Artigo: Os indicadores ESG e o futuro do investimento pós-pandemia – Por Daniel Celano*, da Schroders

Daniel Celano

A crise da covid-19 trouxe um período bastante turbulento para os mercados, pela natureza de incertezas que gerou na economia global e suas cadeias de valor, e deve a pandemia continuar gerando desafios em todos os aspectos da sociedade por alguns anos. Os gestores passaram a lidar com riscos e variáveis inéditos, além do desafio de exercer o seu papel de construir carteiras em função do cenário de oportunidades e enxergar além das janelas de curto prazo. Mais do que nunca, a gestão ativa será fundamental para a nova configuração da economia global pós-pandemia.

No estudo da Schroders “Verdades Inevitáveis”, atualizado recentemente, foram levantadas uma série de tendências de investimentos a médio e longo prazo em três áreas principais: adoção acelerada de tecnologia, instabilidade política e o foco maior das companhias em questões ambientais, em especial nas mudanças climáticas. Gostaria de abordar este último ponto aqui.

É notório como a sustentabilidade passou a ganhar mais espaço na agenda dos executivos das grandes corporações. Isso porque empresas com melhor abordagem de práticas sustentáveis acabam entregando melhores resultados, tendem a um menor custo de capital e apresentam fatores mitigantes de risco operacional mais robustos (na maior parte dos casos), o que tem atraído cada vez mais o interesse de investidores. Como resultado, temos presenciado o lançamento de diversos fundos de ações especializados em empresas que seguem critérios ambientais, sociais e de governança (ESG).

O crescimento da procura por investimentos sustentáveis é bastante positivo. Não há dúvida. Mas como definir critérios e metodologias de forma a mensurar o nível de ESG dentro de uma companhia? A complexidade do assunto exige, no mínimo, uma análise com transparência, isenção e embasamento.

Há uma série de índices ESG disponíveis no mercado. O ponto de atenção é que não há um denominador comum entre eles, ou seja, a dispersão dos ratings ESG de uma mesma empresa são relevantes entre os índices disponibilizados. Alguns medem a exposição ao risco ESG comparando uma empresa a seus concorrentes; outros, analisam o risco de maneira absoluta. É preciso considerar o uso de indicadores complementares e comunicar de forma adequada a seus clientes sobre os valores e métodos usados. Isso porque desconsiderar os parâmetros adequados pode levar a uma análise superficial, super expondo a carteira a grandes empresas, por exemplo, que dedicam mais recursos à sustentabilidade e à sua divulgação, por serem naturalmente mais expostas ao risco; ou subestimando empresas de setores menos expostos aos riscos sociais e de meio ambiente, como financeiro ou de tecnologia.

Podemos usar como exemplo o que fazemos na Schroders. Nos últimos 20 anos, temos desenvolvido ferramentas próprias para endereçar esses pontos e melhor quantificar os riscos e potenciais ESG das empresas. Não apenas usamos índices de terceiros ou filtros, mas traduzimos em termos financeiros os impactos de uma empresa na sociedade. Os dados são analisados por um time de especialistas integrado internacionalmente e usados como ferramenta para gestores guiarem as estratégias no mundo todo, inclusive no Brasil.

Fazemos isso com o apoio de dois sistemas proprietários para quantificação e melhor análise e gestão de portfólios. A ferramenta SustainEx™ analisa mais de 750 artigos acadêmicos e mais de 70 fontes de dados, aplicados a mais de 13 mil empresas (e segue expandindo o universo de cobertura), para ajudar a quantificar externalidades e riscos ESG, atribuindo um valor em dólares ao custo ou ao benefício que uma empresa traz à sociedade, ou seja, o seu “valor social”. Já a CONTEXT analisa a relação de uma empresa com seus stakeholders, fornecendo evidências de como estão gerenciando os seus principais riscos, e estabelecendo uma classificação de acordo com a sustentabilidade de seu modelo de negócios.

O importante é que os resultados obtidos pelas ferramentas proprietárias não são tidos como uma resposta definitiva, mas considerados como um dos fatores relevantes de análise. Uma avaliação ESG eficaz deve ir para além de quantificar riscos: deve também questionar a reação das companhias a esses riscos; contemplar cenários futuros e probabilidades.

Para o mundo pós-pandemia, as exigências devem ficar ainda maiores, e os investimentos em ativos com melhores práticas ambientais, sociais e de governança só tendem a crescer. Se bem feita, a análise ESG é um fator intrínseco de mitigação de risco, com visão de longo prazo da sustentabilidade dos lucros e modelos de negócio vencedores em benefício dos investidores/ clientes.

*Daniel Celano, CFA, é Diretor-Presidente da Schroders Brasil.

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