Artigo: Investidores brasileiros devem considerar investir globalmente – Por Yoram Lustig, da T. Rowe Price, gestora parceira do BTG Pactual

Yoram Lustig

Investir globalmente se tornou uma prática padrão à medida que investidores em todo o mundo buscam diversificar suas carteiras e tirar o máximo de proveito das oportunidades disponíveis. Uma abordagem voltada a investimentos globais é particularmente vantajosa para os investidores brasileiros, tendo em vista o modo como os ativos do Brasil costumam se comportar em relação a muitos ativos no exterior.

Os títulos globais, a renda fixa global e as moedas estrangeiras, como o dólar norte-americano, tendem a ter uma correlação negativa com ações e títulos brasileiros. Isso significa que quando o valor dos ativos brasileiros cai, alguns ativos fora do Brasil poderiam oferecer fortes retornos positivos. Isso se deve em parte às particularidades desses ativos – como as características defensivas da renda fixa de alta qualidade emitida em mercados desenvolvidos – e à tendência de o real (BRL) cair quando os ativos brasileiros caem, impulsionando o desempenho dos investimentos estrangeiros quando os retornos são medidos em BRL.

O diversificador mais comum do risco de ações são os títulos governamentais. No entanto, nem sempre os títulos governamentais brasileiros diversificam os títulos brasileiros, já que ambos os ativos podem se mover em paralelo. Os títulos globais, por outro lado, mostram frequentemente uma correlação negativa com os ativos brasileiros – em sete dos últimos 10 drawdowns do mercado acionário brasileiro, os títulos globais geraram um retorno total positivo (e um retorno estável durante um dos três drawdowns restantes) em reais brasileiros (1). Além disso, as ações globais de alta qualidade e com grau de investimento que são cobertas em BRL geraram retornos positivos em cada um dos 10 drawdowns, promovendo, assim, a diversificação aos ativos brasileiros.

A Tabela 1 compara o desempenho e os riscos das ações e obrigações do Brasil, das ações e obrigações globais, assim como de três carteiras de multiativos: 1) 15% de ações brasileiras, 85% de títulos brasileiros (uma alocação típica para um plano de pensão no Brasil); 2) 60% de ações globais, 40% de renda fixa global (uma alocação comum de uma carteira global de multiativos); e 3) 90% de ativos brasileiros (carteira 1) e 10% de ativos globais (carteira 2).

Acrescentar uma alocação modesta de 10% aos ativos globais para uma carteira de ativos brasileiros teria aumentado o retorno em 0,6% ao ano, diminuído a volatilidade em 0,9% ao ano e reduzido o drawdown máximo em 3,4%. Esse resultado de maior retorno e menor risco é atraente.

Tabela 1: Retorno e características de risco das classes de ativos

Títulos brasileiros Títulos globais Obrigações brasileiras indexadas à inflação Renda fixa global medida em BRL Renda fixa global coberta em BRL Carteira brasileira 15/75 Carteira global 60/40 Carteira brasileira/global 90/10
% de retorno ao ano 6,0% 19,1% 13,2% 12,6% 12,8% 11,1% 16,9% 11,7%
% de volatilidade ao ano 23,3% 15,4% 7,8% 15,0% 3,0% 8,3% 9,2% 7,4%
Retorno/risco 0,26 1,24 1,69 0,84 4,32 1,33 1,83 1,58
% máxima de drawdown -42,8% -20,9% -13,8% -21,4% -2,0% -13,4% -9,9% -10,0%
Correlação com títulos brasileiros 1,00 0,04 0,55 -0,59 0,10 0,81 0,06 0,82
Correlação com obrigações brasileiras 0,55 -0,28 1,00 -0,43 0,36 0,94 -0,23 0,92

O desempenho passado não é indicativo de desempenho futuro.

Fontes: Análise realizada pela T. Rowe Price usando retornos mensais do Índice brasileiro Ibovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), Índice MSCI ACWI, Bloomberg Brazil Govt Inflation-Linked All Maturities Total Return Index (títulos brasileiros), Bloomberg Global Aggregate medido em BRL (sem cobertura) e coberto em BRL. Carteira hipotética I de 15% da Ibovespa e 85% de títulos brasileiros, carteira II de 60% ACWI e 40% Bloomberg Global Aggregate coberto em BRL, e carteira III de 90% da carteira I e 10% da carteira II. Período de setembro de 2008 a agosto de 2021. Retornos medidos em BRL

Como construir uma carteira global?

Ao construir uma carteira global, três considerações importantes devem ser consideradas: 1) formular expectativas realistas de retorno e risco; 2) alocação estratégica de ativos; e 3) ataque e defesa.

1. Formular expectativas realistas de retorno e risco

Os investidores se beneficiaram de um desempenho bastante forte dos mercados globais de ações e de renda fixa na última década. Após a crise financeira global de 2008/09, os bancos centrais reduziram as taxas de juros, enquanto a inflação e o crescimento econômico se mostraram favoráveis. Os rendimentos dos títulos governamentais caíram, fazendo aumentar os preços dos títulos. Ao mesmo tempo, os mercados acionários globais se recuperaram, à medida que os investidores em busca de melhores retornos se voltaram aos mercados acionários em lugar dos mercados à vista ou de renda fixa. Ganhar dinheiro nos mercados financeiros tem sido relativamente fácil.

Atualmente, as avaliações da maioria das classes de ativos estão elevadas. Um preço mais alto hoje significa retornos mais baixos amanhã. Os investidores não devem esperar que os retornos relativamente altos dos mercados acionários e de renda fixa continuem no mesmo nível na próxima década. Em vez disso, devem ser esperados retornos mais modestos.

Por exemplo, em termos de dólares norte-americanos, os títulos globais apresentaram um retorno de 9,0% ao ano e os títulos globais cobertos pelo dólar de 4,2% ao ano nos últimos 13 anos (2). Em contrapartida, a T. Rowe Price espera um retorno de 5,6% ao ano para títulos globais e de 0,8% ao ano para títulos globais cobertos em dólar norte-americano nos próximos cinco anos (3). No entanto, a taxa de juros relativamente alta do Brasil significa que os investidores brasileiros que investem em ativos denominados em moedas com taxas de curto prazo mais baixas poderiam potencialmente se beneficiar do carry positivo. O carry atual para os investidores no Brasil resultante da cobertura de moedas no Bloomberg Global Aggregate Index em BRL é de 4,8% (4), o que significa que para os investidores brasileiros que realizaram operações de cobertura da exposição cambial dos títulos globais, o retorno esperado aumenta de 0,8% para 5,6%.

No entanto, uma expectativa de retornos mais modestos no futuro não é um motivo para os investidores no Brasil deixarem de adicionar investimentos globais à sua carteira. Em primeiro lugar, os retornos esperados dos ativos brasileiros são mais modestos do que no passado, até por causa das expectativas de aumento das taxas de juros no Brasil. Em segundo lugar, o retorno esperado de 5,6% ao ano para os títulos globais poderia beneficiar os investidores no Brasil. E em terceiro lugar, os retornos esperados são apenas metade da equação. O outro lado do retorno é o risco. Adicionar investimentos globais a uma carteira de ativos predominantemente brasileira poderia, além de aumentar os retornos, reduzir os riscos.

2. Alocação estratégica de ativos

A decisão mais importante que os investidores tomam é a alocação estratégica de ativos (SAA – estrategic asset allocation) de sua carteira. A SAA aloca no longo prazo para os mercados de ações e de renda fixa, assim como para classes de ativos mais granulares. A SAA determina a preponderância do retorno e do risco da carteira no longo prazo.

Ao decidir sobre a SAA apropriada, os investidores devem ter em mente correlações, riscos e retornos esperados realistas e prospectivos, a fim de determinar a alocação ideal, maximizando os retornos esperados para um nível de risco desejado. Para investidores no Brasil, é importante considerar a SAA da carteira global com base em sua carteira existente de ativos principalmente brasileiros. A principal consideração deve ser como a carteira global interage e influencia a carteira atual.

Ao implementar exposições para as diferentes classes de ativos, os investidores no Brasil devem decidir se desejam permitir que sua carteira global invista no Brasil e na América Latina ou se preferem continuar a fazer isso por conta própria e confiar à carteira global os investimentos em outros lugares. Neste ponto, o gestor da carteira deve personalizar a carteira global conforme as necessidades e preferências do investidor.

3. Ataque e defesa

Ao construir uma carteira de multiativos, é importante que os investidores considerem o papel de cada ativo na carteira. Como um time de futebol bem equilibrado, as carteiras devem incluir ataque e defesa. O papel de alguns ativos é ofensivo: gerar retornos e/ou receitas relativamente altas. O papel de outros é defensivo: diversificar os ativos de ataque. O desafio é que muitos ativos têm um rótulo enganoso: eles parecem ser defensivos, mas quando a defesa é necessária, eles se tornam ofensivos, caindo junto com os ativos de risco sem oferecer diversificação no momento em que isso é mais necessário.

Por exemplo, embora os títulos globais High Yield sejam rotulados como renda fixa, eles têm maior correlação com os mercados de ações do que com os títulos governamentais. Nas carteiras, portanto, eles fazem parte do ataque, não da defesa. Os investidores devem olhar além dos rótulos e considerar as características de cada ativo.

Consideraríamos três tipos de investimentos que podem ser verdadeiramente defensivos e são capazes de diversificar os ativos brasileiros: 1) títulos globais com grau de investimento e duração de alta qualidade – como US Treasuries, títulos alemães e Gilts britânicos – cobertos por BRL; 2) exposição à moedas portos-seguros, como o dólar norte-americano e o iene japonês; e 3) estratégias conservadoras de investimentos em ativos que usam técnicas como gestão de duração, uma cobertura cambial de ativos e volatilidade gerenciada. Idealmente, os investidores devem considerar diversificar os diversificadores, combinando todas as três maneiras de adicionar uma defesa robusta às carteiras.

A importância da gestão de ativos

Ao construir uma carteira global, os investidores devem escolher se desejam investir passivamente ou por meio de um gestor de ativos. Nos últimos 13 anos, uma carteira que investiu 60% em ações globais e 40% em renda fixa global teria gerado um retorno de cerca de 7,1% ao ano em dólares norte-americanos (5). Com base em nossas suposições sobre o mercado de capitais, acreditamos que uma carteira similar pode gerar um retorno de 3,7% ao ano nos próximos cinco anos em dólares norte-americanos.

No passado, tudo o que os investidores tinham que fazer era comprar rastreadores de índices e aproveitar a ascensão dos mercados globais de ações e títulos. No futuro, os investidores terão uma escolha: se contentar com retornos mais modestos ou fazer seu dinheiro trabalhar mais usando a gestão de ativos. Se uma carteira gera 7,0% a cada ano, ter mais 2,0% de alfa (ou excesso de retorno acima do valor de referência) é bom, mas não é uma necessidade. Já se uma carteira gera cerca de 4,0% ao ano, ter mais 2,0% de alfa pode fazer uma grande diferença.

A gestão qualificada de ativos pode agregar valor de forma consistente através da seleção criteriosa de títulos e da alocação tática de ativos. Uma abordagem de investimento global, com o vasto conjunto de oportunidades que ela oferece, permite que esses gestores qualificados de ativos selecionem títulos em um amplo universo. É importante ressaltar que a gestão de ativos pode facilmente considerar as preferências dos investidores quando se trata de incorporar fatores ambientais, sociais e de governança (ESG – environmental, social and governance) em sua carteira. Fatores ESG podem impulsionar o desempenho, assim como assegurar que os investimentos estejam alinhados aos valores de seus investidores.

A oportunidade de os investidores no Brasil aumentarem a exposição a uma carteira global bem construída e gerenciada traz inúmeros benefícios potenciais. Isso poderia ajudar tanto a aumentar o desempenho quanto a reduzir os riscos.

Oportunidades como essas são raras.

 

*Yoram Lustig, CFA. Chefe de Soluções de Multiativos, EMEA e Latam da T. Rowe Price, gestora parceria do BTG Pactual

 

Notas:

(1) Análise realizada pela T. Rowe Price usando retornos mensais do Índice brasileiro Ibovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), Índice MSCI ACWI, Bloomberg Brazil Govt Inflation-Linked All Maturities Total Return Index, Bloomberg Global Aggregate coberto em BRL. Período de setembro de 2008 a agosto de 2021. Retornos medidos em BRL

(2) O desempenho passado não é indicativo de desempenho futuro. Fontes: Fontes: Análise realizada pela T. Rowe Price usando retornos mensais do Índice MSCI ACWI, Bloomberg Global Aggregate coberto em dólar norte-americano (USD). Setembro de 2008 a agosto de 2021. Retornos medidos em USD.

(3) T. Rowe Price “Capital market assumptions five-year perspective 2021” (Perspectiva de cinco anos das suposições sobre o mercado de capitais). Retornos esperados em dólares americanos.

(4) Os pesos das moedas no Índice Bloomberg Global Aggregate em 31 de agosto de 2021 e suas taxas de política de curto prazo (entre parênteses): 43,7% USD (0,25%), 24,0% EUR (0,0%), 13,6% JPY (-0,10%), 7,2% CNY (4,35%), 5,1% GBP (0,10%), 2,9% CAD (0,25%), 1,5% AUD (0,10%), 1,1% KWN (0,75%), 0,5% CHF (-0,75%) e 0,4% SEK (0,05%). A taxa Selic do Brasil é de 5,25%, a taxa básica de juros para o BRL. O carry da cobertura cambial é calculado como a média ponderada do diferencial de taxa de juros entre cada moeda e o BRL.

(5) O desempenho passado não é indicativo de desempenho futuro. Fontes: Fontes: Análise realizada pela T. Rowe Price usando retornos mensais de 60% do Índice MSCI ACWI e 40% do Bloomberg Global Aggregate coberto em dólar norte-americano (USD). Período de setembro de 2008 a agosto de 2021. Retornos medidos em USD.

 

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