Artigo: A elegibilidade do Fiagro para as EFPC – Por Matheus Corredato Rossi, do escritório Bocater*

Matheus Rossi

Na última semana, a B3 anunciou a listagem do 12º Fiagro, abrindo novamente oportunidade para que pequenos, médios e grandes investidores possam participar de um dos setores que mais crescem na economia brasileira, com maior dinamismo, liquidez e transparência. No site da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), podem ser encontrados 37 Fiagro registrados, com volumes de emissões que superam R$ 7 bilhões.

O Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais – Fiagro, foi instituído a partir da Lei nº 14.130, de 29 de março 2021, que alterou a Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993 (“Lei nº 8.668/93”) que, por sua vez, disciplinava até então apenas os fundos de investimento imobiliário.

Os Fiagro podem investir em uma ampla variedade de ativos, títulos e valores mobiliários, tais como direitos creditórios, imóveis, certificados de recebíveis do agronegócio (CRA), ações ou cotas de sociedades, sempre no contexto das atividades integrantes da cadeia produtiva agroindustrial, nos termos do art. 20-A, da Lei nº 8.668/93.

Mas, afinal, as entidades fechadas de previdência complementar (“EFPC”) sujeitas à Resolução CMN 4.661/2018, podem adquirir cotas do Fiagro?

A primeira observação é que a Resolução CMN 4.661/2018 não foi alterada para tratar de regras sobre o Fiagro.

Após 1 ano da criação do Fiagro, a omissão do ente regulador federal, obviamente, não deve ser compreendida no sentido de vedar a referida modalidade de investimento. Na verdade, a ausência de novo ato normativo se volta para dotar os gestores das EFPC de ampla discricionariedade de atuação diante de mais uma oportunidade do mercado.

A propósito, a Resolução CMN nº 4.661/2018 não veda a realização de investimentos no contexto das atividades integrantes da cadeia produtiva agroindustrial, seja por meio de carteira própria, carteira administrada ou fundos de investimento e fundos de investimento em cotas de fundo de investimento.

No “Segmento de Renda Fixa”, por exemplo, o art. 21, inc. III, alínea “f” da Resolução expressamente estabelece o limite de alocação de 20% dos recursos de cada plano em cédulas de produto rural (CPR), certificados de direitos creditórios do agronegócio (CDCA), certificados de recebíveis do agronegócio (CRA) e warrant agropecuário (WA). Trata-se de um limite de alocação bem expressivo.

Ainda, os investimentos na cadeia produtiva agroindustrial estão acessíveis às EFPC por meio de ações, debêntures e demais valores mobiliários de emissão de companhias abertas (BRF, Raízen, SLC Agrícola, São Martinho, JBS. Mafrig e muitas outras), bem como por meio de ativos reais, classificados nos Segmentos “Estruturado” e “Imobiliário”, que tenham como objetivo investir em propriedades rurais com foco em arrendamentos e valorização das terras, agricultura, florestas, pecuária, alimentos, produção de açúcar e etanol, construção de galpões e silos, etc.

A segunda observação é que a CVM optou por não editar uma regulamentação nova e específica para o FIAGRO, vez que há atualmente diferentes categorias de fundos, já regulados pela CVM, que permitem o investimento em direitos creditórios, imóveis, valores mobiliários e a aquisição de participação em sociedades envolvendo emissores e devedores integrantes da cadeia produtiva agroindustrial.

Na prática, por meio da Resolução CVM nº 39, de 13 de julho de 2021, a CVM permitiu que 3 (três) categorias específicas de fundos de investimento passassem a ter as suas políticas de investimentos direcionadas a investimentos exclusivos na cadeia produtiva agroindustrial, nos termos do art. 20-A, da Lei nº 8.668/93. São elas:

i) fundo de investimento imobiliário (FII), regulado pela Instrução CVM nº 472, de 31 de outubro de 2008, conforme alterada, devendo constar de sua denominação a expressão “Fiagro-Imobiliário”;

ii) fundo de investimento em direitos creditórios (FIDC), regulado pela Instrução CVM nº 356, de 17 de dezembro de 2001, conforme alterada, devendo constar de sua denominação a expressão “Fiagro-Direitos Creditórios”; e

iii) fundo de investimento em participações (FIP), regulado pela Instrução CVM nº 578, de 30 de agosto de 2016, conforme alterada, devendo constar de sua denominação a expressão “Fiagro-Participações”.

Em outras palavras, o Fiagro nada mais é do que um FII, FIDC ou FIP, com política de investimento voltada exclusivamente aos setores do agronegócio, tendo que lidar com as limitações inerentes à adoção das regras de tais categorias de fundos.

Por conseguinte, as cotas do Fiagro tornaram-se elegíveis às carteiras das EFPC sem a necessidade de alteração na Resolução CMN 4.661/2018, vez que não há propriamente uma regulamentação nova acerca dessa modalidade de fundo de investimento.

Assim sendo, as cotas do Fiagro-Imobiliário devem ser classificadas no “Segmento Imobiliário”, nos termos do art. 24, inc. I da Resolução CMN nº 4.661/2018.

Por sua vez, as cotas de Fiagro-Direitos Creditórios, devem ser classificadas no “Segmento de Renda Fixa”, nos termos do art. 21, inc. III, alínea “e” da Resolução CMN nº 4.661/2018.

Já as cotas do Fiagro-Participações, devem ser classificadas no “Segmento Estruturado”, nos termos do art. 23, inc. I, alínea “a” da Resolução CMN nº 4.661/2018.

Em relação aos limites prudenciais de investimento, aplicam-se os limites de alocação e concentração previstos na tabela abaixo:

Limite de Alocação por Emissor

(% em relação aos recursos de cada plano)

Limite de Concentração por Emissor

(considerada a soma dos recursos administrados pela EFPC)

Fiagro-Imobiliário

10%

(art. 27, III)

25% do PL do Fundo

(art. 28, II, “e”)

Fiagro-Direitos Creditórios

10%

(art. 27, III)

25% do PL do Fundo

(art. 28, II, “b”)

Fiagro-Participações

10%

(art. 27, III)

25% do PL do Fundo

(art. 28, II, “d”)

Portanto, à luz da norma prudencial de investimentos, não se vislumbra óbice legal à aquisição pelas EFPC de cotas de Fiagro-Imobiliário, Fiagro-Direitos Creditórios e Fiagro-Participações, tendo em vista que se tratam de categorias de fundos de investimento devidamente permitidas pela Resolução CMN nº 4.661/2018, devendo apenas ser observados os limites de alocação e concentração acima elencados e demais exigências regulatórias.

Oportunamente, caso venha a ser editada uma regulamentação específica para o Fiagro, o que não ocorrerá em 2022 como já deixou claro a CVM, poderá ser bem-vinda também a criação de um novo segmento na norma prudencial de investimentos das EFPC, o “Segmento Agronegócio”, como forma de melhor segregar e avaliar a exposição de risco nesse setor de elevada importância para a economia brasileira e com rentabilidade atrativa para as EFPC.

*Sócio do Escritório Bocater, Camargo, Costa e Silva e Rodrigues Advogados. Mestre em Direito pela PUC-SP. Foi Consultor Jurídico Adjunto da Previ (2003-2008) e Diretor Jurídico do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC (2010-2019)

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