A Abrapp e a Anbima realizaram um webinar com o tema da “Revitalização do FIP” como veículo de investimento e diversificação para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) nesta quinta-feira, 20 de maio, com público de mais de 200 inscritos. Contando com apresentações da Abvcap (Associação Brasileira de Venture Capital e Private Equity) e da Previc, o evento representou um importante marco para promover a retomada dos investimentos das entidades nessa classe de ativos.
O Diretor Presidente da Abrapp, Luís Ricardo Martins, realizou a abertura do webinar mostrando o momento virtuoso de retomada do fomento e crescimento do sistema de EFPC, com a multiplicação dos planos família e instituídos e o debate em torno do projeto de lei de harmonização das regras entre entidades abertas de fechadas. Após agradecer a participação da Anbima, Abvcap e Previc no webinar, logo em seguida, mostrou os resultados positivos que permitiram que o sistema fechasse 2020 com superávit agregado positivo, mesmo em período de pandemia e baixo crescimento econômico para a economia do país.
Luís Ricardo pontuou, porém, que apesar dos excelentes resultados recentes, as EFPCs enfrentam um grande desafio no momento atual e no futuro devido ao baixo patamar das taxas de juros dos títulos públicos e do aumento crescente da longevidade da população. “Continuamos com os desafios de buscar alternativas para a diversificação dos investimentos”, disse. Neste sentido, mostrou que os Fundos de Investimentos em Participações (FIPs) devem voltar ao radar das entidades como importante veículo para a diversificação e busca por melhores retornos no longo prazo.
Com o objetivo de proporcionar maior segurança e padronização, a Abrapp prepara, junto com a Previc e outros especialistas, a elaboração de um manual de boas práticas para os investimentos em FIPs. “Queremos criar um manual de boas práticas para unificar o entendimento e a blindagem dos FIPs. Será uma ferramenta no campo da autorregulação para desmistificar esse importante veículo de investimento para nosso setor”, comentou o Diretor Presidente da Abrapp.
Para Sérgio Wilson Fontes, Diretor Executivo da Abrapp e responsável pelo acompanhamento da Comissão Técnica de Investimentos, o webinar representou um marco histórico para quebrar definitivamente o tabu que se formou em torno dos FIPs nos últimos anos. Ele destacou a presença da Anbima no evento, que é uma organização com grande credibilidade para a autorregulação da indústria de fundos e uma importante parceira da Abrapp. E ressaltou ainda a congregação da Abvcap e do órgão fiscalizador, a Previc, para debater a viabilidade e aperfeiçoamento dessa classe de ativos no cenário atual.
Em cenário de juros em patamares baixos, os FIPs devem definitivamente voltar ao radar das entidades fechadas como alternativa para a construção de portfólios de longo prazo. “Se fosse um filme, diria que o tema deste webinar seria ‘precisamos voltar a falar sobre FIPs’. O tema deve voltar para a ordem do dia das áreas de investimentos das fundações”, comentou Sérgio Wilson, que também representa a Abrapp na comissão de FIPs da Anbima.
Carteira de FIPs – José Carlos Lakoski, Diretor Financeiro da Fundação Copel, apresentou o “case” de construção de uma carteira de FIPs formada ao longo dos últimos 8 anos. Iniciada em 2013, a carteira da entidade investe atualmente em 15 FIPs de 9 gestores diferentes. Tem R$ 423 milhões comprometidos nesta classe e R$ 311 milhões efetivamente aportados. A carteira apresentou retorno de 24,2% em 12 meses, sendo 12% acima do Ibovespa.
“Somos entusiastas dessa classe, mas é um trabalho que exige prudência e gestão de riscos adequada”, disse. O dirigente explicou que o FIP é um ativo de longo prazo e que, por isso, não serve para fazer “trade”. Destacou a importância do trabalho prévio de planejamento e execução dos investimentos, que são mais importantes que o monitoramento posterior.
“Uma das dificuldades é que os ativos são ilíquidos. Os FIPs não oferecem a possibilidade de entrar e sair a qualquer momento”, disse Lakoski. Apesar da iliquidez, é possível compor uma carteira diversificada e com riscos adequados. Para isso, é necessário planejar os prazos dos fundos, a seleção de gestores e a diversificação de setores. “Hoje há opções para promover uma boa seleção e diversificação de gestores e setores no mercado atual”, comentou.
O Diretor da Fundação Copel abordou também estratégias de diversificação com fundos que investem em projetos do tipo “greenfield” (mais iniciais) ou “brownfields” (mais maduros). A composição da carteira deve levar em conta as necessidades de “duration” dos planos de benefícios. Outra opção interessante, apontada pelo dirigente, são os fundos de fundos (FoFs) de participações que, apesar de oferecerem retornos mais baixos que os investimentos diretos em FIPs, permitem maior controle de risco e maior liquidez. Ele indicou ainda que os fundos de fundos oferecem uma boa alternativa de aprendizagem para as entidades que pretendem estrear com esta classe de ativos.
Lakoski destacou a importância do processo de análise e decisão para os investimentos em FIPs. Tudo deve ser documentado em todas as etapas do processo, com participação dos órgãos de governança da entidade, em especial o comitê de investimentos e do Conselho Deliberativo. E indicou ainda que os FIPs constituem importante classe de ativos para o momento atual e para os cenários futuros e que os participantes, em geral, não gostariam que esses fundos ficassem de fora das alternativas de investimentos para seus planos de benefícios.
Regulação dos FIPs – O Diretor da Anbima, Luiz Chrysostomo, agradeceu a oportunidade de debater com a Abrapp o tema da situação atual do segmento dos FIPs e destacou a participação de Sérgio Wilson como representante das EFPC na comissão da Anbima que trata dessa classe de ativos. Ele ressaltou o cenário atual de juros baixos que incentiva a arrancada dos FIPs na avaliação dos investidores.
Chrysostomo apresentou um quadro da evolução das regras dos FIPs no mercado brasileiro, ressaltando a importância do desenvolvimento de uma regulação própria para Private Equity e Venture Capital. Ele destacou as Instruções CVM 391 e 578 e mais recentemente a Lei 13.874 – mais conhecida como Lei de Liberdade Econômica e seus impactos sobre a regulação dos fundos de investimentos – que está em processo de reforma. Explicou que a nova lei representa um novo marco legal para a indústria de fundos como um todo, ao trazer maior segurança para os investidores. “Teremos um ambiente de maior clareza, com redução da incerteza jurídica que afeta os processos de investimentos na relação com as empresas investidas”, comentou.
O Diretor da Anbima explicou que a reforma da regulação, que está em andamento, tratará do fundo como um condomínio de natureza especial, afastando outros dispositivos do Código Civil que regem os condomínios. Ele disse que a nova regulação trará responsabilidade limitada e proporcional aos cotistas dos fundos, bem como maior clareza das responsabilidades para os prestadores de serviços, gestores e administradores.
A CVM está preparando uma nova resolução única para entregar ao mercado as adaptações à Lei de Responsabilidade Econômica. Nesta resolução, serão preparados anexos específicos para cada tipo fundo de investimento, inclusive para os FIPs. Disse que a Anbima está trabalhando com grande interação com CVM para a elaboração do novo arcabouço legal.
Importância da autorregulação – Luiz Chrysostomo abordou também a importância do sistema de autorregulação da Anbima aplicado à indústria de fundos de investimentos. Mostrou que o sistema já tem 22 anos de existência, com a constituição de 11 códigos de melhores práticas. O primeiro código trata dos IPOs (Ofertas Iniciais de Ações) e foi lançado no início dos anos 2000. A associação mantém um Código específico para FIPs, cujo conselho é formado com a participação de representantes da Abrapp, Abvcap, B3 e Ibracon.
Ele destacou que o sistema de autorregulação da Anbima conta com um processo de julgamentos com a possibilidade de estabelecimento de multas e punições mais severas, que preveem até a exclusão dos associados. Desde 2015, a autorregulação da Anbima enviou 161 pedidos de esclarecimento para os gestores e participantes do mercado, com 177 cartas de orientação e 143 multas.
O Código de FIPs da Anbima, assim como os demais códigos, estão em processo de revisão por conta das adaptações necessárias à Lei de Liberdade Econômica. Chrysostomo falou ainda sobre aspectos da complementação entre a regulação e a autorregulação. Explicou que a Anbima mantém convênios com a CVM para a instituição de penalidades e termos de compromisso. Os convênios decorrem do processo de delegação que o órgão supervisor delega para a Anbima. “A autorregulação e a regulação se falam constantemente. As agendas das duas esferas se unem em prol do desenvolvimento do mercado”, comentou o Diretor da Anbima.
Private equity e venture capital – A classe de ativos de private equity e venture capital, muito consolidada no cenário internacional, tem demonstrado crescimento também no Brasil, conforme apontam dados apresentados por Piero Minardi, Presidente da Abvcap.
Mais de 180 gestores ativos atuam hoje com private equity e venture capital, investindo em mais de 1,7 mil companhias, A indústria contou com mais de R$ 23,7 bilhões investidos em 2020, sendo que investidores comprometeram mais de 60% de seu capital nesse segmento. “Investir em private equity e em venture capital é investir na economia real brasileira”, disse Minardi, pontuando que com a redução das taxas de juros, há uma natural migração de renda fixa para renda variável, mas ainda assim, o investidor não alcança a economia real apenas indo para a bolsa.
O histórico dos fundos private equity e venture capital no Brasil mostra que houve um aumento no volume de investimentos, especialmente em venture capital, que começou a superar os investimentos em private equity no ano passado. Minardi avalia que esse fator é decorrente da desaceleração da economia, ao mesmo tempo em que houve uma aceleração enorme na parte de disrupção tecnológica, fintechs, atraindo mais capital para empresas desse setor.
Retornos superiores – Ele apresentou ainda números que mostram a relação entre o dinheiro investido e o valor desse dinheiro para o investidor, ou seja, quanto de retorno ele já teve a partir dos investimentos. “Quanto mais antigo o fundo, maior o retorno”, disse Minardi, comparando ainda o retorno desses investimentos em relação à bolsa ou ao CDI. “Mesmo nos momentos de CDI alto ou que a bolsa foi bem, o retorno médio de private equity e venture capital bateu com folga esses índices”, reiterou.
Minardi apontou ainda que o segmento de private equity e venture capital é um propulsor de novas empresas para o mercado de capitais brasileiro. “Existe uma clara conexão e um claro benefício do private equity e venture capital na formação do mercado público também”. Historicamente, nos últimos 10 anos, 57% das empresas que abriram capital eram investidas de fundos de private equity e venture capital, segundo os números apresentados. Em 2020, esse percentual foi de 50%, e até abril de 2021, esse percentual foi de 31%. Essas empresas apresentaram um retorno médio de mais de 180% pós-IPO nos últimos 10 anos, em contraponto a 23% de retorno para empresas não investidas por private equity.
É comum que o investidor dessa classe de ativos que escolhe sistematicamente seus gestores e faz programas de investimento tenha um retorno muito superior aos investimentos da média, explicou Minardi. “O trabalho de conhecer o investidor, com um programa consistente, buscando aprender, conhecer, entrar a partir de fundos de fundos e evoluir a partir disso, é um trabalho que mais do que se paga”. Segundo ele, o processo de seleção do gestor pode passar pela avaliação de seu histórico de retorno, mas mais do que isso, é preciso avaliar sua atuação, aconselhando investidores a fazerem a diligência e questionar as empresas investidas sobre essa atuação.
José Carlos Lakoski reiterou que essa proximidade no dia a dia do negócio investido é um ponto crucial e determinante nos processos de avaliação de investimentos de FIPs da Fundação Copel. “Cabe ao gestor a capacidade de manter sua equipe motivada, e olhamos muito esse histórico. É um aspecto fundamental”.
Supervisão baseada em riscos – Apresentando como o órgão supervisor lida com essa classe de ativos dentro de sua fiscalização, Carlos Marne Dias, Diretor de Fiscalização e Monitoramento da Previc, destacou que a Resolução CGPC nº 13 é a base para sua atuação não somente em relação aos FIPs, mas como aos demais investimentos das EFPC. A norma trata de princípios, regras e práticas de governança, gestão e controles internos adequados ao porte, complexidade e riscos inerentes aos planos de benefícios.
Em relação a todo o amplo processo de investimentos que é direcionado aos FIPs, Marne avalia que o que vai determinar se a entidade está apta ou não a fazer esse investimento é se sua estrutura é capaz de acompanhar todas as fases desses investimentos. Segundo ele, há, no sistema, entidades menores, sem corpo técnico para esse acompanhamento, o que poderia acabar sendo um limitador para investir nesse segmento.
Nesse sentido, Marne apontou que cada EFPC deve avaliar sua necessidade de liquidez, duration e a maturidade do plano para poder tomar essa decisão. A Previc também verifica se os riscos estão identificados, avaliados, controlados e monitorados dentro da entidade, em uma matriz de risco que mede a probabilidade do ativo prosperar, e qual o impacto nos objetivos do plano. “O problema não é um ativo ter alto ou baixo risco, o importante é a entidade se propor a conhecer e estar ciente desses riscos”, destacou.
Ele reiterou que a Previc está refazendo seu processos de supervisão baseada em riscos, passando por uma avaliação econômica e atuarial que abrange solvência, investimentos, atuarial, resultados, eficiência e operacional, tendo um controle mais detalhado sobre riscos de crédito, mercado, liquidez e atuarial, além de avaliar como a governança da entidade atua diante dessa avaliação.
Marne explicou ainda que a visão da supervisão é horizontal, passando pelo gestor, custodiante e pelos ativos. “A Previc trabalha em conjunto com os custodiantes, com a própria CVM, em uma atuação mais tempestiva em relação a alguns gestores e eventuais ativos”.
Regulação e Autorregulação – Os FIPs estão contemplados na resolução dentro do segmento de estruturado, sendo que as EFPC devem observar o limite de 20% no segmento, respeitando o máximo de 15% dos recursos do plano em FIPs. “Esse já é um investimento possível. Cabe a cada entidade avaliar esses ativos dentro de sua política de investimentos”, pontuou Marne.
Ele destacou que para esse investimento, sempre devem ser observadas as melhores práticas, e a autorregulação eleva o nível de avaliação em relação a especificidades do instrumento, sendo que iniciativas de treinamento e autorregulação são bem-vindas para ir além do que já é colocado na regulação vigente. “A gente verifica que entidades que tem um bom grau de governança servem de parâmetro para avaliarmos as demais”, disse Marne, ressaltando que entidades que possuem o Selo de Autorregulação em Governança de Investimentos da Abrapp acabam se diferenciando perante a Previc. Ele pontuou, contudo, que ainda não existe um selo específico que trata sobre FIP. “Se tivermos um tratamento de governança sobre esse tema, haverá um diferencial para essa entidade”, complementou.
(Matéria elaborada em conjunto com a jornalista Bruna Chieco)