Artigo: Previdência privada, controle e autorregulação – Por Renato Villela*

Renato Vilela Funcef

Tem havido recentemente certa confusão quanto aos papéis das Entidades Fechadas de Previdência Complementar – EFPCs e a administração pública, mormente em relação àquelas entidades que têm empresas públicas como patrocinadoras. 

As EFPCs não lidam com recursos públicos e sim com recursos de um contingente bem determinado de agentes: de um lado os participantes que lá têm depositadas sua parcela na formação da poupança para fazer face ao futuro, de outro lado a parcela correspondente devida pela patrocinadora. Além do fato de as EFPCs serem empresas privadas sem fins lucrativos. A confusão provavelmente decorre da equivocada ideia de que a contribuição patronal, no caso em tela de empresas estatais, seriam ainda recursos públicos. 

Os recursos das EFPCs não são públicos. No momento em que a patrocinadora repassa sua contribuição, esse montante passa a ser comparável ao que ela gasta, por exemplo, com combustíveis ou energia elétrica. O que é de interesse público é o processo de realização da despesa. No nosso exemplo, o que importa ao público é se o processo de compra desses insumos seguiu a lei e as regras de licitação e não se sua fornecedora gere eficientemente sua receita operacional. Esse último ponto só é relevante para os acionistas da fornecedora. 

No caso das EFPCs, seus recursos concernem primariamente a participantes e patrocinadora. Esta última tem o dever de acompanhar de perto o uso desses recursos (como é feito diligentemente pelos participantes), em vista da possibilidade de incorrer em passivos. 

As EFPCs já se submetem a um grande número de órgãos de regulação e controle. A Previc, o principal deles, já atua com diligência e rigidez ímpares em seu papel de principal agência reguladora do Sistema. Além disso, como acima mencionado, cabe à patrocinadora acompanhar todos os acompanhar todos os aspectos da atuação da entidade previdenciária e agir, preventiva ou posteriormente, através de sua ampla representatividade no Fundo. 

O Banco Central também pode participar (indiretamente) em alguns casos do controle e regulação da entidade. No caso das EFPCs patrocinadas por bancos, o BACEN, por meio dos próprios bancos, exerce vigilância sobre aquelas entidades previdenciárias no sentido de evitar que seus eventuais passivos “subam” para o patrocinador. 

Há ainda a CVM que acompanha caso a caso as operações do mercado de capitais e, no caso de alguma irregularidade impor sanções às EFPCs na qualidade de investidoras. 

Supervisão e controle externo não faltam. Deixando o controle interno, rígido na grande maioria dos casos, para outra oportunidade, parece límpido não haver necessidade de órgãos adicionais, com pouca experiência no mètier, trazerem para si essa responsabilidade adicional. A gestão de recursos de terceiros é bem mais complexa que outras atividades privadas e públicas, com um número significativamente maior de aspectos a considerar. 

A rampa de aprendizagem é bastante íngreme. Para as EFPCs, cumprir exigências de novos órgãos de controle exigiriam ainda mais tempo do que já é dedicado hoje a responder ou a explicar eventuais equívocos de novos atores no processo. 

Por esses motivos, é desejável que a supervisão também seja feita por especialistas. O acompanhamento por técnicos com experiência de às vezes décadas no Mercado de Capitais, com capacidade de entender e dialogar a respeito de operações de elevado grau de complexidade só trazem segurança e agilidade a vários dos investimentos, aumentando significativamente a probabilidade de auferirem maior rentabilidade. 

É evidente que estamos falando aqui de autorregulação. Dentre as vantagens que se tem, vale citar (i) operações que escapariam a técnicos não especializados seriam detectadas, garantindo sanções aos envolvidos; (ii) operações perfeitamente lícitas, embora complexas, não seriam retardadas ou provocariam sanções a posteriori; (iii) a sanção aplicada por seus pares é muito mais grave para um operador de Mercado; e (iv) desoneraria o governo das despesas inerentes ao aumento das responsabilidades dos órgãos públicos de controle. 

A Autorregulação seria uma situação “ganha-ganha” para toda a indústria, não só para as entidades patrocinadas por empresas públicas. 

*Economista, foi Secretário de Fazenda dos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo e é ex-Diretor-Presidente da Funcef.

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