Cenário de recuperação abre oportunidades para diversificação global e local

A importância da diversificação dos portfólios diante de uma taxa de juros próxima a zero, bem como a necessidade de conhecer e entender os cenários global e local de investimentos se fazem fundamentais para as estratégias de alocação com vistas ao compromisso previdenciário das entidades. Para debater o tema, foi realizado, nesta sexta-feira, 18 de setembro, pela Abrapp, o webinar Cenários Global e Local de Investimentos, que contou com um público on-line de 600 pessoas.

O Diretor Presidente da Abrapp, Luis Ricardo Marcondes Martins, destacou na abertura do evento a notabilidade do tema e registrou a resiliência, solidez e profissionalismo com que o sistema encara o momento atual de pandemia. “À luz do amadurecimento e da antecipação dos efeitos da pandemia, o sistema se superou”. Ele destacou que o mercado financeiro já se recuperou do impacto mais forte da crise, e isso reflete também nos planos de previdência. “Com o profissionalismo que integra o sistema, temos que aproveitar esse ciclo virtuoso que se abre na nossa frente.”

Diante disso está a importância da diversificação de risco e de olhar o mundo fora do Brasil. “A estratégia de longo prazo nos permite buscar alternativas para rentabilizar e cuidar dos recursos de terceiros. Vamos precisar, portanto, revisitar a Resolução CMN 4.661 para dar mais flexibilidade e ter mais produtos para o perfil de longo prazo. A questão imobiliária precisa ser resolvida, bem como a ampliação de investimentos no exterior”, disse Luís Ricardo. A finalidade de proteger pessoas se dá devido à gestão profissional do segmento, e o Diretor Presidente da Abrapp ressalta que os dirigentes são fundamentais para que estratégias corretas e seguras sejam implementadas.

Ainda na abertura, o Diretor de Investimentos da Previ e Secretário do Colégio da Comissão Técnica de investimentos da Abrapp, Marcelo Wagner, destacou os compromissos previdenciários das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) assumidos ao longo de décadas com planos de Benefício Definido (BD), além da responsabilidade de dar rentabilidade para quem está constituindo reservas em período laboral. “Em um país com baixas taxas de juros, é desafiante”, pontuou, enfatizando que as apresentações do webinar visam responder como é possível fazer a montagem de um portfólio adequado ao novo cenário que se apresenta.

Cenário Macro e Diversificação Internacional – A Estrategista de Mercados Globais da J.P. Morgan Asset Management, Gabriela Santos, destacou que os investimentos internacionais têm um papel muito importante na diversificação, especialmente em planos de Contribuição Definida (CD) ou nos BD deficitários. “O cenário internacional ajuda no retorno e também a diversificar os ativos locais. Para isso, é preciso entender ou ter um parceiro que entende muito bem o que está acontecendo no mundo, não só na economia global, mas nas companhias globais”, disse Gabriela.

Ela iniciou a apresentação contextualizando sobre o impacto mundial da pandemia do novo coronavírus (COVID-19). “Todos tiveram que lidar com esse problema, e infelizmente será algo que continuará nos afetando e sendo uma preocupação para a economia global, pois ainda não temos a vacina”, disse. Gabriela pontuou, porém, que já é possível lidar melhor com a crise, com tratamentos melhores e sistemas de saúde menos esgotados e maior precaução, o que reduz o número das fatalidades mundialmente. “Com isso, começamos a reabrir as atividades e saímos da recessão causada pelo choque inicial, iniciando uma recuperação econômica”.

Outro ponto destacado é que o choque de COVID-19 foi grande, mas há situações diferentes em regiões diferentes em termos de quando o vírus chegou e as medidas foram apresentadas, o que afeta o ritmo da recuperação econômica e os diferentes mercados. Ela detalhou o nível de retomada das atividades em diferentes países. “Começamos uma recuperação econômica, um novo ciclo, devagar e um pouco incerto, mas o importante é o fato que estamos caminhando em uma melhor direção”, destacou.

Em termos de investimento, a renda fixa tem dado bons retornos, com preços interessantes, mas é preciso focar não somente em maximizar retornos, como também avaliar o nível de risco. “Quanto mais a gente olha a renda fixa, os ativos que têm os ganhos mais altos têm também maior risco”, disse Gabriela. Já em renda variável, há recuperação diferenciada dependendo da região, com a bolsa americana e da Ásia tendo uma recuperação maior frente a América Latina e Europa. “Há ainda uma grande diferenciação baseada no tipo de companhia e setor. Energia, indústria, algumas companhias de consumo discricionário e bancos foram muito afetados pela pandemia, enquanto tecnologia e saúde tem se amplificado, ajudando na recuperação das bolsas americanas e asiáticas. Isso ajuda a explicar a diferença de recuperação regional da bolsa, que se dá não apenas pela economia, mas pelas companhias”, pontuou.

Longo prazo – Gabriela destacou que a alocação em renda variável é sempre uma estratégia de longo prazo, baseada em fundamentos e no crescimento de lucro das companhias, pensando no sucesso em anos, não em meses. “Além disso, é uma alocação estratégica, e não tentando acertar a entrada e saída”, pontuou. Segundo ela, isso explica o porquê de fatores como as eleições americanas não afetarem o retorno de longo prazo da bolsa. “É diferente do Brasil, onde as eleições mudam as coisas na margem, causando volatilidade. Nos Estados Unidos, esse não é um fator que muda as decisões de investimentos, e por isso comprar ações lá é uma parte estratégica da carteira”, disse, reiterando que a renda variável global tem um comportamento muito diferente do mercado local, o que ajuda muito a diversificar portfólios.

Estratégias defensivas – Ainda pensando na crise de COVID-19, a Associate Director, Global Research & Design na S&P Dow Jones Indices, Maria Sanchez, destacou quais as estratégias defensivas baseadas em índices podem ser usadas para minimizar esse tipo de impacto nas carteiras das entidades. “Nos últimos anos, vimos Bancos Centrais e globais reduzirem suas taxas de referências, em especial no Brasil, que há poucos anos estava em dois dígitos. Entre as estratégias defensivas que podem ser usadas para atenuar esse tipo de situação está a de renda variável, que procura selecionar ou alocar nas companhias percebidas como de menor risco”.

Além disso, Maria apontou estratégias de baixa volatilidade, dividendo, e qualidade que também são conhecidas. “Elas são definidas por empresas lucrativas, com balanço sólido. Há também estratégias de índices com altos dividendos e índices fatoriais”. Ela citou a estratégias multiativos, com índices baseados em regras com ajuste dinâmico ou com carteiras diversificadas. “Na primeira, há controle de risco, e o objetivo principal é obter uma exposição a um mercado, tema ou estratégia específicos enquanto se procura um nível de risco objetivo. Há ainda dois tipos de controle de risco, um que aloca dinamicamente entre capital e dinheiro e outro em capital, dinheiro e dívida”, disse.

Com foco na diversificação, há ainda uma estratégia baseada em futuros, títulos e ações. “Os futuros de renda variável têm controle de risco, enquanto os futuros de títulos de dívida não”. Além das estratégias defensivas, uma questão em destaque no Brasil e outros países do mundo são as estratégias ASGI. Maria destacou, nesse sentido, o índice S&P Brasil ESG, que exclui ações com base no engajamento das companhias em atividades comerciais específicas, e de acordo com princípios globais ou de empresas sem ações ESG. “Há uma variedade de estratégias defensivas com diferentes níveis de eficácia utilizados. A incorporação de princípios ASGI nos processos de investimento é cada vez mais relevante”, complementou.

Retomada – O Head da Gestão de Multimercados, Ações e Offshore da BB DTVM, Marcelo Arnosti, apresentou uma visão sobre o que é visualizado para os próximos anos. “Na nossa interpretação, a economia global está passando por um período recessivo, iniciando uma retomada apoiada pelo impulso fiscal e monetário dos governos, além da possível disponibilidade de vacinas no ano que vem, formando-se um contexto positivo do ponto de vista de ciclos de negócios”, disse.

Para ele, há perspectivas favoráveis para a retomada do ciclo de crescimento para a economia mundial com a previsão favorável para a vacina, taxas de juros próximas de 0%, e alta liquidez de ativos. Segundo Arnosti, as eleições americanas não parecem oferecer maior risco para o processo de recuperação econômica. “O que mais pode preocupar neste contexto é o aumento das tensões comerciais e políticas entre EUA e China, mas maior risco para a retomada do crescimento global é a hipótese de falha nas vacinas”, pontuou.

No cenário doméstico, o cenário é mais complexo e apresenta maior risco que a tendência global. Mesmo assim, o gestor classificou as perspectivas como relativamente positivas para a economia brasileira. “Em 2020, está ocorrendo uma retomada com um ritmo interessante. A pandemia está cedendo, ainda que lentamente, e a recuperação está ocorrendo em diversos setores, ainda que de maneira desigual”. Arnosti pontuou que o terceiro trimestre registrou uma taxa de expansão interessante, e o quarto trimestre deve desacelerar. “Porém o resultado do PIB será melhor que o esperado no início da pandemia”. A BB DTVM está prevendo uma queda de 5% para o PIB em 2020. Arnosti reiterou que o pior já passou e foi superado com a ajuda das políticas monetárias e de auxílio emergencial.

A incerteza, porém, aumenta para os cenários de 2021 e dos próximos anos em decorrência do ajuste fiscal. Segundo Arnosti, os gastos públicos tiveram elevado incremento neste ano, e a relação dívida e PIB veio se deteriorando. Neste sentido, o principal debate que está tomando os mercados gira em torno da manutenção do teto de gastos. Com base em análises e projeções de consultorias políticas, o gestor da BB DTVM acredita que haverá uma solução negociada entre governo e Congresso Nacional para a manutenção do teto. “Isso será possível com a proposta e aprovação de uma minirreforma fiscal com a utilização de alguns gatilhos para manter os gastos obrigatórios. A solução deve ser capaz de segurar o teto para o próximo ano e para os seguintes”.

Prêmios de risco– Se a previsão for acertada, os prêmios de risco dos ativos do mercado brasileiro devem ceder, pois haverá retomada do crescimento mais consistente para os próximos anos. A previsão da BB DTVM é de crescimento de 3% do PIB para 2021. “A perspectiva mais favorável para a economia doméstica será ajudada também pelo crescimento global mais positivo, e a pressão inflacionária deve continuar sem gerar maiores preocupações”, disse Arnosti. Apesar da pressão dos preços do atacado, o especialista acredita que ela não será repassada para o varejo. “Com isso, o Banco Central terá condições de manter a Selic nos atuais 2% por bastante tempo”, analisou.

Neste contexto, há oportunidades interessantes nos ativos de crédito privado, que estão pagando prêmios elevados neste momento. Arnosti citou ainda as oportunidades em bolsa,  também interessantes para os investidores neste momento. “A previsão é que o Ibovespa alcance o patamar de 120 mil pontos no segundo semestre do ano que vem. Em direção contrária, o dólar deve se desvalorizar ante o real e fechar em R$ 5 no final de 2020, e deve ceder ainda mais ao longo do ano que vem”. O gestor apontou boas oportunidades em setores como imobiliário e bancos, entre outros.

A melhoria dos indicadores deve vir com o alívio das tensões sobre a questão fiscal, mas Arnosti avaliou que os prêmios dos ativos refletem a preocupação com a manutenção do teto de gastos. “Se isso for endereçado pelo governo e Congresso, as perspectivas irão melhorar mais sensivelmente. Em todo caso, por conta dessas tensões, há oportunidades diversas nas alocações de risco neste momento”, complementou.

Perspectiva positiva – Ao comentar as apresentações anteriores, Marcelo Otávio Wagner disse que concorda que existe uma trajetória de forte recuperação da economia global, mas ponderou que esse movimento não ocorre de maneira uniforme. “É uma recuperação bastante desigual em termos de geografia e de setores. Por isso, é necessário tomar cuidado na montagem de portfólios globais”. Ele destacou a importância da escolha das classes de ativos na alocação estratégica.

O Diretor da Previ demonstrou interesse pela utilização de índices de gestão, que podem ser combinados entre si, como se fossem peças de um lego, e ressaltou a importância da estratégia ASG, que podem ser acessadas através de índices de gestão passiva. Wagner analisou ainda que as curvas das taxas de juros mais longas estão muito abertas e prevê que ocorrerá um fechamento das curvas ao mesmo tempo em que haverá uma apreciação do real ante o dólar. “A questão cambial é importante na hora de definir a alocação em ativos no exterior”, pontuou.

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