Saiba as razões para participantes caírem na malha fina da Receita Federal e como evitá-las

Existem vários fatores que podem levar os participantes das entidades fechadas de previdência complementar a caírem na malha fina da Receita Federal – termo utilizado quando são verificadas inconsistências na declaração do imposto de renda pessoa física (IRPF) e jurídica (IRPJ). A antecipação na adoção de medidas preventivas e agilidade para a correção do problema, uma vez que for identificado, podem poupar a entidade de dores de cabeça e até mesmo multas que seriam evitáveis.

Algumas vezes, a razão pode estar fora do controle da EFPC. Contudo, a atenção dedicada aos casos colabora para rápida resolução, como relata Adriana Belon, Diretora Superintendente da Previ-Siemens. “Em junho, nossos participantes sinalizaram que estavam com problemas nas declarações de imposto de renda, que ficaram retidas por divergência entre as informações que haviam declarado e as enviadas pela entidade de previdência. Quando eles alertaram sobre essa questão, a primeira coisa que fizemos foi verificar o que tínhamos enviado na DIRF (Declaração do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte)”, conta a dirigente.

O que inicialmente foi um apontamento feito por um ou dois participantes, logo cresceu em volume ao vários entrarem em contato com a entidade para relatar o mesmo problema na consulta ao status de suas declarações. “Trabalhamos com uma consultoria para o envio de informações aos órgãos federais. Logo entramos em contato e ela verificou que as informações do reporte estavam corretas, mas havia uma inconsistência dentro do próprio sistema da Receita Federal.  A consultoria enviou um e-mail para a Receita e o Fisco solicitou novo envio das informações. Dentro de pouco tempo, a situação foi regularizada”, relata a Diretora.

Segundo Adriana, o problema se deveu a uma falha no processamento dos arquivos e estava relacionado somente às contribuições adicionais de participantes feitas fora da folha de pagamento, que são reportadas na e-Financeira.

Mudança no formato de reporte – A e-Financeira utiliza a mesma tecnologia empregada no Sped e consiste em um conjunto de arquivos digitais referentes a cadastro, abertura, fechamento e demais operações financeiras de pessoas jurídicas.

O Módulo de Previdência Privada nas informações prestadas por meio da e-Financeira é uma obrigação acessória relativamente nova. Instituído em outubro de 2018, o módulo teve sua primeira entrega por meio do sistema em agosto de 2019.

Por sua novidade, o Módulo de Previdência Privada da e-Financeira tem gerado algumas dificuldades de preenchimento até por parte das entidades fechadas, explica a Consultora Tributária Patrícia Linhares, sócia do escritório Linhares & Advogados Associados.

O módulo substituiu uma obrigação refletida na Instrução Normativa da Receita Federal n. 1.452/2014, que já foi uma IN estabelecida para evitar problemas de tramitação das declarações e a retenção dos participantes na malha fiscal. “Estamos diante do processamento da primeira remessa de declarações à Receita Federal para cruzamento sem a IN RFB 1.452, mas com a e-Financeira”, explica a Consultora.

Patrícia chama a atenção também para eventuais equívocos no próprio preenchimento da e-Financeira por parte das entidades. “A e-Financeira é uma obrigação diferente da IN RFB 1.452. Na Instrução Normativa, havia um layout que era preenchido e encaminhado pelos formatos tradicionais à Receita Federal. Já a e-Financeira usa a tecnologia do ambiente do SPED. Então, ela demanda a abertura, o fechamento desses módulos e posteriormente o envio”.

“O que observamos é que a entidade às vezes abre o módulo, preenche, mas não fecha e nem encaminha. Ou se realiza a abertura e o fechamento, não faz a validação dos campos corretamente e por isso aparece para a Receita como se não tivesse sido feito o envio ou o envio está incompleto”, explica a Consultora.

Descompasso entre a DIRF e a e-Financeira – Outra falha comum, que não é propriamente um erro, está no descompasso da informação da DIRF da patrocinadora e da e-Financeira da entidade. Patrícia explica que, para fins de imposto de renda, todos os valores de contribuição para a previdência devem observar o efeito caixa. Ou seja, para fins de dedução, esse efeito deve ser considerado no momento em que há o custeio financeiro.

“Então, se o desconto na folha foi feito em dezembro, a contribuição deve ser considerada deduzida do imposto ainda naquele mesmo ano de competência. Mas, muitas vezes, a patrocinadora remete os recursos para a entidade de previdência no mês seguinte, que é janeiro, e daí decorre um efeito dissociativo envolvendo outro ano-calendário”, ressalta a Consultora. “Isso significa que o participante receberá no informe de rendimentos dele a dedução da contribuição em dezembro, quando ele foi impactado com o ônus financeiro, mas a entidade vai declarar que recebeu em janeiro – porque de fato só recebeu os recursos naquele mês”.

Para evitar essa situação, a Consultora sugere que as entidades mantenham alinhamento com suas patrocinadoras de modo que o repasse da arrecadação seja realizado no mesmo exercício em que os recursos são abatidos. “Os patrocinadores devem remeter os recursos para a entidade de previdência no mesmo ano, se possível em cada um dos respectivos meses, ou pelo menos até dezembro do mesmo ano em que houve o custeio financeiro daquelas contribuições dos participantes”.

Portabilidade de planos – Outro motivo que pode provocar a retenção de participantes na malha fiscal são os casos de portabilidade, migração ou transferência de gerenciamento dos planos. “Por isso, é muito importante que exista a correlação entre a data refletida nas informações da e-Financeira enviadas pela EFPC e a data em que a movimentação efetivamente aconteceu perante a Receita Federal, já que no caso de transferência de reservas para outra entidade, temos mudança no CNPJ declarante. Então isso também precisa estar refletido na e-Financeira”, observa Patrícia.

Inconsistência com o informe de rendimentos – Existem outras razões comuns para que um participante possa entrar na malha fina. Uma delas é o erro no preenchimento da própria declaração, em desacordo com os dados do informe de rendimentos. “Isso automaticamente gera uma alteração no processamento da declaração, já que a Receita Federal considera o cruzamento com a DIRF da entidade de previdência, no caso dos benefícios e resgates pagos”.

Patrícia esclarece que o informe de rendimentos é reflexo da DIRF que a empresa patrocinadora ou a entidade entregaram. “A companhia entrega a DIRF em relação aos seus empregados e isso também traz as contribuições para a previdência descontadas na folha de salário. E no caso das entidades, a DIRF dos assistidos, em relação ao desconto das contribuições dos assistidos vinculados ao plano de previdência”.

Contribuições dos dependentes – Participantes de planos família e outras categorias que permitem dedução de contribuições também dos dependentes podem errar na descrição dessa informação. “Às vezes, por algum tipo de equívoco no preenchimento da declaração, observamos que o participante acaba somando os valores dele e do dependente dele no mesmo campo, quando na realidade a declaração abre por CPF. Na declaração da pessoa física deve ser segregada a contribuição do participante e a contribuição do seu dependente, que pode ser filho ou até mesmo cônjuge, nos casos de declaração conjunta”.

Solução para os problemas

Patrícia Linhares ressalta que esses são os principais pontos que podem resultar em participantes caindo na malha fina, com a retenção da parcela de restituição do IR e eventual fiscalização para a entidade fechada.

Denúncia espontânea – A forma de solucionar muitas vezes é mediante o envio de declaração retificadora, quer seja da DIRF ou da e-Financeira. Se possível, antes de instaurada eventual fiscalização sobre a entidade.

“Pelo instituto da ‘denúncia espontânea’, a declaração retificadora afasta multas, encargos eventualmente devidos por alguma falha no preenchimento. E, se por acaso, as informações estiverem corretas, historicamente a Receita vem considerando que o participante pode atender à requisição que foi feita em sua declaração, com um termo ou carta correspondente da entidade”, explica a especialista.

Patrícia alerta que esse instrumento deve ser utilizado apenas para os casos em que a entidade já fez a verificação de suas obrigações e checou que não houve erro de sua parte. É preciso identificar quais são os participantes que relataram o problema e possivelmente criar um padrão de procedimentos para ser mais assertiva no atendimento às exigências da RF e resolução do caso.

Assim, os cuidados da EFPC devem envolver o check-list de verificação dos dados, a revisão das informações enviadas ao Fisco e a identificação dos participantes afetados para se antecipar a eventuais problemas. “A postura proativa evita uma multa posterior que pode acontecer, e até comprometer todo o ponto reputacional ao qual precisamos estar sempre atentos. Para que assim o participante possa manter o nível de confiança que sempre teve na entidade”, completa Patrícia.

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