Entrevista: Análise de Impacto minimiza excesso de regulação na Previdência Complementar

Flavio Martins Rodrigues

Em entrevista exclusiva ao Blog Abrapp em Foco, o Advogado Flávio Martins Rodrigues, Sócio do Escritório Bocater, Camargo, Costa e Silva, Rodrigues, comenta as regras da Análise de Impacto Regulatório (AIR) para os órgãos da administração pública federal. A exigência da análise foi criada pela Lei de Liberdade Econômica (Lei n. 13.874/2019) e regulamentada recentemente pelo Decreto n. 10.411, de 30 de julho de 2020.

De forma resumida, a “edição, a alteração ou a revogação de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos” deverá ser “precedida de AIR”, que conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos do ato normativo para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico, explica o especialista. A exigência começa a valer a partir de 15 de abril de 2021. Flávio Martins comenta os efeitos da nova regra para o setor de Previdência Complementar Fechada. Leia a entrevista a seguir na íntegra:

Blog Abrapp em Foco – Qual a função da Análise de Impacto Regulatório definido pela Lei de Liberdade Econômica e regulamentado pelo Decreto n. 10.411/2020?
Flávio Martins Rodrigues – Vamos voltar um pouco para trás para passar alguns conceitos. O Poder Público tem a competência para regular determinados segmentos. A Anvisa, por exemplo, regula o segmento de medicamentos. O laboratório produz o remédio e o médico receita para seus pacientes. É a regulação de uma atividade privada. Há o interesse público de que esse medicamento seja testado, que não tenha efeitos indesejados e desconhecidos, etc. Mesmo nas relações privadas, o governo tem a competência de intervir para assegurar o bom funcionamento. Modernamente essa intervenção é chamada de regulação, que é diferente da regulamentação.

Blog – Qual é a diferença?
Flávio Martins – A regulamentação é feita normalmente por um decreto do Presidente da República. Vamos dar o exemplo da carteira de motorista, que os cidadãos podem tirar a partir dos 18 anos de idade, mediante realização de prova nos Detrans, para poderem dirigir. A regulação é o estado intervindo no mercado econômico privado para dizer como tem de se organizar porque tem um interesse coletivo envolvido. Contudo, percebeu-se que a regulação pode ser exagerada. Quando a “dose” da regulação pode matar ou comprometer o funcionamento do mercado.

Blog – Como esse excesso de regulação atrapalha o setor de Previdência Complementar?
Flávio Martins – A regulação excessiva gera um ambiente mais complexo, mais difícil de se cumprir as exigências. Tende a ser mais custoso, tem de criar áreas específicas nas entidades, com pessoas, com maior custo. Tende a se tornar um ambiente menos amigável para o patrocinador e empregador criar um novo plano. E tem ainda outro problema, que há um desequilíbrio regulatório entre o segmento fechado e aberto. Este último é menos regulado. Isso tende a gerar maior crescimento da Previdência Aberta e estagnação da Previdência Fechada.

Blog – Como a exigência da Análise de Impacto ajuda a minimizar o problema do excesso de regulação?
Flávio Martins – Antes do estado regular uma matéria, ele terá de fazer uma análise de impacto para verificar se a regulação é positiva. Ou se ela cria uma burocracia ou embaraço que não é positiva, por exemplo, limitando a participação de agentes econômicos. Para o consumidor, é bom que haja a participação de diversos agentes econômicos. Se vier uma regra que limita essa participação, isso não é bom para o consumidor. Então, a Lei da Liberdade Econômica, a Lei n. 13.874/2019, disse que é preciso realizar uma Análise de Impacto Regulatório antes do Estado Federal lançar uma nova regulação sobre determinado assunto.

Blog – Como a nova regra afetará a Previdência Complementar Fechada?
Flávio Martins – Nós sabemos que o ambiente da Previdência Complementar funciona com a acumulação e gestão de recursos durante muitos anos para pagamento de benefícios para quando as pessoas estiverem idosas, que envolvem invalidez e morte, então é um ambiente bastante regulado. Nossa análise é que o setor sofre de uma espécie de excesso de regulação. Quando veio a regra da exigência da análise, vimos que o Conselho Nacional de Previdência Complementar, o Conselho Monetário Nacional e mesmo a Previc, que também têm residualmente um poder regulador, deverão seguir essa nova regra.

Blog – Todos os órgãos do Poder Público deverão realizar a Análise de Impacto?
Flávio Martins – O Decreto n. 10.411 definiu o funcionamento e aplicação da Análise de Impacto Regulatório e segregou em três segmentos de regulação. Um deles é o que sempre terá de realizar a Análise de Impacto. O outro poderá ter ou não a Análise e o último que não terá o mecanismo. O setor de Previdência Complementar ficou no segmento intermediário que poderá ter a Análise de Impacto Regulatório ou poderá ser dispensada. Para dispensar essa exigência, o órgão regulador, por exemplo, o CNPC terá justificar porque não foi necessário realizar a análise prévia de impacto.

Blog – Como funcionará essa justificativa?
Flávio Martins – Essa faculdade não é um exercício discricionário do regulador, simplesmente porque não quer fazer. Será necessário ter uma efetiva justificação da dispensa. E isso é um avanço. Todas as novas normas da Previdência Complementar ou terão a Análise de Impacto ou terão uma justificativa porque não tiveram. Isso fará com que o regulador pondere a respeito das consequências de sua regulação. Um ponto importante é que a análise não representa, na nossa visão, um embaraço para a administração pública, mas sim, se constitui uma medida de governança para que o órgão regulador seja mais ponderado na regulação de uma atividade econômica privada.

Blog – Mas partindo da análise que existe um excesso de regulação, não seria melhor que a Análise fosse obrigatória em todos os casos?
Flávio Martins – Sim, na nossa visão, seria melhor que a Análise fosse obrigatória em todos os casos. Nosso setor deveria estar no primeiro grupo. Isso porque a Previdência Complementar no Brasil é facultativa. Não é como na Suíça, Austrália ou Inglaterra onde a Previdência complementar é obrigatória. Aqui se o empregador identificar que existe muita regulação, que é muito difícil de se criar um plano de benefícios, ele não vai fazer. Pode tender a não oferecer. A regulação em um ambiente facultativo deveria ser sempre precedido da análise. Mas o fato de ter de realizar a análise ou apresentar a justificativa, já é um avanço importante.

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