Artigo – Jovens: o real desafio dos fundos de pensão – Por Sara Marques*

Sara Marques

Nos últimos anos, os fundos de pensão viveram inúmeros desafios. Nos ciclos de queda de juros, o foco era diversificar a carteira para garantir a rentabilidade definida pelas metas ou benchmarks e cumprir com as demandas do passivo. Posteriormente, a necessidade foi a mudança de indexadores com o fim do lançamento de ativos indexados ao IGP-M. Mais recentemente, este leque de obstáculos ganhou inúmeros fatores, até então inesperados, com a crise gerada pela COVID-19 e todos os seus desdobramentos.

Gerenciar uma carteira de ativos para que ela gere o retorno necessário para o cumprimento das obrigações, de fato, não tem sido algo trivial. Porém, além de todos estes desafios, as entidades e os fundos de pensão enfrentam um problema que, apesar de ser silencioso, representa um risco crescente – e iminente – para a sobrevivência desta indústria. Aqui, o desafio não tem nenhuma relação com análises e definições de estratégias de investimento de curto, médio e longo prazos, com os cálculos atuariais ou ajustes entre passivo e ativo.

Passado o pior momento da crise e o fato de o retorno mais elevado com os ativos de renda fixa trazer certa tranquilidade na gestão ativa das carteiras, é hora de entidades se debruçarem sobre um dos maiores desafios das últimas décadas: como atrair os jovens para os fundos de pensão. Sem novos participantes, o futuro dos fundos de pensão fica, literalmente, ameaçado. E os jovens estão bem longe de enxergar os benefícios de um fundo de pensão.

Uma série de fatores contribui para este cenário. Primeiramente, podemos destacar que as relações de trabalho. Ao contrário de gerações passadas, os profissionais não querem mais permanecer por décadas na mesma empresa.  Longe disso. Muitos querem ter oportunidades de transitar por diferentes startups, preferencialmente de países diferentes e com negócios cada vez mais distintos.

O fundo de pensão deixou de ser um benefício desejado. Muitos, na verdade, até mesmo desconhecem o funcionamento de um fundo de pensão. Para as novas gerações, benefícios desejados são questões como flexibilidade de horário e possibilidade de trabalho remoto. Hoje, dificilmente um profissional com menos de 40 anos começa a pensar na sua previdência privada e na capacidade de poupar. Além disso, muitos nem pensam em se aposentar, como mostrou a pesquisa Raio X do Investidor, 2022, da ANBIMA.

E como fazer para atrair este jovem? O tema é polêmico e de difícil resposta. Mas, alguns pontos podem – e deveriam – ser trabalhados constantemente pelas entidades. Na minha opinião, o primeiro – e talvez um dos mais relevantes – é a educação financeira. É preciso investir em educação financeira para que os mais jovens saibam que precisam sempre pensar no futuro. Planejada ou não, a aposentadoria chega e nosso dever é conscientizar estes jovens das diversas oportunidades que os benefícios de aposentadoria oferecidos por entidades fechadas de fundo de pensão podem proporcionar. Despertar a necessidade de iniciar o movimento de poupar e, posteriormente, avançar para análises sobre a evolução dos custos após aposentadoria precisam estar no radar. Vale destacar que este investimento em educação não trará retorno no curto prazo. É um investimento que deve ser contínuo, pensando no desenvolvimento dos jovens no longo prazo e na perpetuidade do modelo de previdência complementar.

Além disso, há questões estruturais dos fundos de pensão que podem ser trabalhadas. Muito mais que adaptação de linguagem, os jovens querem se conectar. Os fundos precisam achar formas de se aproximar deste público.  Como estamos falando de uma geração que não quer ficar em uma empresa por anos, a questão da mobilidade é essencial, seja mobilidade de seu saldo de contas ou de ele poder ter os benefícios oferecidos pelo plano de outras formas, modelo que vem sendo tratado por Planos Instituídos, por exemplo.

Estes novos investidores precisam saber e estar seguros de que uma previdência complementar não é uma sentença a ser cumprida, mas sim uma oportunidade a ser aproveitada e que ela pode ser adaptada conforme suas necessidades e de acordo com o seu momento de vida, pensando num destino final, que é garantir a qualidade de vida durante a aposentadoria. Ter um propósito, um objetivo também engaja estes novos participantes e o mercado de fundo de pensão deve repensar sobre sua estratégia para este público.

Manter o prazo de cinco anos de permanência na empresa ou os descontos para resgate antecipados são fatores que normalmente contribuem para afastar ainda mais este público dos fundos de pensão. Em contrapartida, podemos destacar que os perfis diferentes para os fundos de contribuição variável (CV) ou Contribuição Definida (CD) foram um avanço.

É hora de avançar mais. Os fundos de pensão existem para garantir um futuro melhor para os seus participantes. Os participantes hoje já mudaram. Para que novos participantes sigam este caminho, é preciso conquistá-los. E somente com alinhamento de objetivos podemos visualizar um futuro promissor.

* Sara Marques, diretora da área de Consultoria da LUZ Soluções Financeiras

Shares
Share This
Rolar para cima