Mesmo em ano difícil, EFPCs aproveitam oportunidades para imunizar carteiras de planos

Guilherme Benites Aditus

O desempenho do mercado financeiro em 2021, sobretudo dos ativos de risco como as ações da Bolsa doméstica, não favoreceu o resultado dos planos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC). O Ibovespa caiu quase 12% no ano passado e o novo ciclo de alta dos juros acentuado no segundo semestre, não chegou a salvar o ano, que terminou com muitos planos abaixo de suas metas atuariais. Contudo, a abertura das taxas dos títulos públicos, principalmente das NTN-Bs em todos os prazos de vencimento, ofereceu uma excelente oportunidade, que foi aproveitada pelos gestores, para ampliar a imunização dos passivos de diversos planos da modalidade de benefício definido.

“Vivemos um período excepcional, com uma oscilação muito aguda no ano passado. Temos convicção que é uma crise conjuntural e que, provavelmente, teremos uma importante recuperação em 2022”, diz Luís Ricardo Martins, Diretor-Presidente da Abrapp. Além do fraco desempenho da Bolsa e ativos de risco em geral, outro fator que prejudicou o desempenho dos planos foi a aceleração da pressão inflacionária.

O Sócio Consultor da Aditus, Guilherme Benites (foto no topo) explica que 2021 foi um ano desafiador, em que poucas entidades conseguiram bater as metas de seus planos. “São duas as explicações básicas: a Bolsa teve um ano complicado e houve um aumento excessivo da inflação”, diz o consultor. Ele destaca que a inflação registrou um aumento muito maior que o esperado, superando todas as previsões anteriores. O INPC fechou em 10,06% e o IGP-M, em 17,78%.

Com isso, a rentabilidade média dos ativos das EFPC, segundo dados da Aditus, ficou em 8%, bem distante da média das metas atuariais, que ficou em 15%. O levantamento leva em consideração os ativos de 119 EFPC, que correspondem a R$ 266 bilhões.

Oportunidades – Nem tudo foi dificuldade em 2021. Um dos elementos que se apresentou com uma grande janela de oportunidades foi a abertura das taxas dos títulos públicos, favorecendo a aquisição principalmente das NTN-Bs para a ampliação das carteiras de ativos marcados na curva (a vencimento). “Foi um movimento que começou a ficar mais intenso a partir de agosto, da compra de títulos indexados à inflação e que continuou até o final do ano. Acredito que ainda continue neste início de 2022”, analisa Guilherme Benites.

O consultor explica que ocorreu um feito muito raro, que foi a abertura constante das taxas em todos os pontos da curva, ou seja, tanto nos títulos mais curtos, nos médios e naqueles com vencimentos mais longos. Geralmente, a abertura é mais acentuada nos títulos com vencimentos mais longos. “Vimos uma grande oportunidade de aquisição com títulos intermediários, com duration de 10 a 12 anos, muito adequada aos passivos de muitos planos. Há muito tempo não aparecia uma oportunidade tão boa”, aponta o consultor.

Caso da Valia – Um exemplo de entidade que aproveitou a oportunidade oferecida pela abertura das taxas das NTN-Bs foi a Valia. A fundação realizou aquisições de NTN-Bs com diversos vencimentos no segundo semestre do ano passado. “Resgatamos da renda variável e do CDI para aproveitar a oportunidade surgida a partir da reabertura das taxas de juros. Fazia muito tempo que não aparecia uma alternativa tão interessante de títulos com prêmios acima das metas dos planos”, diz Maurício Wanderley, Diretor de Investimentos da Valia.

Os títulos foram adquiridos para vários planos da entidade, com ênfase para aqueles com compromissos de benefício definido. Os planos que mais se beneficiaram com a imunização, ou seja, com o casamento dos títulos com o passivo, foram o Vale Mais BP e o Mosaic BP. Este último alcançou o nível de 100% de imunização. “Compramos títulos com prazos adequados para casar com o duration dos passivos. A abertura das taxas para os títulos com prazos intermediários foi ao encontro das necessidades dos passivos”, comenta Maurício.

O Diretor de Investimentos da Valia destaca também que o maior plano da entidade, o Plano BD, que representa R$ 12 bilhões de patrimônio, já apresentava alto nível de imunização. E foi um dos planos que conseguiu bater a meta atuarial no ano passado, com retorno de 17,4% dos ativos. A meta atuarial desse plano registrou 15,3% em 2021. A rentabilidade consolidada da Valia ficou em 12,4%, sendo que os resultados mais baixos ficaram com os planos de contribuição variável (CV) e contribuição definida (CD).

Tipos de planos – A Diretora da Área Atuarial da Luz Soluções Financeiras, Sara Marques, explica que o desempenho dos planos variou bastante de acordo às modalidades e perfis, no caso daqueles que oferecem a opção de escolha ao participante. Em geral, os planos de benefício definido alcançaram melhores resultados, pois geralmente são mais maduros e possuem alta concentração em carteiras ALM.

Já os planos de contribuição definida foram os que mais sofreram, sobretudo, aqueles que entraram o ano passado com maior exposição aos ativos de risco. O aumento da concentração em ativos de risco era muito normal, pois as taxas de juros estavam muito reduzidas no início de 2021. “Os planos com posições mais conservadoras, sem dúvida, foram os que tiveram melhores resultados. Quem estava mais exposto ao risco, registrou mais perdas”, diz a consultora.

Quanto aos planos com perfis, os mais agressivos, obviamente, foram os que registraram resultados mais fracos. Já os perfis moderados, tiveram melhor desempenho aqueles que aproveitaram as bandas de alocação para migrar para ativos mais conservadores, explica Sara Marques.

Ela também coincide com a análise que a abertura dos títulos indexados ao IPCA representaram a grande janela de oportunidade do ano passado. “Era uma alternativa que estava fora do radar das fundações nos anos anteriores devido ao ciclo anterior de corte nos juros que perdurou durante a pandemia”, lembra a consultora.

Déficits – Os dados do ano de 2021 ainda não foram fechados e não há um valor exato do déficit dos planos no período. Mas prevendo uma ampliação dos déficits do sistema, a Abrapp tem dialogado com a Previc e membros do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) para propor a flexibilização do prazo para o equacionamento. A proposta central é promover a apuração dos resultados de 2021 junto com o desempenho de 2022. Desta forma, os possíveis equacionamentos de déficits do ano passado e desse ano ficarão para 2023 – leia mais.

“Estamos mantendo um diálogo muito produtivo com a Previc no sentido de congelar o equacionamento de déficit relacionado ao ano passado, para iniciar em 2023. Como a crise tem características conjunturais, prevemos que em 2022 as carteiras das entidades, que são sólidas e resilientes, terão um tempo para promover sua recuperação”, diz Luís Ricardo Martins, da Abrapp.

Guilherme Benites, da Aditus, defende que o pleito da Abrapp é bastante razoável, pois o ciclo de alta dos juros e a provável retomada da Bolsa devem gerar um ano de recuperação. “É um pleito [da Abrapp] importante porque garantiria um prazo adicional para que os planos voltem a bater suas metas”, comenta Benites.

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