Planos: Submassas requerem regulamentação adequada

A normatização da Resolução CNPC no 24/2016 – que reconheceu as submassas nos planos de benefícios – volta à agenda das entidades e do órgão regulador, em busca de uma Instrução Normativa a ser elaborada pela Previc. A expectativa é que o desenho dessa norma, que quatro anos depois da edição da Resolução ainda não foi materializada, venha finalmente disciplinar e padronizar a execução das submassas, eliminando riscos. “O tema foi debatido no Grupo de Trabalho Atuarial da Previc no mês de abril, em conexão com as
questões que tratam da solvência dos planos de Contribuição Variável (CV), informa o Diretor Institucional da Mercer, Antonio Fernando Gazzoni.

É preciso lembrar que os planos CV têm dois grandes grupos muito distintos de participantes, diz Gazzoni, um na fase de contribuição definida e outro na fase de renda vitalícia. “Isso pode causar insegurança jurídica porque a solvência desses planos está diretamente ligada ao tratamento dado às suas submassas.” Ele enfatiza que há planos com até três submassas distintas, sendo que uma delas pode registrar superávit enquanto outras apresentam déficit, por exemplo. Apesar da relevância do assunto, de abril para cá, a elaboração da IN não avançou.

De acordo com a regra aprovada em 2016, “entende-se por submassa um grupo de participantes ou assistidos vinculados a um plano de benefícios e que tenha identidade de direitos e obrigações homogêneos entre si, porém heterogêneos em relação aos demais participantes e assistidos do mesmo plano”. Esses grupos podem surgir em decorrência de alterações estatutárias e reorganizações societárias, entre outros fatos geradores. Depois de reconhecer a existência das submassas, os planos devem estabelecer controles, com segregação entre elas.

Padronização – A proposta de IN, que depois de concluída ainda terá que passar por audiência pública, deverá detalhar melhor o conteúdo da própria Resolução com o objetivo de refletir a realidade das informações dos planos de benefícios nas Demonstrações Atuariais. “O reconhecimento das submassas deverá estar claro dentro dos regulamentos dos planos”, explica Gazzoni. Além disso, elas deverão ser controladas pelos devidos órgãos estatutários das EFPCs, fazendo parte das Notas Explicativas às Demonstrações Contábeis, das Notas Técnicas Atuariais e do Relatório Anual de Informações (RAI).

A prática seguida hoje pelo órgão regulador exige que uma submassa deficitária seja equacionada e siga todos os controles, mas quando há superávit, falta um entendimento único sobre como tratá-lo. “Isso precisa ficar assentado; é importante que haja equidade no tratamento das diferentes situações”, assinala Gazzoni. Uma possibilidade é que, nos casos de submassa superavitária, a destinação seja vinculada à reserva especial, por exemplo.

Sem excessos – O sistema de Previdência complementar precisa dessa norma para reduzir a insegurança jurídica a partir de um tratamento homogêneo da solvência, reafirma Gazzoni. No entanto, deve-se evitar o excesso de detalhamento. “O que nós temos recomendado à Previc é que a IN não verticalize demais as diretrizes para as submassas porque os planos têm muita diferenciação entre si. O ideal seria ter apenas linhas gerais de comportamento para as entidades tratarem esses grupos.” Dizer o que deve ser feito, mas não como deve ser feito, é a fórmula ideal, acredita o consultor.

É possível ainda que seja necessário não apenas normatizar a Resolução CNPC no 24, como também instruir a Resolução CNPC no 30, de 10/10/2018, pondera. A Resolução no 30, vale lembrar, dispõe sobre as condições e procedimentos na utilização de superávit e equacionamento de déficit dos planos de benefícios.

“A IN da Previc sobre o tema terá que tratar das duas normas porque na Resolução no 30 não há regras específicas para os planos CV, que são submassas em si mesmos.” Isso leva a um vácuo normativo, fazendo com que cada EFPC trate da solvência do plano CV de forma distinta. Gazzoni não acredita, porém, que seja necessário submeter o assunto novamente ao CNPC, sendo suficiente uma IN única por parte da Previc.

Consequências – Diretor Presidente da Fundação Banrisul, Jorge Berzagui argumenta que a Resolução CNPC no 24 não foi um primor em relação à definição das submassas, o que significa que antes da edição de uma Instrução, seria preciso esclarecer melhor alguns aspectos da própria regra. “A regulação deixou muita coisa à interpretação de cada gestor, afirmando, por exemplo, que a submassa poderá – e não deverá – ser reconhecida.”

A IN precisaria estabelecer claramente também a quem compete, dentro da entidade, fazer esse reconhecimento. “Deve haver uma previsão explícita sobre essa competência, não basta saber que é um ato de gestão.” Berzagui considera importante esclarecer o que poderia acarretar o não cumprimento da norma, faltando, portanto, regulamentar o tratamento e os controles.

Outra dúvida é saber se o reconhecimento da submassa implicaria na criação de um subplano, ressalta o dirigente. “O ponto central é que a Resolução foi acanhada, não capturou todas as nuances, havendo dificuldade para visualizarmos as consequências do reconhecimento das submassas. Isso exigirá um amplo debate sobre a própria regulação antes que seja editada uma IN”, assinala Berzagui.

CNPJ por plano – O reconhecimento das submassas já é uma realidade na prática e, embora precise de melhor formatação jurídica, a verdade é que as entidades foram se ajustando às necessidades de segregação de ativos, custeio e responsabilidades. “Já fazemos avaliações considerando as submassas ou subplanos. Essas práticas fazem parte da organização do sistema, até porque sem isso não teria sido possível implementar mudanças nos planos”, pondera o Líder da área de Previdência da Willis Towers Watson,
Evandro Oliveira. De alguma forma, a indústria definiu padrões, sempre passando pelo olhar do regulador.

A falta de normatização preocupa, mas é ainda mais importante ter uma forma jurídica ou fiscal para que a segregação seja efetiva, o que virá apenas com a implantação do CNPJ por plano, prevista para 2021. “Do jeito que está, dependendo do nível de abertura contábil ou atuarial, já aparece tudo lá segregado. Quando olhamos para o todo, porém, ainda há uma mistura que só poderá ser resolvida com o carimbo do CNPJ”, diz Oliveira.

Além de normatizar a submassa, portanto, será fundamental separar efetivamente os ativos financeiros e os compromissos dos planos para evitar questionamentos sobre a quem pertence o patrimônio, o que é um risco enquanto estiver tudo dentro do mesmo CNPB – Cadastro Nacional de Planos de Benefícios. “O arcabouço para a segregação está construído, mas ela precisa ser legítima. O simples fato de o sistema buscar uma normatização mais assertiva para a total independência fiscal mostra que o modelo atual tem fragilidades sem o CNPJ por plano”, pontua.

A questão é que tudo isso implica em custos, tratamento distintos de investimentos, etc. “Não adianta carimbar só os passivos, também é preciso lidar com os ativos, e a diferença é muito grande na maneira de referenciar os planos, um aspecto que fica mais evidente nas entidades multipatrocinadas”, aponta Oliveira.

Embora a questão das submassas já não gere tanto ruído no mercado, o debate sobre o CNPJ voltou forte porque falta um posicionamento dos vários agentes do governo sobre sua operacionalização, opina o especialista. “É um tema de maior complexidade regulatória. Apesar de haver um prazo previsto, ainda restam dúvidas sobre como essa mudança será na prática.”

Reportagem publicada na edição de julho/agosto 2020 da Revista da Previdência Complementar – clique aqui para acessar a edição na íntegra.

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