Entrevista: Novo Procurador-Chefe da Previc analisa regulação da Previdência Complementar e defende arbitragem e mediação

Danilo Miranda

Em entrevista exclusiva ao Blog Abrapp em Foco, o novo Procurador-Chefe da Previc, Danilo Ribeiro Miranda Martins, aborda temas como o excesso de normas na regulação da Previdência Complementar Fechada e seu impacto para os custos de administração das entidades. 

Mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP e Especialista em Direito Previdenciário, Gestão Previdenciária e Previdência Complementar pelo UniCEUB, Danilo Miranda fala também das vantagens de utilização dos procedimentos de mediação e arbitragem na resolução de conflitos judiciais. 

Danilo Miranda atuou na Procuradoria Federal junto à Previc de 2010 a 2015 em diversos cargos, tendo sido um dos responsáveis pela implantação da CMCA-Previc. Atualmente é Diretor do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem – CONIMA e Diretor do Instituto Brasileiro de Previdência Complementar e Saúde Suplementar – IPCOM. Leia a entrevista na íntegra a seguir: 

Blog Abrapp em Foco:  Como analisa a situação do atual arcabouço regulatório da Previdência Complementar Fechada? Há um excesso de normas? Seria importante promover um processo de simplificação normativa para o setor?

Danilo Miranda: Tive a oportunidade de analisar academicamente a regulação da previdência complementar em meu mestrado em 2017. Minha dissertação teve como tema os limites e diretrizes para a intervenção do Estado na previdência privada, que acabou se transformando em um livro. Naquela época já apontava um excesso de normatização do mercado. Minha percepção é que a situação se agravou de lá para cá.

A LC nº 109/2001 foi expressa ao definir as matérias que podem ser objeto de regulação, com relação a aspectos eminentemente técnicos, o que nem sempre é observado. E a Lei nº 12.154/2009 é muito clara ao atribuir esse poder normativo primordialmente ao Conselho Nacional de Previdência Complementar. À Previc cabe supervisionar o cumprimento dessas normas, e não ficar criando novas obrigações.

Além disso, não vejo uma avaliação real do impacto de todas essas normas, apesar da exigência de análise do impacto regulatório. Em que todas essas normas resultaram? As entidades de previdência estão em uma situação melhor? Os participantes e assistidos se sentem mais protegidos? Na minha percepção, o aumento dos custos e da burocracia são evidentes, mas os benefícios não. Logo, a necessidade de revisão e simplificação é indiscutível.

Blog Abrapp em Foco: Quais suas principais prioridades como chefe da Procuradoria Geral da Previc?

Danilo Miranda: Primeiro precisamos compreender que as prioridades da Procuradoria não podem estar desconectadas das prioridades da Diretoria da Autarquia. O papel da Procuradoria é principalmente assessorar juridicamente a Diretoria e conferir segurança jurídica para suas decisões.

Nessa linha há uma série de entendimentos que precisam ser aprofundados e até revisitados, mas com a devida cautela. Precisamos compreender também que há uma série de interpretações que foram sendo construídas ao longo do tempo com uma perspectiva predominantemente jurídica. A orientação jurídica é importante, mas não é determinante. Há diversos aspectos e conceitos técnicos, atuariais e econômicos que também precisam ser ponderados.

Uma das ideias que estamos avaliando é o desenvolvimento de um Ementário que represente os entendimentos da Previc, debatido com as demais áreas. As diversas Diretorias e a Procuradoria Federal não podem ser vistos como departamentos estanques. É preciso evoluir para se construir entendimentos que representem a visão da Autarquia como um todo, e não apenas de setores isolados.

Precisamos melhorar também o mapeamento das ações judiciais de mais impacto e mais estratégicas para o sistema para que a Previc possa ter uma atuação mais assertiva nesses casos. De nada adianta melhorarmos o ambiente regulatório e as interpretações no âmbito da Previc se esses entendimentos forem desconstruídos depois no Judiciário.

Outra diretriz da Diretoria Colegiada é o fortalecimento da CMCA, que hoje está situada na Procuradoria Federal. É extremamente importante resolvermos o máximo possível de disputas no âmbito extrajudicial, de forma célere e em um ambiente especializado. Deve ir para o Judiciário apenas aquilo que realmente não tenha outra solução.

Blog Abrapp em Foco: Poderia comentar a importância da arbitragem, conciliação e mediação na resolução de conflitos na Previdência Complementar? Como esses mecanismos podem ser mais disseminados no setor?

Danilo Miranda: Os mecanismos adequados de solução de conflitos já são uma realidade no nosso sistema jurídico e em diversos setores. Com um Poder Judiciário cada vez mais abarrotado de processos, as disputas que são levadas para esse ambiente tendem a levar cada vez mais tempo para serem resolvidas. Além disso, lidando com inúmeras matérias, dificilmente o Juiz terá condições de se aprofundar o suficiente no estudo da legislação, que é bastante complexa. Por isso a mediação e a arbitragem têm se apresentado cada vez mais como uma opção real.

As razões por que esses mecanismos não se desenvolveram mais no nosso setor são diversas. Uma delas é a falta de conhecimento. É necessário se investir em mais ações de educação e eventos sobre o tema. Não só para os profissionais da área jurídica, mas também para os gestores, que acabam sendo impactados pelas questões jurídicas. Precisamos deixar de achar que a resolução de disputas é uma questão só dos advogados. Não é, pois impactam na vida de todos.

Mas há outras ações concretas que poderiam acelerar o desenvolvimento desses mecanismos. Considero um erro, por exemplo, que até hoje a imensa maioria dos Convênios de Adesão ainda preveja cláusula de foro judicial.

Ora, em uma eventual disputa entre uma entidade e a empresa patrocinadora é evidente que o ideal é a solução no âmbito extrajudicial, mais propícia para manutenção das relações e solução rápida da disputa, buscando preservar o plano de benefícios, o que se faz geralmente por meio da inserção de uma cláusula med-arb. Qual a vantagem de se prever que, nessas disputas, a primeira opção seja o Judiciário? Pessoalmente não vejo nenhuma.

Blog Abrapp em Foco: Por favor, comente a importância da CMCA – Câmara de Mediação, Conciliação e Arbitragem na resolução dos conflitos.

Danilo Miranda: Fui um dos responsáveis pela implementação da CMCA-Previc em 2010 e, depois, da sua reformulação em 2014, tendo atuado na Câmara até 2015. Na época percebíamos que havia muita resistência e falta de compreensão sobre o papel da CMCA.

Tem sido interessante constatar, retornando à Previc cerca de sete anos depois, como esse cenário se alterou. Hoje a CMCA é vista como um órgão importante e respeitado, dentro e fora da PREVIC, tendo contribuído para a solução de muitos casos complexos, prestando um serviço extremamente relevante para o sistema.

Mas acredito que é possível darmos um novo salto neste momento nessa atuação, o que passa por uma maior profissionalização da CMCA. Precisamos dotar a Câmara de uma melhor estrutura para dar conta da demanda crescente e investir mais na capacitação dos seus membros.

Precisamos refletir também sobre a necessidade de se exigir capacitação específica para aqueles que querem atuar como mediadores. A mediação envolve técnicas sofisticadas, necessárias para quem vai lidar com conflitos complexos. Não envolve conhecimentos meramente jurídicos.

Outro aspecto que também merece uma maior reflexão, no atual estágio, é o fato de ainda não haver previsão de remuneração para os membros da CMCA que não são servidores públicos. Do contrário dificilmente conseguiremos manter os melhores profissionais, que certamente não irão desenvolver esse trabalho “pro bono” eternamente. Entendo que o serviço gratuito só deve ser mantido, a princípio, para aqueles casos em que realmente não for possível a remuneração.

De toda forma, o mais importante é que o sistema se envolva ativamente nessa discussão. Afinal, são as entidades de previdência, as empresas patrocinadoras e os participantes e assistidos os destinatários finais deste serviço.

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