a Talk 7 “Cultura Comercial nas EFPC e o Papel da Gestão de Pessoas”.
“Estamos vivendo um momento muito generoso com a possibilidade da introdução da cultura comercial a partir dos planos família, instituídos e planos para entes públicos”, disse Zeonil Gomes Barcelos, Membro do Comitê de Gestão de Pessoas da Abrapp e moderador do painel. Ele ressaltou que pesquisa realizada com as entidades mostra que a maioria tem, está planejando ou pretende ter um plano família, e por isso o Programa de Cultura Comercial é pautado em cima de produtos, processos e pessoas, sendo que este último foi o ponto mais aprofundado no projeto.
O programa está em construção e será apresentado em breve, mas Zeonil pontuou que a essência do projeto é o processo de aculturamento e a importância da direção das empresas dar esse encaminhamento partindo para as questões práticas, como mapeamento de cargos para que, posteriormente, ocorra uma capacitação segmentada em três trilhas, com três níveis, além de ações de engajamento e técnicas para auxiliar na mudança cultural.
Zeonil citou fala de Cláudia Trindade, Diretoria Executiva da Abrapp responsável pelo Comitê de Gestão de Pessoas, em entrevista ao Blog Abrapp em Foco sobre o processo de cultura comercial dentro das EFPC: “Quando tínhamos apenas planos patrocinados, nós ‘pescávamos’ dentro do aquário. Com os planos família, a ‘pescaria’ começou a se ampliar para parentes dos participantes. Queremos crescer a cultura comercial para começar a pescar no oceano, que é o desconhecido”.
Para que esse processo ocorra, palavras como vendas, clientes, fidelização, metas, satisfação de clientes, campanha e competitividade, que não faziam parte do vocabulário das EFPC, agora farão, pontuou Zeonil.
Implantando a cultura comercial – Unindo a cultura comercial à gestão de pessoas, Rosangela de Carvalho, Sócia-proprietária da Efficacia Empresarial e Especialista da UniAbrapp, fez uma reflexão sobre como fomentar ações e implementações nas entidades. “Mudanças fazem parte do mundo contemporâneo”, disse.
Trazendo esse processo para a realidade das EFPC, Rosangela citou o exemplo de uma empresa que tinha sua entidade até então limitada a uma atuação para com a única patrocinadora. “Todas as pessoas que trabalhavam nessa entidade viveram uma cultura de atendimento direcionada ao patrocinador”, disse, reiterando que o corpo profissional das EFPC muitas vezes está há muitos anos atendendo essa única patrocinadora. ”
Agora, as entidades podem olhar para outros universos, e para entrar nesse oceano, é preciso levar a patrocinadora atual, mas também conquistar novas, disse Rosangela, ressaltando que existe um mar de oportunidades, em especial com a demanda por planos para entes federativos. “Como eu me torno competitivo? Em primeiro lugar, olhando para esse mercado e sabendo quais dessas patrocinadoras podem se conectar com o que tenho a oferecer”, disse, pontuando que o conhecimento sobre a própria entidade é o passo zero para o processo.
Depois disso, é preciso avaliar quem mais as entidades querem atender e o que deve ser mudado para que isso aconteça diante do aumento da concorrência, entendendo que há uma mudança de mindset da cultura de atendimento puro para uma cultura comercial.
Rosangela explicou que a cultura comercial abrange o processo de venda, atendimento, captação e retenção. “Tenho que ser competitivo”. Para isso, a EFPC precisa se preparar para ter mais relacionamento com meus participantes, saber se seus resultados são competitivos com o mercado e quais são seus diferenciais estratégicos. “É uma mudança de mindset que traz tudo que nós já temos e amplia para uma visão maior”.
Empatia – Rosangela trouxe a ainda a empatia e a comunicação não violenta como princípios que vão ajudar as EFPC a entrar em um processo de investigação sobre as necessidades dos clientes, sejam os entes ou patrocinadores, ou os participantes. “Tentem conhecer o que o mercado precisa”, disse.
Passar para uma cultura comercial carrega ainda o conceito de sinergia entre equipe e liderança, sendo que os dois devem andar juntos. “É esperado, nessa mudança de mindset, que a liderança apresente novos planos estratégicos de negócios que incluem a captação de novas oportunidades”, disse Rosangela, ressaltando que essa liderança deve passar isso para sua equipe, dando a ela empoderamento, capacitação, autonomia e responsabilização para executar esse plano.
Assim, a gestão de pessoas poderá atuar oportunizando captação e retenção de talentos, e promovendo treinamento e desenvolvimento a partir de políticas de reconhecimento e recompensa, que são essenciais para o processo de cultura comercial. “A cultura da organização está no que as pessoas fazem, acreditam, valorizam. Então, para mudança de uma cultura é preciso planejar, implementar e consolidar”, complementa Rosangela, pontuando que a alta direção deve atuar como protagonista nessa mudança comercial, mas lembrando que precisa também de bons “coadjuvantes”.
Case da BB Previdência – A prática da mudança de uma cultura tradicional de atendimento para a comercial foi apresentada por Ana Cristina de Vasconcelos, Superintendente Executiva na BB Previdência, que pontuou que há 5 ou 10 anos, falar sobre cultura comercial em previdência era impensável. “A Abrapp ficou muito à frente de pautas positivas para o crescimento das entidades”, disse, citando planos família, instituídos e incentivo à mudança no modelo de negócios como bandeiras levantadas pela Associação para o fomento do sistema.
Ana Cristina apresentou números da BB Previdência, que de 2016 a 2021 teve crescimento de 80% em seu patrimônio, saindo de R$ 5 bilhões e chegando a mais de R$ 9 bilhões este ano. No plano família, criado no início de 2019, há cerca de mil participantes. A entidade também criou quatro novos planos desde 2020. “Isso é fruto do trabalho da nossa área comercial e apoio dos nossos colaboradores”, disse.
A área comercial da BB Previdência foi criada em dezembro de 2019, e uma das motivações foi a Reforma da Previdência, que trouxe expectativa de aumento dos negócios e expansão dos planos. Mais de 60 entes públicos já foram prospectados pela entidade desde então. “Diante desse cenário, nada mais importante que criar uma área comercial”, disse Ana Cristina, contando ainda que o número de colaboradores dobrou nessa área dentro da BB Previdência.
Ela pontuou que o momento é de aproveitar a evolução da entidade, e que isso passa por desafios como alteração de regulamentos, oferta de planos com menos riscos, atuando como consultores de negócios e revistando todos os processos, além de mapear riscos. “A palavra previdência nunca foi tão falada na mídia, então é momento de aproveitarmos isso”, disse Ana Cristina.
A partir dessa nova visão, a BB Previdência coloca o cliente no centro, abrangendo-o dentro de todos os tipos de mídia e comunicação. Ela apontou ainda a abordagem da cultura comercial, que é disseminada entre os colaboradores através de conhecimento técnico de forma a fazer com que a comunicação seja cada vez mais assertiva, colocando a empatia na prática. “Nossos lema na BB Previdência é: ninguém solta a mão de ninguém”.
O papel da gestão de pessoas nesse caminho é ser um business partner, sendo mais do que gestor, atuando como mentores, ouvindo e extraindo dos profissionais o que eles têm de melhor. Ana Cristina disse ainda que nesse momento tão desafiador é preciso oferecer plano de cargos e salários definidos, promover reconhecimento e desenvolver talentos, além de dar apoio à saúde mental. “Apesar dos inúmeros concorrentes, entendemos que, humildemente, hoje, o nosso maior concorrente somos nós mesmos. Queremos ser melhor do que fomos ontem”, complementou.
Novo papel da liderança – A mudança de mindset das EFPC passa também pela transformação que as lideranças devem fazer, saindo do modelo analógico para o digital. O tema foi abordado na Talk 8 “O Código Mental Construtivo Para Lideranças Analógicas Sob Pressão”.
Altenide Moreira dos Santos, Membro do Comitê de Gestão de Pessoas da Abrapp, moderou o painel e pontuou que o segmento de previdência está sendo tocado por um movimento digital tão transformador, que as lideranças estão se deparando com a necessidade de se adequar e aprender.
Esse processo de transformação passa, inicialmente, por uma mudança no código mental. “Quando falamos em código mental, estamos nos referindo à forma de pensar que pode contribuir positivamente para a construção de uma liderança mais sustentável, mais próxima e que engaja as pessoas”, disse Cesar Ayer, Trainer da Crescimentum e palestrante da Talk.
Ele pontuou a relevância de se levar em consideração o cenário global, entendendo que as coisas estão acontecendo de forma muito rápida e simultânea. Cesar disse ainda que as organizações estão ainda cada vez menos hierarquizadas, com lideranças mais voltadas para a influência.
Ainda assim, a pressão por resultados continua existindo, bem como as demandas continuam crescentes, e é preciso aprender a trabalhar nesse cenário. “É preciso entender como os gestores podem engajar seus times dentro da jornada de desenvolvimento, estratégica e tática das organizações”, disse.
Ele pontuou que o processo de transformação digital tem pouco a ver com tecnologia, estando mais ligado à mudança de comportamento. “Temos muitos casos de transformação digital acontecendo, poucos deles com sucesso, mas esses não-sucessos têm uma causa: com esse movimento, as empresas estão em um maior nível de intimidade com os clientes”.
Cesar pontuou também o uso da metodologia Ágil nos processos de transformação das empresas, mas explicou que isso não tem relação com velocidade e sim com repensar processos, citando que é preciso avaliar o que dá para melhorar em um projeto sempre colocando o cliente no centro e pensando em como a estrutura pode trabalhar para melhor atendê-lo.
Colaboração – A liderança está evoluindo, sendo antes centralizada em uma pessoa, e agora está mais disseminada entre o time, disse Cesar, destacando que a evolução da liderança está no entendimento sobre como o sistema funciona. “Quanto mais tenho uma consciência compartilhada da organização, eu naturalmente passo a ter pessoas mais interessadas e alinhadas com esse propósito e que podem somar dentro do meu trabalho individual”, disse.
Isso significa também ter pessoas com maior nível de autonomia e independência, pontuou Cesar. Assim, o líder passa a ser um facilitador desses processos, criando boas condições, ajudando as pessoas a realizarem seus potenciais. “Isso faz com que as equipes se tornem muito mais autodirigidas”, disse.
O resultado disso são organizações muito mais empoderadas, com menos pressão interna, já que as pessoas saberão o propósito pelo qual estão trabalhando, se tornando mais produtivas e se sentindo pertencentes à organização. “Propósito é o elemento-chave dessa construção”, reforçou, complementando que o papel da liderança é ajudar as pessoas a entenderem pelo que elas trabalham.
Transformação digital – As novas competências do líder para um mundo imprevisível e digital foram abordadas na Talk 9 “Transformação Digital e Liderança”, moderada por Hozana Galvão Jannuzzi, Membro do Comitê de Gestão de Pessoas da Abrapp.
Andrea Iorio, Especialista em Transformação Digital e Liderança, colocou a metanoia, ou seja, mudar radicalmente a forma de pensar, como um ponto principal que um líder precisa ter hoje. “Vivemos em um mundo interconectado e com efeitos de redes. A previsibilidade dos negócios não existe mais”, disse, pontuando que tudo acontece em tempo real, e o uso de dados cresce cada vez mais. “Isso nos permite tomar decisões com mais assertividade e rapidez, mas para isso precisamos saber utilizar os dados”.
O especialista disse ainda que a exponencialidade é constante, e a inteligência artificial também é uma realidade. “Precisamos resgatar o que mais de humano temos para trabalhar de forma complementar à tecnologia, e não sermos substituídos ou engolidos por ela”, disse.
Apenas 16% das empresas têm sucesso no processo de transformação digital, diz pesquisa da McKinsey de 2019 apresentada por Andrea, e segundo ele, isso ocorre por muitas vezes acharmos que a transformação digital é somente tecnologia, tirando o componente humano.
Transformação cognitiva – Andrea citou que o primeiro pilar para realizar essa mudança é a transformação cognitiva. “Hoje, o cliente tem mais acesso a informações, e isso o empodera”, disse, pontuando também que a maior competitividade, menor custo de troca e o próprio cliente criando conteúdo faz com que seja preciso identificar dores e demandas para poder melhor atendê-los. “Os dados nos ajudam a tomar melhores decisões focadas no cliente, mas muitas vezes para obter os melhores dados e informações, precisamos fazer perguntas”, disse.
Ele destacou ainda que o líder precisa ter uma mente de principiante para saber fazer essas perguntas, se abrindo para construir negócios poderosos que saiam da sua própria especialização. “No mundo digital, a transformação cognitiva do líder passa por uma mente de principiante que é adaptável, flexível, e conecta áreas do saber para poder tomar decisões mais focadas no cliente”, disse.
Transformação comportamental – O grande diferencial da liderança diante disso é tirar ideias do papel. “A questão não é ter belíssimas ideias, é testar e executar para saber se estamos atendendo as dores dos clientes”, disse Andrea, explicando que se ideias não forem colocadas na prática, não geram feedbacks para pivotar e ajustar o rumo dos projetos.
Ele destacou ainda a importância de realizar macroações para ter feedbacks no meio do caminho que ajudem a ajustar o projeto. Nesse sentido, o digital traz vantagens como aumento da frequência dos pontos de contato com o cliente, o que permite maior coleta de dados e o desenho de erros inteligentes, além de fazer experimentos rápidos, avaliando o que funciona e tirando o que não funciona. “Precisamos criar uma cultura de execução constante”, disse.
Transformação emocional – Andrea destacou ainda a importância da empatia e do autoconhecimento na liderança, citando elementos de humanização, como a confiança, que faz com que as relações e os negócios se desenvolvam. “Você, como líder, deve priorizar as relações de confiança”, reforçou.
A reciprocidade também foi apontada por Andrea como um elemento importante dentro desse processo de transformação emocional. “É responsabilidade do líder criar o chamado círculo de segurança”, disse, explicando que esse é um ambiente intangível nas empresas, onde as pessoas têm a confiança de que outras estão ali, dentro do conceito de cooperação. “São essas as habilidades que os líderes devem desenvolver para aproveitar as mudanças que a transformação digital traz”, concluiu.
O 1º Encontro Nacional de Gestão de Pessoas foi uma realização da Abrapp com apoio institucional da UniAbrapp, ICSS, Sindapp e Conecta, e patrocínio da Apoena Soluções em Seguros e da Crescimentum.