Economia digital e segurança da informação, efeitos da atual conjuntura sobre a gestão de investimentos e os impactos da Lei da Liberdade Econômica para os investidores foram temas que deram continuidade aos debates do Encontro Sudeste + Leste nesta quarta-feira, 13 de abril. Com mais de 600 participantes, o evento deu prosseguimento à série de Encontros Regionais, que começou na semana passada com o Encontro Sul e Sudoeste, registrando a ampla participação de dirigentes e profissionais das regionais – leia também sobre a abertura e o Painel 1.
Ao apresentar o painel “Economia Digital e Segurança da Informação”, Carlos Alberto Pereira (foto acima à dir. no topo), Diretor Executivo responsável pela Regional Sudeste da Abrapp, ressaltou que a tecnologia da informação assumiu papel central na gestão dos processos das entidades, que estão promovendo a substituição de processos manuais por sistemas automatizados e digitais. O cenário de mudanças aceleradas trouxe desafios como questões de segurança, que exigem, por exemplo, sistemas de backup e plano de contingência.
“Estamos apenas no início de um processo de evolução e incorporação de tecnologia”, disse o Diretor da Abrapp. E destacou que mais que a elaboração de políticas, é necessário mudar a cultura organizacional das entidades e dos profissionais envolvidos na gestão dos processos tecnológicos das entidades. Ele saudou a ampla participação de centenas de dirigentes e profissionais das associadas do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais.
Aprendizados e riscos – Antonio Carlos Bastos d’Almeida (foto acima à esq. no topo), Coordenador Titular da Comissão Técnica Leste de Governança e Riscos da Abrapp explicou que nos últimos dois anos todos enfrentaram a crise sanitária provocada pela Covid-19. Mas a crise não trouxe apenas sofrimento e angústias. Ela trouxe também uma série de aprendizados, vários deles decorrentes, por exemplo, do desenvolvimento do trabalho remoto e seus desdobramentos.
Um dos grandes aprendizados é que as entidades de previdência perceberam que a gestão dos planos não era tão analógica quanto se imaginava se comparadas com as de outros setores da economia. “Percebemos que não somos tão dependentes de um espaço físico”, disse Antonio Carlos, mais conhecido como Toninho, e que também é Gerente de Assessoria de Risco da Forluz. Ele lembrou também que a própria Previc, em seu relatório de estabilidade, reconheceu que o sistema passou pela crise sem maiores problemas e sem interrupções de serviços.
O Gerente da Forluz observou que a mudança de cultura e de mindset realizada nos últimos dois anos proporcionou diversas inovações no segmento. A digitalização também teve um preço, ao elevar alguns riscos, como o operacional, relacionado a uma possível paralisação das operações da EFPC em razão do risco de interrupção dos canais de comunicação, dados, voz e imagem, além de crimes cibernéticos. “Não vamos nos iludir com os avanços, pois a gestão digital trouxe também um aumento do risco cibernético que subiu para um novo patamar”, comentou Toninho.
Para auxiliar as associadas a navegar por essas mudanças, há quase 1 ano a CT Leste de Governança e Riscos vem publicando no Blog Abrapp em Foco uma série de informativos periódicos sobre aspectos relacionados à prevenção de ataques cibernéticos. Os conteúdos foram elaborados com base em frameworks consagrados, seguindo padrões de boas práticas de TI utilizados no mundo, ressaltou. “Consultem esses informativos, tomem consciência e, de acordo com a complexidade e o porte de sua entidade, vocês poderão ver pontos de atenção e oportunidades de melhoria”, convidou Toninho.
É preciso incorporar as práticas – Em sua apresentação, Alessandra Monteiro Martins (foto acima ao centro), Data Protection Officer – DPO da Conecta, alertou que não adianta apenas elaborar uma política de segurança, mas sim que é preciso incorporar os princípios às práticas e processos diários da entidade. Ela destacou que é fundamental incorporar mudanças reais nos controles que já tratam de segurança, em todas as áreas da organização, Desta maneira, será possível escolher melhor os dados que precisam de tratamento para uma melhor proteção. “É importante traduzir a política para ações concretas”, disse.
A DPO da Conecta abordou o conceito de “Zero Trust” (em portugês Confiança Zero), e que indica que não se deve confiar nos serviços. O conceito considera que a vulnerabilidade dos sistemas está justamente na confiança. De acordo com a teoria, a tendência é adotar processos mais rígidos de segurança e proteção.
Ela lembrou que de 2020 para cá, houve uma explosão de ataques cibernéticos, com a ampliação das vulnerabilidades após a adoção do trabalho remoto e a falta de controles. Nesse cenário, Alessandra reforçou a importância de se conhecer a fundo o conceito de “cibersegurança”, que visa a proteção de sistemas de computador contra roubos ou danos de hardware e software, bem como prevenir a interrupção ou desorientação dos serviços..
Se no ambiente físico as empresas se preocupam em instalar câmeras e catracas eletrônicas para monitorar e restringir acessos, o mesmo cuidado com segurança deve estar no mundo virtual. “É importante entender esse ambiente cibernético, distribuir camadas de segurança e minimizar os impactos. Esse é o grande desafio quando falamos de digitalizar”, disse a DPO da Conecta, notando que as ferramentas não são baratas e há escassez de profissionais nesse campo.
Casos reais – Ricardo Oliveira, DPO da Abrapp, optou por apresentar casos de erros relacionados à segurança cibernética com o objetivo de aprender com exemplos negativos que acometeram outras organizações. “Não devemos incorrer nos mesmos erros que outros cometeram. Para isso, temos de olhar para quem errou e fazer diferente”, disse.
Dentre os casos relatados está o de um banco que contratou uma empresa para desenvolver uma nova aplicação que seria basilar para suas relações com clientes. A prestadora do serviço contratou um desenvolvedor terceiro que percebeu o valor daquele produto para o banco e criptografou todos os códigos e dados envolvidos, passando a extorquir a instituição financeira. Inclusive, o programa de criptografia foi baixado usando a rede do próprio banco, que havia trazido o terceiro para dentro de seu ambiente físico acreditando que estaria em maior segurança.
O DPO reforçou, ainda, a importância de treinar os colaboradores para uma cultura de cibersegurança, pois o simples clique de um funcionário desavisado em um link enviado por um criminoso pode abrir a porta para enormes vulnerabilidades. Dados pessoais de empregados expostos para outros colaboradores, por meio de grupos de WhatsApp, também podem gerar incidentes. “É importante pensar em segurança também no backoffice. A informação não pode ser acessada de forma indiscriminada e sem controles”.
Gestão de investimentos – Fatos da conjuntura atual a serem considerados nas estratégias de investimentos das EFPC foram temas do painel “Cenário Nacional e Internacional e os Efeitos da Gestão dos Investimentos. O Que Esperar do Curto e Médio Prazos?”. O painel foi moderado por Sérgio Wilson Fontes, Diretor Executivo responsável pela Regional Sudeste da Abrapp, que destacou a dificuldade de prever as perspectivas futuras com os cenários conturbados tanto no âmbito doméstico quanto internacional.
O Diretor da Abrapp ressaltou a imprevisibilidade das mudanças nos mercados, como por exemplo, a volta da abertura dos juros e o patamar dos prêmios dos títulos públicos que voltaram a pagar mais que as metas atuariais dos planos. Ao mesmo tempo, a Bolsa doméstica também voltou a se recuperar no início de 2022. Por outro lado, os investimentos no exterior, que estavam na ordem do dia como preferência de diversas entidades, passaram a registrar performances muito ruins.
A reviravolta empurrou as entidades a aproveitarem as oportunidades para aumentar a carteira de títulos públicos. “Foi uma oportunidade que reapareceu e que ninguém esperava. É o chamado Kit Brasil, com a atratividade dos títulos públicos e Bolsa doméstica”, comentou. O aumento da atratividade dos títulos públicos dificulta o processo de diversificação que tinha sido reforçada antes da pandemia. Além disso, os gestores de investimentos terão de enfrentar grandes desafios como o aumento da pressão inflacionária, o risco de aumento dos juros americanos, além da Guerra da Ucrânia e os riscos fiscal e eleitoral no Brasil.
Clayton Calixto, Portfolio Specialist da Santander Asset Management, coincidiu com as perspectivas para o cenário externo e nacional, que se mostram mais difíceis e desafiadoras. No plano internacional, considerando fatores como a escalada inflacionária, bancos centrais elevando juros, adicionadas pelos efeitos do conflito geopolítico criado pela guerra entre Rússia e Ucrânia, a expectativa é de um crescimento global no patamar de 3,5% em 2022, menor que o registrado no ano passado.
Com o advento da Guerra de Ucrânia e seu prolongamento, atualmente predomina uma cautela muito grande para os mercados globais. “Ninguém esperava um conflito bélico que durasse tanto tempo. Isso deve levar a uma atividade mais fraca ao longo do segundo semestre”, comentou. Ele citou também o fator da elevação de preços das commodities, em especial, do barril de petróleo, que não alcançava um patamar tão alto desde 2020.
No cenário nacional há também questões particulares. No médio prazo, o principal desafio do país é o fiscal. A perspectiva para os próximos anos é que os déficits continuem acontecendo, ainda que não na mesma magnitude do observado em 2020, que contou com o auxílio emergencial criado pelo governo para amenizar os impactos da pandemia.
Com relação aos desafios de curto prazo da economia doméstica, sem dúvida, o maior é a escalada inflacionária. Calixto destacou a ação firme do Banco Central nesse sentido, com a taxa básica de juros (Selic) saindo de 2% em 2021 para os atuais 11,75%. A projeção é que o IPCA deverá encerrar o ano estourando o teto da meta, em patamar de 6,8%, menor que os 10,6% observados em 2021, e reduzindo para 4% em 2023. A previsão da Santander Asset é que a Selic encerre 2022 em 13,25% e em 10% em 2023.
O gestor prevê um cenário com crescimento mais baixo para a economia brasileira, com a manutenção da taxa de juros em patamares elevados para tentar controlar a inflação. “Diferente do que vimos em 2021, os juros reais serão maiores”, acrescentou Calixto, notando que estes devem chegar a 6% para 2022, diferente de 2021, quando foram negativos.
Horizonte de longo prazo – Marcelo Otávio Wagner, Secretário-Executivo da Comissão Técnica de Investimentos da Abrapp e Diretor de Investimentos da Previ destacou que o horizonte de investimentos deve manter o olhar no longo prazo. Daí decorre a importância da preservação da alocação estratégica, em que o passivo deve sempre mandar no ativo. Ele reforçou o aproveitamento de oportunidades de imunização do passivo e disse que o controle de riscos é absolutamente imprescindível. “Temos de identificar os ativos que melhor contribuam para a preservação do poder de compra. Temos de manter sempre a atenção sobre o passivo, tanto nas fases de acumulação quanto desacumulação, por isso, devemos dar prioridade para os ativos indexados à inflação”, comentou.
A liturgia do processo de gestão é extremamente importante, ainda mais quando surgem oscilações muito fortes no curto prazo e reaparecem questionamentos para a realocação das carteiras. “Se temos uma política de investimentos bem traçada, com diretrizes de longo prazo, a entidade deve manter a aderência a este horizonte mais longo”, disse. Ele defendeu que a alocação estratégica deve predominar e que o ideal é haver combinação entre gestão ativa e passiva, sempre olhando para as características do passivo.
Persistência da inflação – Marcelo Wagner enfatizou que um dos principais desafios da economia global no cenário atual é o aumento da pressão inflacionária. “A inflação é o fato novo, que não existia, por exemplo, há 40 anos nos EUA, onde não tinha inflação mensal. E aqui no Brasil há 28 anos não víamos uma inflação mensal tão alta”, comentou. A boa notícia, segundo o Diretor da Previ, é que o Banco Central brasileiro havia antecipado o controle da inflação com o novo ciclo de alta dos juros. O resultado é que os prêmios dos títulos públicos também abriram para ficarem em patamar acima das metas atuariais. “É uma ótima oportunidade para proteger os passivos dos efeitos da inflação, promovendo o aumento do duration dos portfólios”, revelou.
Em seguida, Marcelo Wagner analisou as classes de ativos, começando pela renda variável doméstica. Neste caso, o Brasil foi beneficiado no início de 2022 porque tem a imagem de grande exportador de commodities. Os investidores globais têm a percepção que a Bolsa brasileiro é bastante líquida e que o mercado tem profundidade. O resultado é que ocorreu a recuperação da Bolsa, e isso não estava no radar. Por outro lado, com a alta da Bolsa, essa classe passou a perder aderência com o passivo, deixando a Previ em posição de underwriting.
Em relação aos multimercados, o Diretor da Previ disse que a classe ganha importância no cenário atual ao permitir que se navegue em momentos de maior volatilidade. Porém, destacou a importância da seleção dos gestores de multimercados. Já os ativos no exterior são influenciados por dois fatores opostos entre si. A valorização do Real ante o Dólar torna a classe mais atrativa para as fundações, porém a instabilidade do cenário internacional e a perspectiva de aumento dos juros pelo FED (Federal Reserve dos EUA) e demais bancos centrais das principais economias mundiais, justamente para conter a inflação, tira a atratividade das Bolsas e ativos internacionais. “Avaliamos que não é o momento ainda de ampliar os investimentos no exterior”, comentou Marcelo.
Responsabilidade dos investidores – O painel “Lei da Liberdade Econômica e o Limite de Responsabilidade dos Investidores” aprofundou as novas possibilidades geradas pela norma, publicada em setembro de 2019. O painel foi moderado por Armando Bello de Oliveira Júnior, Diretor Executivo responsável pela Regional Leste da Abrapp, que introduziu o tema e os palestrantes que abordaram o impacto da nova legislação sobre a gestão e os riscos das aplicações financeiras para os investidores institucionais.
Roberto Eiras Messina, Coordenador Suplente da Comissão Técnica Sudoeste de Assuntos Jurídicos da Abrapp e Advogado-Sócio da MMLC Advogados Associados, alertou que a Lei de Liberdade Econômica passou praticamente despercebida pelo setor da Previdência Complementar Fechada. A nova legislação foi aprovada no último ano do governo de Michel Temer e promulgada no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro e tem uma importância significativa porque introduziu diversas modificações no Código Civil brasileiro.
Dentre elas, está o artigo 1368 – D, inciso primeiro, que limita a responsabilidade das EFPC em relação aos resultados dos fundos de investimento. Esse dispositivo demanda alteração na Instrução CVM 555/2014, que foi tema de audiência pública, encerrada em abril de 2021. A nova regra da autarquia está em fase de discussão.
A exposição de motivos da Lei registra que para facilitar a canalização de recursos poupados para a economia real, se propõe que haja responsabilidade limitada dos fundos de investimento para aumentar a segurança da modalidade por meio dessas estruturas. “Ou seja, é um mecanismo de proteção do investidor”, destacou Messina. O dispositivo citado prevê que o regulamento do fundo de investimento poderá observar o disposto na regulamentação e estabelecer a limitação da responsabilidade de cada investidor ao valor das suas cotas.
“Antes, o fundo de pensão não tinha limite para suas perdas em um investimento. O que, a partir da nova legislação, ele pode exigir”, resumiu o advogado. A nova legislação indica que as eventuais perdas, com a inclusão de uma cláusula de limitação, devem ir até o limite das aplicações nas cotas para os investidores. Para demais perdas, incorrerá para o gestor ou para os terceiros. A nova regra deve facilitar a identificação da Previc sobre a análise dos atos de gestão dos recursos dos fundos, bem como, também facilita análises de ações no judiciário.
Perspectivas para a nova regra – Édner Bitencourt Castilho, Coordenador Titular da Comissão Técnica Sudoeste de Investimentos da Abrapp esclareceu que a Lei de Liberdade Econômica, entre outros temas, trata dos fundos de investimentos e a questão das responsabilidades sobre as perdas. Em relação ao arcabouço infralegal, vários pontos estão hoje em discussão a partir da minuta da norma colocada para audiência pública (n. 08/2020) pela CVM no ano passado. Comenta-se que a expectativa é o órgão regulador do mercado de capitais ter a nova regra ainda no primeiro semestre de 2022.
Com a limitação de responsabilidade promovida pela Lei da Liberdade Econômica, os investidores passariam a responder de forma proporcional ao valor das próprias cotas. Essa possibilidade existia para algumas categorias de fundos, mas não de forma generalizada, observou Édner. Outra mudança é que prestadores de serviços (gestores, custodiantes e administradores) não estarão mais sujeitos a responsabilidade solidária; as obrigações de cada um deverão ser previamente estabelecidas no regulamento.
A Abrapp defende que a regra de limitação de responsabilidade deve ser aplicada a todos os tipos de fundos – acrescentando os fundos exclusivos, ausentes na minuta da CVM. “Os fundos exclusivos são veículos muito utilizados pelos fundos de pensão. A ausência da possibilidade de limitação de responsabilidade dos investidores, nesse tipo de fundo, muito utilizado pelas EFPC, pode trazer uma situação incômoda, como a pressão por aplicação apenas em fundos com limitação de responsabilidade”, notou o especialista, agregando que a norma deveria contemplar também Fundos de Investimentos em Participações (FIP) e Fundos de Investimentos Imobiliários (FII).
O Coordenador avalia que a norma colaborará para a Supervisão Baseada em Riscos, sendo um indicador importante para a Previc definir o foco de suas ações. Adicionalmente, ele prevê que as empresas investidas deverão passar a tomar maiores cuidados na captação de recursos, o que contribui ainda mais para a segurança do processo de investimentos.
Patrocínio – A série de Encontros Regionais 2022 é realizada pela Abrapp, com o apoio institucional de UniAbrapp, Sindapp, ICSS, Sindapp e Conecta. Os encontros contam com Patrocínio Prata da Santander Asset Management; Patrocínio Bronze da BNP Paribas Asset Management, da Captalys e da Trígono Capital; além do apoio da Apoena Consultoria em Seguros, da I9 Advisory e da Mapfre Investimentos.
A participação no evento vale aos profissionais certificados 4 pontos no Programa de Educação Continuada – PEC do ICSS.