Artigo: Os Mercados de Capitais em 2037 – por Benjamin R. Mandel*, da Itaú Asset

Construir portfólios robustos de longo prazo requer uma perspectiva das classes de ativos globais também de longo prazo. Na indústria de investimentos internacional, esta é uma prática padrão. Chegar a uma alocação estratégica – ou seja, o portfólio base, aquele que seria mantido sem opiniões de curto prazo sobre os mercados financeiros – é um processo de formulação de trade-offs de risco-retorno durante um período que reflete a estrutura subjacente da economia e mercados. Existem diferentes opiniões, mas esse horizonte pode variar de 5 a 20 anos. 

Dito isto, a ideia de adotar uma perspectiva de muito longo prazo como ferramenta de construção de portfólio é uma raridade no Brasil. Isso reflete o fato de que a estrutura da economia e dos mercados brasileiros vem evoluindo mais rapidamente do que os do exterior, principalmente os mercados desenvolvidos. Dito de outra forma, grandes mudanças tectônicas nos regimes macro dificultam a extrapolação do passado do Brasil – incluindo episódios de hiperinflação, booms de commodities, crescente integração global e a revisão das estruturas políticas – para um futuro distante.

Então como os investidores brasileiros resolvem o quebra-cabeça de criar uma alocação estratégica, mas sem noção clara da estrutura dos mercados no longo prazo? Nosso paper, Os Mercados de Capitais em 2037, tenta fazer exatamente isso.  O estudo tem dois objetivos: (i) estabelecer um modelo consistente para estimar os retornos de longo prazo de ativos globais do ponto de vista dos investidores brasileiros e (ii) extrair um conjunto de temas-chave de investimento que esperamos serem relevantes em nosso horizonte de investimento de longo prazo.  

Nossas estimativas sugerem os seguintes temas amplos para os próximos 15 anos. Primeiro, esperamos um ambiente doméstico caracterizado por crescimento nominal mais baixo em relação às duas últimas décadas. No caso do Brasil, o crescimento nominal futuro será menor por dois motivos. Um deles é que a tendência de crescimento do PIB real permanecerá suave, melhorando em relação ao desempenho dos últimos 10 anos, mas não retornando às altas taxas de crescimento observadas no início dos anos 2000.  O outro é um fator macro mais positivo para o Brasil: a taxa de juros overnight (CDI) deverá ser em média mais baixa no futuro, à medida que a inflação ficar mais próxima da meta do Banco Central do que no passado.

Uma implicação direta dos rendimentos mais baixos esperados do CDI é que o caixa terá um papel menos dominante nos portfólios multimercados brasileiros. Os prêmios de risco embutidos em títulos, ações, crédito e moeda contribuirão de forma incremental em comparação com o caixa pós-fixado, e isso abrirá as portas para uma diversificação mais significativa entre os ativos.

Embora os rendimentos do caixa pós sejam mais baixos, isso não implica necessariamente que os retornos de renda fixa serão ofuscados por renda variável. No Brasil, ainda haverá prêmios de risco saudáveis embutidos em títulos pré-fixados e indexados à inflação; ou seja, mesmo com níveis mais baixos de inflação, os investidores ainda serão compensados pelo risco inflacionário.

Segundo, esperamos uma dinâmica de inflação global mais forte e mais volátil do que no passado.  No resto do mundo, e particularmente nos mercados desenvolvidos, a dinâmica da inflação está indo na direção oposta em relação ao Brasil.  Inflação mais “normal” nessas economias significa um papel mais importante para a proteção da inflação nas carteiras internacionais do que foi necessário no período pós-crise financeira.

Finalmente, nossa pesquisa sugere que ativos internacionais são cada vez mais importantes para os portfólios brasileiros.  O valor da diversificação internacional nos portfólios brasileiros se manifesta de várias maneiras.  Em primeiro lugar, as ações internacionais são os ativos com maior retorno. China e o índice MSCI EM, por exemplo, estão no topo da lista em termos de retornos esperados no longo prazo, com Brasil e EUA logo atrás. 

De fato, uma série de portfólios ao longo da fronteira eficiente construída com esses ativos contém um mix de ações internacionais.  Os retornos relativamente altos dos ativos internacionais em reais derivam tanto do crescimento mais alto nos mercados emergentes, em que o PIB nominal em lugares como a China ainda é substancialmente maior do que o Brasil, quanto do carrego da moeda, dado o diferencial positivo das taxas de juros entre o Brasil e o restante do mundo. 

Os ativos internacionais também contribuem para o portfólio devido às suas correlações relativamente baixas com os ativos domésticos brasileiros. Os títulos do Tesouro americano (Treasuries) são um exemplo importante de diversificação internacional devido à sua correlação negativa com a maioria dos mercados de ações globais e aproximadamente zero correlação com a renda fixa brasileira. O próprio dólar é um poderoso diversificador para cenários macro de baixo crescimento brasileiro, sugerindo uma alocação estratégica substancial.

*Ph.D e Head of Portfolio Strategy da Itaú Asset Management

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