Entrevista: Gestão ativa versus alocação passiva em cenário de juros altos

Nathan Batista

Em um cenário que aponta para a manutenção das taxas de juros em patamares elevados para 2023, o que faz mais sentido, a alocação em fundos ativos de renda variável ou estratégias de gestão passiva? A resposta não é simples e depende de diversos fatores, inclusive a disponibilidade de liquidez e o apetite a risco de cada plano de benefícios, explica Nathan Batista, Sócio Consultor da Aditus, em entrevista ao Blog Abrapp em Foco.

Em todo caso, com os juros mais elevados, a gestão ativa costuma sofrer impacto negativo mais forte. Por isso, o consultor recomenda a manutenção de um balanceamento entre os fundos ativos e as estratégias passivas – que incluem os fundos com aderência plena ao Ibovespa ou ETFs (Exchange Traded Funds). Confira a seguir a entrevista na íntegra:

Blog Abrapp em Foco: A gestão ativa consegue bater a gestão passiva na renda variável?

Nathan Batista: Sim, a gestão ativa de renda variável pode bater a gestão passiva, mas isso acontece com mais frequência quando consideramos janelas de tempo mais dilatadas. Estamos falando de intervalos maiores de 5 ou até 10 anos. Nesses intervalos, vemos maior consistência na gestão ativa. Em janelas menores de 2 ou 3 anos, já não verificamos a mesma consistência.

Blog: E por que isso acontece?

Nathan: Temos algumas explicações para isso. É até possível bater a gestão passiva em janelas menores, mas a frequência é menor. A principal razão é simples. O Brasil é um país onde a renda fixa imperou até dez anos atrás. Se considerarmos 20 anos atrás, mais ainda. As taxas eram muito altas. E agora tudo indica que as taxas de juros irão continuar altas.

Blog: Qual o cenário para o próximo ano?

Nathan: Se tomarmos os indicadores de descontrole fiscal da emenda do “fura teto”, o mercado continuará demandando de juros altos para o ano que vem. A PEC do descontrole fiscal deve pressionar para a manutenção dos juros em alta. Nesse cenário, os ativos de risco costumam sofrer mais. E os fundos ativos também sofrem bastante.

Blog: Por que os fundos ativos são mais afetados negativamente com o cenário de juros altos?

Nathan: Vamos considerar os fundos ativos que têm estratégias que passam estratégias de valor, crescimento, middle e small caps; todas essas empresas são mais suscetíveis ao impacto de juros mais altos. Por exemplo, as empresas ligadas ao consumo discricionário sofrem mais com os juros mais altos com a inibição do acesso ao crediário. Outro exemplo: as empresas de middle cap costumam ter menos acesso às linhas de financiamento para tomar empréstimos. Em síntese, os juros altos inibem o desenvolvimento do mercado de capitais. No curto prazo, o choque dos instrumentos de política monetária impactam negativamente a renda variável.

Blog: As ações de empresas small e middle caps são as que sofrem mais?

Nathan: Sim, essas empresas não têm acesso a linhas de financiamento tão acessíveis, com spread mais baixo, se comparadas com as grandes companhias. Empresas como Petrobras e Vale têm muito mais opções de financiamento. A Vale, por exemplo, pode captar recursos lá fora com taxas mais acessíveis. Geralmente, as empresas médias não têm essa possibilidade. São empresas que, em geral, dependem mais da economia local. Também as ações de valor e crescimento acabam sofrendo com o ciclo de aperto monetário. Além disso, com os juros altos, ocorre a queda do fluxo de recursos para a Bolsa como um todo, afetando negativamente a renda variável.

Blog: Diante desse cenário, quais as recomendações para as fundações?

Nathan: Não é indicado se apoiar exclusivamente na Bolsa passiva, que depende do ciclo de commodities, mas também não dá pra ficar fora da exposição de empresas que têm potencial de crescimento, de valorização. A recomendação é adotar um mix das duas estratégias, ativa e passiva. Não há um número único, pode ser 50% a 50%, ou 60% a 40%, ou ainda 70% a 30%. Tem de olhar caso a caso, depende do plano de benefícios, se ele pode trabalhar com mais liquidez ou maior apetite a risco. Se a liquidez é mais apertada, se a aversão ao risco é maior, a tendência é manter alocação menor na gestão ativa.

Blog: E quais as desvantagens de manter uma alta alocação em fundos ativos?

Nathan: Em geral, a gestão ativa é mais cara. Via de regra são veículos mais caros. E isso é justo, porque precisam manter uma equipe de análise para a construção do portfólio. Mas o fator principal, é que não é recomendável ficar fora nem do movimento das commodities, nem dos fundos ativos que possam capturar valorização de determinadas empresas. Ou seja, nem apenas A e nem apenas B.

Blog: O que você tem verificado em relação à utilização da gestão passiva pelas fundações?

Nathan: A gestão passiva sempre existiu, mas ela está crescendo mais neste ano de 2022. Esse tipo de gestão cresceu mais nos últimos 12 meses por causa do boom das commodities. Vimos o preço do petróleo acelerando com o advento da guerra. Percebemos o aumento da demanda pelas commodities agrícolas e metálicas desde meados do ano passado. Como as commodities têm um peso grande em nossa Bolsa, verificamos um aumento da alocação na gestão passiva de renda variável.

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