Em vigor desde 11 de janeiro, a Lei nº 14.803/2024, que permite aos participantes de planos de previdência complementar optarem pelo regime de tributação por ocasião da obtenção do benefício ou do primeiro resgate dos valores acumulados, é um marco para o setor, mas também vem acompanhada de preocupações com adequações necessárias a serem feitas.
Para auxiliar as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) nessas adequações e na melhor forma de comunicar os seus participantes sobre os principais pontos da nova legislação, a Abrapp realizou, na segunda-feira, 15 de janeiro, o webinar “Regimes tributários e novo momento de opção”.
O evento visou explorar e compreender as implicações dos regimes tributários progressivo e regressivo nos planos de benefícios, fornecendo insights para os profissionais do setor. “Essa é uma medida fundamental para o nosso crescimento e para o nosso objetivo, que é melhorar a vida do indivíduo, pagar benefícios, investir com segurança e transparência”, disse o Diretor-Presidente da Abrapp, Jarbas Antonio de Biagi, na abertura do webinar.
Ele ressaltou que até essa conquista, houve o trabalho e empenho da Abrapp junto a diversos agentes do setor, com apoio da Assessoria Parlamentar da Abrapp para que, no Congresso Nacional, fossem discutidos projetos que beneficiassem o fomento da Previdência Complementar Fechada através do tratamento dessas questões.
Em alinhamento com o Senador Paulo Paim (PT-RS), autor do Projeto de Lei nº 5.503/2019, a pauta sobre a opção tributária evoluiu dentro do parlamento, o que culminou na atual legislação. Jarbas de Biagi reiterou, durante o webinar, o agradecimento a todos que contribuíram para a aprovação do projeto e publicação da lei.
“Foi uma junção de esforços para que isso ocorresse. Agora, estamos conversando com a Previc e a Receita Federal para afinar as questões pontuais por meio de normas complementares”, disse.
O Secretário Executivo do Colégio de Coordenadores das Comissões de Assuntos Jurídicos da Abrapp, Luiz Fernando Brum, enalteceu o trabalho da Abrapp no Congresso Nacional, que inclui a atuação proativa, apoiando, subsidiando e apresentando propostas, buscando o fomento do segmento, mas também esclarecendo os parlamentares sobre projetos que poderiam causar algum dano ao setor.
“É justamente nessa vertente de fomento que se enquadra o então PL nº 5.503/2019, que foi convertido na Lei nº 14.803/2024. Essa é uma bandeira antiga do nosso setor, e apenas uma das várias propostas tributárias apresentadas no Congresso Nacional”, reforçou Brum.
Análise jurídica – Tratando das mudanças trazidas pela lei, Brum destacou que até então se exigia a opção pelo regime tributário no mês subsequente à inscrição do participante no plano de benefícios, o que, além de dificultar a adesão, impunha prejuízo por alguma escolha equivocada.
“Ao permitir que essa opção se faça no momento do recebimento do benefício ou resgate, a legislação vem sanar essa dificuldade que até então a gente vivia”, disse, alertando, contudo, que há preocupações com algumas adequações que devem ser realizadas.
A Consultora Jurídica da Abrapp, Patrícia Linhares, esclareceu quais seriam esses pontos de alerta a partir de uma análise da legislação. “Existem alguns impactos para assistidos e participantes na mudança da escolha que podem ser destacados em simuladores, avisos e informes”, disse.
Dando o contexto da tributação, Linhares explicou que desde 1995, há o tratamento tributário do diferimento fiscal que permite a dedução dos valores aportados aos planos, mas a tributação sempre ocorre no momento da saída do plano. “A tributação no momento do resgate teve sua manutenção praticamente integral após a lei”, reiterou, explicando em seguida como funciona cada regime de tributação sobre esses rendimentos.
No regime progressivo, o imposto retido sobre pagamento de rendimentos é ajustado na declaração a partir da soma dos outros rendimentos quando do recebimento da renda da previdência complementar. Já no regime regressivo, há uma alíquota máxima de 35%, sendo reduzido 5% a cada dois anos, até chegar na alíquota mínima de 10%, e o imposto é retido na fonte, a contar de cada contribuição.
“As entidades devem ter atenção ao identificar quais são os participantes que podem fazer a opção”, alertou Linhares, ressaltando que há uma discussão mais forte sobre o parágrafo 8º da lei, que diz:
Caso os participantes não tenham exercido a opção pelo novo regime tributário de que trata este artigo, poderão os assistidos, os beneficiários ou seus representantes legais fazê-lo, desde que atendidos os requisitos necessários para a obtenção do benefício ou do resgate.
A dúvida no texto é se o assistido pode optar pelo regime antes da obtenção do benefício. Para esclarecer sua visão, Linhares relembrou que a Lei nº 11.196/2005, que institui o Regime Especial de Tributação, trouxe o art. 95, fala que:
na hipótese de pagamento de benefício não programado oferecido em planos de benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, após a opção do participante pelo regime de tributação de que trata o art. 1º da Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004, incidirá imposto de renda à alíquota de 25%, quando o prazo de acumulação for inferior ou igual a 6 anos.
“O prazo de acumulação continua a ser contado após o pagamento da primeira prestação do benefício”, reiterou a consultora, esclarecendo, contudo, que os assistidos podem optar pelo regime não apenas no momento do requerimento do benefício seguindo a interpretação de outras legislações.
Segundo Linhares, se a Lei Complementar nº 109 prevê que assistido é quem está em gozo do benefício de prestação continuada. “Toda vez que a lei tributária falar em assistido, é obrigatório, pelo Código Tributário Nacional, usar essa interpretação. E a Constituição Federal tem princípio da igualdade tributária, ou seja, nenhuma lei propriamente tributária poderá instituir um tratamento desigual entre situações equivalentes”, destacou.
A consultora jurídica esclareceu outros pontos de mudança da lei, como o artigo 2º, que permite que os participantes que fizeram a opção pelo regime de tributação possam exercer novamente a opção até o momento da obtenção do benefício ou da requisição do primeiro resgate.
Além disso, participantes ativos com adesão ao plano antes da data do vigor da lei, ou seja, 11 de janeiro de 2024, podem optar pelo regime tributário até o recebimento do benefício ou resgate independente da opção que tenha feito quando do ingresso do plano. “Os que aderirem ao plano após a referida data devem ter atenção, pois a escolha é definitiva, e o regime progressivo vira padrão até o benefício ou resgate”, alertou Linhares.
Ela também pontuou que quando houver uma opção pelo regressivo para participante fruto de portabilidade de plano, a entidade precisa ter o histórico desse participante para ter condições de contar esse prazo de acumulação. Em caso de opção pelo regime regressivo após a portabilidade, há dúvidas sobre qual o prazo de acumulação a ser olhado, reiterou a consultora. “A instrução normativa sobre esse assunto precisa ser atualizada”.
Impactos operacionais – Gelson Felix, Gerente de Seguridade da Valia, realizou a apresentação sobre os “Reflexos Operacionais da Lei nº 14.083/2024” sobre o gerenciamento dos planos e o pagamento dos benefícios.
Ele esclareceu que a nova legislação trouxe um “ganho fenomenal para o sistema” e que representou uma conquista capitaneada pela Abrapp, que reivindicava a mudança desde o advento da Lei 11.053 de 2005.
O especialista acredita que a nova regra representa uma vantagem muito importante que será capaz de atrair novos públicos para o sistema de Previdência Complementar.
A despeito do enorme avanço da nova legislação, a complexidade do impacto operacional sobre as EFPC também é muito grande. “Está sendo muito trabalhoso. Independente disso, a nova regra representa um avanço muito importante”, comentou Gelson Félix.
Confira a seguir os principais pontos de impacto elencados pelo Gerente da Valia provenientes da Lei nº 14.803/2024:
1 – A entidade deve “desligar” a opção pelo regime tributário no momento da adesão. Deve dar uma pequena explicação sobre o assunto sobre as implicações em caso de portabilidade.
2 – Deve ocorrer uma adequação do cadastro para aqueles que já têm a opção para permitir a visualização do histórico anterior. Esse ponto é importante para os momentos de resgate, portabilidade, etc.
3 – A comunicação conta com uma janela muito mais longa para ser trabalhada através das ações de educação financeira e previdenciária desde o momento de adesão até o momento de aposentadoria ou de resgate. Deve ocorrer uma revisão de todos os conteúdos de comunicação que estavam focados para a opção no momento de adesão. Os materiais e ações de comunicação devem levar a nova Lei nº 14.803/2024 para os que estão solicitando resgate ou benefício para subsidiar uma tomada de decisão mais embasada e mais segura.
4 – Promover a adaptação do simulador de benefícios. Isso deve ser feito de maneira rápida, pois a demanda está começando a chegar. O simulador deve ser uma ferramenta muito ágil para o participante e para a entidade.
5 – Deve ser criada uma nova ferramenta de comparação para o resgate para mostrar se o resultado da tabela progressiva é vantajoso em comparação com a regressiva.
6 – Adaptar a concessão de benefício ou resgate em relação às portabilidades anteriores. Deve constar a indicação de escolha de regime tributário definido em outra entidade. Entende-se que a nova indicação irá abarcar toda a reserva, incluindo todas as portabilidades anteriores.
7 – O abatimento de empréstimo, dentro de uma portabilidade, caracteriza-se como resgate. Por isso, é preciso pedir ao participante que faça a opção pelo regime tributário. Também é preciso adaptar o processo de empréstimo em casos de inadimplência.
8 – É necessário transitar todas as portabilidades com as informações da data das contribuições.
9 – Os beneficiários de participantes falecidos em atividade deverão se manifestar no momento da solicitação do benefício ou resgate. Existe maior complexidade no caso de vários beneficiários que podem realizar opções diferenciadas.
10 – Preparar documento para disponibilizar ao participante que queira se pronunciar antes do momento de resgate ou benefício – ainda que isso não seja recomendável.
11 – Preparar uma ferramenta para análise dos assistidos que atualmente estão na tabela progressiva. Preparar documento para esta manifestação. Realizar o registro do cadastro.
12 – Alterar verbas de pagamentos e de tributação bem como os controles de saldo.
Após as apresentações, os palestrantes responderam às dezenas de questões enviadas e reencaminhadas pelo moderador, Luiz Brum, na parte final do webinar. Clique aqui para assistir na íntegra.
(Com a colaboração de Alexandre Sammogini)