Em julgamento realizado no último dia 8 de junho, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou uma decisão contrária ao pleito da Previdência Usiminas (antiga Femco) no caso que envolve participantes do plano da Cofavi – Companhia de Ferro e Aço de Vitória. Em um placar muito apertado, de 5 votos a 4, os ministros ratificaram uma decisão de 2015, que reconhecia o direito ao benefício vitalício para os assistidos antes da rescisão do contrato do patrocinador com a entidade. O caso envolve uma discussão sobre a ausência de solidariedade entre submassas de um mesmo plano e apresenta risco sistêmico para as demais entidades. Por isso, a Abrapp tem participado dos julgamentos na condição de amicus curiae.
“O julgamento decidiu sobre os embargos de divergência, no recurso especial 1.673.890, do Espírito Santo, nos quais se debatia a questão da submassa nos planos de benefícios, nos quais não há solidariedade entre as patrocinadoras”, explica Jarbas de Biagi, Diretor Executivo da Abrapp que acompanha o caso.
Cauã Resende, Sócio do Escritório JCM, explica que o recente julgamento da 2ª Seção do STJ era uma oportunidade para pacificar o entendimento do tribunal no sentido de evitar os riscos de utilização indevida dos recursos de uma submassa para pagar os benefícios de outro grupo que não constituiu as reservas para o custeio. Mas não foi o que aconteceu.
Apesar de reconhecer a ausência de solidariedade entre as submassas e de permitir a realização de provas de que os recursos não foram constituídos para o pagamento de tais benefícios, na prática, as execuções da Justiça têm afetado as reservas dos demais participantes do plano. A Previdência Usiminas tem enfrentado muitas dificuldades para realizar as provas de que os recursos não foram formados pelos assistidos da antiga Cofavi. O resultado é que até agora a Justiça já promoveu o bloqueio de R$ 279,4 milhões da entidade – desde o início do processo até o mês de maio de 2022.
Outra decisão de 2017, da 3ª Turma do STJ já tinha avançado no entendimento que os participantes da empresa falida teriam direito apenas ao direito acumulado – e não ao benefício vitalício. Mas o caso foi enviado novamente para a 2ª Seção, que promove a unificação dos Ministros da 3ª e 4ª Turmas, e a entidade acabou sofrendo a recente derrota agora. O acórdão da decisão ainda não foi publicado e, quando isso acontecer, os advogados deverão analisar quais são os recursos cabíveis para o caso. Em todo caso, a decisão não é vinculante para outras ações semelhantes que possam envolver outras entidades fechadas.
Entenda a decisão – “É um caso emblemático, tendo em vista que uma das patrocinadoras inadimpliu em relação a sua massa de participantes, e veio até a falir. E quando os recursos foram exauridos da parte dessa submassa, passou a discutir se o patrimônio do plano não teria que responder, ou seja, utilizar recursos de outra submassa, que mantinha a sua solvência”, explica Jarbas de Biagi.
O próprio convênio de adesão não previa solidariedade. A entidade tomou as providências em relação a cobrança das contribuições passadas em relação ao patrocinador insolvente. Esse assunto tramitou originariamente no estado do Espírito Santo, e depois chegou ao STJ. Dada a divergência entre os ministros na questão da interpretação da submassa e nesse caso concreto, foram interpostos os embargos de divergência.
“É claro que essa é uma situação em que se analisou o caso concreto, mas sem dúvida nenhuma isso traz uma insegurança sistêmica, porque nós temos muitos planos que tem somente um CNPB e tem várias patrocinadoras com submassas dentro daquele plano”, explica o Diretor da Abrapp.
Ele destaca que as normas que regulam esse tema estabelecem cálculos em separado, cálculos atuariais, custeio separado, massa de participantes separada, ou seja, há uma identidade em relação ao regulamento, mas não há uma comunhão de patrimônio de ativos dessas respectivas submassas.
“Então, a decisão traz uma preocupação, mas eu devo dizer que nós ainda não tivemos o acordão divulgado, estamos estudando para trabalhar no sentido de manter o que as normas disciplinam, tanto a Lei Complementar 109/2001 como também as resoluções atinentes, a contabilização, cálculos atuariais, custeio, controle de massas, controles individuais, nessas situações de submassa no plano de benefícios”, aponta Jarbas de Biagi.
Uma vez publicado o acórdão, serão tomadas medidas para defesa do sistema, a higidez de planos de benefícios e das respectivas submassas. “Essa decisão traz uma penalização para os participantes de uma submassa cuja patrocinadora é solvente. Ela atinge diretamente o direito também daqueles participantes”, diz o Diretor da Abrapp.
Ele expressa otimismo que o caso poderá ser revertido, para fazer prevalecer a segurança do sistema sem contágio de ativos de submassas daqueles planos de benefícios que contemplam essa hipótese. Além da Abrapp, o IBA (Instituto Brasileiro de Atuária) também figurou como amicus curiae do caso da Previdência Usiminas.
Histórico – Falida em 1996, os ex-empregados da Cofavi demandam aposentadorias vitalícias na Justiça. Vários dos participantes aposentados, que receberam benefício até março de 1996, quando os recursos disponíveis no fundo Cofavi acabaram, ingressaram com demandas judiciais contra a Femco, pleiteando o pagamento das complementações de aposentadorias de forma vitalícia, mesmo não tendo contribuído tempo suficiente para a formação da reserva garantidora.
“As contribuições foram realizadas por um curto período de tempo, de apenas 50 meses, entre 1986 e 1990. O que está em jogo neste julgamento é a segurança jurídica de quem investe no setor”, explica Cauã Resende.
O advogado conta que a Cofavi deixou de pagar as contribuições e a situação financeira do fundo foi comprometida. Com isso, os recursos para pagar os aposentados se exauriram em 1996. “A formação de reserva é uma condição básica para a concessão de benefícios na previdência complementar. Sem as contribuições, o sistema não pode funcionar”, defende Resende.
Cabe informar que os julgamentos também são acompanhados pelo escritório Tôrres, Corrêa e Oliveira, pela advogadas Ana Carolina Ribeiro de Oliveira e Lara Corrêa Bresciani, que assessoram a Abrapp nos casos que envolvem os Tribunais Superiores.